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Direito da Democracia: Exercício Eleitoral Inútil

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A nova moda (não tão nova) eleitoral está em registrar em Cartórios de Registro Civil declarações de determinado candidato.

Célebre exemplo dessa prática foi do tucano José Serra em sua campanha para a Prefeitura de São Paulo em 2004, quando registrou em cartório a promessa de que não abandonaria a prefeitura se candidatar a governador do Estado em 2008. Como se sabe, descumpriu.

O também tucano Rogério Marinho, candidato a prefeito de Natal em 2012, registrou seu plano de governo em cartório. Estaria tentando resguardar a propriedade intelectual desse plano único e transformador?

Agora, determinado(a) candidato(a) a vereador(a) em Natal registrou em cartório sua intenção de doar a integralidade de seus salários (o correto seria subsídios)  para ações de educação.

Nobre intenção, ressalvados dois pontos.

Primeiro que os subsídios dos vereadores são a parte menos atrativa do cargo. Apesar de serem razoavelmente altos, não vejo como compensam o esforço financeiro dos candidatos para ocupar o posto.

Na verdade, o verdadeiro boi gordo da vereança consiste nas verbas de gabinete e cargos de livre nomeação a disposição do vereador. Disso ninguém renuncia.

Na minha opinião, atitude muito mais nobre é a do Deputado Distrital José Antônio Reguffe (PDT-DF): abriu mão dos salários extras que os parlamentares recebem (14° e 15° salários), reduziu sua verba de gabinete e o número de assessores a que teria direito, de 25 para apenas 9. Além disso, reduziu em mais de 80% a cota interna do gabinete, o chamado “cotão”. Dos R$ 23.030,00 a que teria direito por mês, reduziu para apenas R$ 4.600,00. Reguffe abriu mão também de toda verba indenizatória, de toda cota de passagens aéreas e do auxílio-moradia, visto que já reside em Brasília. Sozinho, vai economizar aos cofres públicos mais de R$ 2,3 milhões nos quatro anos de mandato.

O segundo ponto de discordância é o que haverá de essencialmente jurídico neste texto: sabe qual a utilidade do registro em cartório de propostas de campanha?

Absolutamente NENHUMA.

Em que consiste juridicamente esse registro? Em absolutamente nada. O notário responsável apenas registra que determinada pessoa escreveu determinado texto e o assinou. Só.

Ora, posso levar esse papel à justiça e obrigar o vereador a cumprir? Não. Posso protestar o papel no próprio cartório? Não. Posso inscrever o vereador no SERASA? Não.

O que se pode fazer é sacudir furiosamente o papel (caro, por sinal) como se sacudiria um jornal ou uma página impressa de blog.

Aparentemente, as tentativas infrutíferas de dar caráter ou aparência cogente a promessas de campanha partem do descrédito geral da classe política no Brasil. Para candidatos com condutas semelhantes, sua palavra não basta: é necessário registrá-la em um exercício inútil em um cartório.

Parte também, a meu ver, da mania pseudo-burocrata do brasileiro: para tudo se precisa de um papel carimbado. É uma presunção generalizada de desonestidade.

Para os candidatos que insistem nessa prática obtusa, cito uma colocação cujo autor me foge à memória: se a glória se conquista, a honra basta que não seja perdida.