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Minifúndios Improdutivos

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Prestígio, em algumas universidades federais, é você ter uma grande sala atulhada de computadores. Nem todo mundo tem disposição (ou competência) para aprovar projetos de pesquisa e conseguir esses latifúndios pós-modernos. Resta, então, para muitos, a criação de uma “base de pesquisa” para legitimar o uso de uma “média propriedade”. Nesses “laboratórios”, orientandos privilegiados tornam-se posseiros das pequenas capitanias. Não raro, comportam-se como arrendatários. E o são, de fato. Isso porque os divinos mestres aparecem raramente nas capitanias.

Na estrutura agrária das universidades, sobram ainda os pequenos proprietários. Apossam-se de salas, mas quase nunca as usam. Comportam-se como especuladores imobiliários. Talvez pensem, vá lá saber!, em negociar o privilegiado espaço em um futuro próximo… O fato é que temos, em algumas federais, verdadeiros corredores fantasmas.

Alguns outros dividem salas com colegas e, como estão todos os dias no batente, atendem alunos, pessoas da imprensa, membros da comunidade e colegas, além de responderem às demandas burocráticas dos departamentos. São os “burros de carga”, dizem. Não raro, como a sala em que trabalham também conta com a presença de outro professor, para não incomodar o colega, atendem os alunos em algum banco no corredor. Enquanto isso, ao lado, salas ficam fechadas por semanas…

Por que uma instituição como a Universidade, que conta com o aporte de anos de expertise em avaliação da produção intelectual de agências como a CAPES e o CNPq, não alicerça a sua, como direi?, estrutura agrária em algo menos injusto do que pressão, não raro traduzida em caras e bocas intimidatórias, dos donatários das novas capitanias hereditárias? Ora, como pode uma sala, com computador, mesas e cadeiras, passar dias e dias sem nenhum uso? Como pode uma base de pesquisa funcionar apenas para ser uma espécie de lan house de luxo de estudantes de pós-graduação? Porque uma dessas pró-reitorias que adoram inventar coisas para torrar a paciência dos que efetivamente trabalham não realiza um levantamento da produção intelectual dessas “bases”?

Aqui do meu canto faço uma sugestão: peguem o QUALIS da CAPES como referência. Com base nele,verifiquem as produções dos componentes das tais bases… Pode-se tomar como referência um determinado período de tempo. E, para não se ser taxado de autoritário, questione-se dos integrantes da própria base em que área de avaliação sua produção deveria ser analisada. Aí teríamos um Raio-X da nossa produção. E poderíamos constatar se os recursos públicos investidos na manutenção desses espaços estão sendo bem aplicados.

Quantos artigos em periódicos acima de B2 a “base de pesquisa” que se assenhora de uma sala e de equipamentos públicos produziu? Quantos projetos de pesquisa com financiamento externo conseguiu? Com informações como essas, teríamos algo concreto para balizar uma mais do que necessária “reforma agrária” nas universidades federais.

Aqui na minha sala, tentando trabalhar e sendo interrompido a cada cinco minutos por um estudante, enfrento o barulho do ar condicionado (que só refresca depois de três horas ligado…) e a tremedeira dos vidros das janelas. Resta-me a esperança de que um dia aumentem os impostos (com cobranças de produção acadêmica) sobre os minifúndios improdutivos e que estes sejam abertos para uma vida universitária de verdade.

[Texto publicado originalmente no Blog do Edimilson Lopes, em 09 de março de 2010].