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Manchetes envenenadas

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Adoro os jornais e suas manchetes criativas! Deliro a cada vez que me deparo com uma bem elaborada, extirpada de apelativos trágicos e trocadilhos infames e sem graça. Os jornalistas têm um quê de publicitários, tamanha é a competência com que chamam nossos olhos para a leitura de uma notícia só com a força da manchete que a encabeça. É um raro e admirável talento esse de resumir em uma frase todo o conteúdo de uma matéria inteira e ainda despertar o interesse do leitor. Vejam que isso já era um dom mesmo antes do advento do microblog Twitter.

Porém – lá vem ele com esses poréns! – não posso deixar de pilheriar com algumas que jogam na nossa cara o quão trouxas devemos ser para cair na leitura de um absurdo anunciado por uma ridícula manchete.

Vejamos um exemplo clássico:

“Fulano de Tal apóia Sicrana de Tal no combate à corrupção”.

Ora, ora, ora, meus amigos, existe coisa mais imbecil do que propagar isso na cabeça de uma matéria “jornalística”? As aspas vêm para dizer que, evidentemente, a tal matéria não tem nada de jornalística, e sim de “marquetística”. Ou seja, o redator está claramente a promover o nome daquele que supostamente apóia o combate a uma coisa tão horrenda como a corrupção, como se fosse um esforço hercúleo e benemérito de sua parte em acudir outra que, por tabela, também tem seu nome prestigiado. Um tiro, e dois alvos acertados! Genial, não? Seria, não fosse a obviedade monstruosa aferível por qualquer Zé Mané – assim penso eu.

Diga-me quem neste universo inteiro seria capaz de se colocar a favor da corrupção, pelo amor de Deus? Resposta: publicamente, ninguém. Mas é preciso botar as obviedades para desfilar na rua, e, mais ainda, colocá-las em forma de enunciados solenes na boca de eminentes praticantes do absurdo nos subterrâneos do poder, tudo isto para encobrir os malfeitos com palavras bombásticas que anunciam o óbvio – ou pelo menos a fachada de uma obviedade inexistente.

Isso é novo? Como quase todas as minhas análises, digo logo que não. Já disse e repito que não sou o arauto das antigas novidades; mas permitam-me expressar essa opinião sobre o assunto, não tanto para o deleite de vocês hoje, inteligentes leitores que não precisam delas, e sim para a posteridade que alcançará esse texto no fundo de algum baú roto, guardado em um velho pen drive futuramente obsoleto. Ademais, alguém lá na frente pode querer saber se as coisas já eram assim no Brasil em 2012, e eu estarei aqui para dizer que sim, pois creio piamente que isso não vai mudar, como não mudou nesses últimos 500 anos. Por fim, o faço também em honra de minha memória, pois pelo menos deixarei registrado que não caí nos ardis de algumas manchetes de jornal.

Voltando ao assunto, ofereço mais um exemplo disso que vos falo, desta feita na seara esportiva.

Quem nunca viu a seguinte manchete:

“Só a vitória interessa ao Tabajara Futebol Clube”.

Essa é uma das minhas preferidas! Conduz a um ridículo tão grande que tenho até vergonha de perguntar, mas lá vai: você torceria para um time que não se interesse por vitórias? Acho que nem os adeptos do sadomasoquismo compactuam com tamanho absurdo, afinal, ser algemado na cama e apanhar com chicote é uma coisa, aguentar a gozação dos rivais na segunda-feira é outra muito mais humilhante e dolorosa.

Portanto, fique esperto, leitor amigo, principalmente nessa época de eleições. Quando se deparar com uma manchete desta natureza saiba que por trás dela pode estar não um jornalista criativo a elaborar grandes matérias, e sim um assessor de imprensa infiltrado, um publicitário fracassado ou coisa bem pior, ofertando seu repertório de malícia e obviedades ao preço de um anúncio mal inventado – talvez subvencionado por uma verba publicitária.