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A herança do mensalão

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Por Paulo Afonso Linhares,

Professor da UERN

 

Até bem pouco tempo defendi ardorosamente o quanto de importante era para a democracia brasileira a exposição televisiva e na Internet dos julgamentos Supremo Tribunal Federal, de outros tribunais, além das seções , das duas Casas do Congresso Nacional, das Assembleias Legistativas estaduais e Camara de Vereadores. Somente faltou um reality show diretamente do Palácio do Alvorada, com d. Dilma e seus poodles (se é que ela os tivesse…). Tudo em nome da transparência e de um suposto direito republicano do cidadão de saber o que se passa efetivamente nos corredores e alcovas do poder.

O Brasil inovou quando submeteu  – talvez nem tão assim positivamente como muitas gente ingenuamente pensava – as suas instituições legislativas e judiciárias a uma exposição midiática decerto inédita na história de outras nações do mundo. Essa densa presença institucional nos lares brasileiros foi algo que teve um efeito contrário e perverso: a banalização do julgamentos, com o empobrecimento dos votos, ademais de tornar publicas discussões entre membros dessas instituições que em nada serve para educar politicamente povo. As brigas, os arroubos e unhadas trocada no plenário do Supremo Tribunal Federal têm exposto a fraturas das fragilidades dessas instituições. De seus membros, alguns verdadeiros pavões de vaidades álacres que ficam a caminhar com suas capas, ou melhor, togas pretas, como se fosse super heróis a povoar a Tv Justiça.

Alhos e bugalhos se confundem nessa história. O Brasil faz algo que os Estados tidos como mais avançados institucionalmente não ousam fazer. Nos Estados Unidos da América nenhuma corte de justiça deixa filmar ou fotografar as suas seções, tanto que os grandes jornais empregam desenhistas que assistem às seções e fazem bons esboços do que ocorreu. Aliás, fotografar ou filmar de modo clandestino uma dessas cortes em pleno funcionamento pode ser, em alguns casos, motivo para anulação do julgamento. Na culta Alemanha, o Tribunal Constitucional Federal (em alemão: Bundesverfassungsgericht, ou BVerfG), ou Corte de Karlsruhe, não tem as suas seções filmadas ou fotografadas, sob o pretexto de que feitas somente na presença de seus juízes as decisões seriam mais acertadas, sobretudo, porque não sofreriam pressões da sociedade. E isso não lhe tira a condição de mais aprimorada cortes constitucionais do mundo, senão a melhor.

No julgamento do processo do “Mensalão”, em curso no Supremo Tribunal Federal, fica evidente o intento de alguns de seus ministros se sentirem constrangidos com a enorme exposição a que estão submetidos, a despeito de outros agirem diante das câmeras como a mesma naturalidade de um veterano ator num set de filmagem. Grave é a constatação de que as questões técnico-jurídicas  cedem passo às abordagens em que entram várias outras componentes, inclusive a política. Claro que as apreensões de todos os ministros do STF, que participam desse julgamento, se voltam para o modo de como a população recebe suas participações.

Do julgamento do “Mensalão” decerto que resultará uma série de ensinamentos. Um desses há de ser a constatação  dos malefícios  que essa exposição midiática acarreta. Embora seja perceptível que a grande maioria dos denunciados receberá sanções penais,  certamente restará a convicção  de que expor réus num espetáculo de mídias não é condizente com a intenção de que a justiça seja feita.