Torna-se cada vez mais imperativa a necessidade de se promover reflexões em torno da sexualidade, que carrega as marcas de uma contemporaneidade em que somos bombardeados e estimulados por mensagens (ora explícitas ora subliminares), imagens e estereótipos pejorativos. Evidenciam-se inúmeras dificuldades resultantes do vazio imediatista e da exposição de “mercadorias” que promovem o prazer instantâneo e descartável.
A existência de uma onipresente exposição da sexualidade transmite a impressão de que a nossa sociedade promove e procura o bem-estar psíquico e sexual de seus indivíduos; exposição esta que a banaliza e a reduz ao uso dos genitais. No “apagar dos holofotes”, enxergamos a realidade de uma parte significativa de pessoas que sentem imenso desconforto (medo, tabus, frieza, trauma, etc) na vivência de sua sexualidade, inclusive na daqueles que protagonizam, na grande mídia, a execução do “fast food” emocional de todos os dias.
Em fins do século XIX, as pesquisas do mestre Freud nos revelaram que a sexualidade é a parte mais constitutiva do ser humano e a sociedade (vitoriana), na qual foram concebidas tais conclusões, era restritiva e claramente repressiva em relação à sexualidade. As formulações freudianas nos servem para problematizar o que vivenciamos e para fazer reflexões contemporâneas dos discursos, estímulos depreciativos e das práticas permissivas que causam perplexidade aos olhares desatentos sobre o tema.
Dificuldades emocionais parecem ser uma das principais causas de inúmeras dificuldades sexuais, de perturbações de origem psicológica que se somatizam, transformando-se em doenças orgânicas (psicossomáticas). Se agregadas a questões de carência afetiva, estas dificuldades podem resultar em comportamentos comprometedores, como a busca (inconsciente) por afeto através da promiscuidade sexual, prática bem visível em “garanhões” e em “mulheres fatais”.
Muito pouco ou quase nada, podemos esperar dos meios de comunicação. São exatamente estes, os maiores disseminadores dos estereótipos, caricaturas e principalmente da coisificação dos seres humanos e da depreciação da sexualidade.
Observemos os tipos físicos em evidência nos comerciais e reflitamos sobre a violência simbólica cometida: além do usufruto pejorativo da sexualidade feminina, expõem-se perfis inatingíveis como ideais e como modelo de referência (mulheres brancas, magras, de cabelos lisos, etc) no que tange à beleza e à estética.
Os estímulos sexuais oriundos da mídia apresentam o sexo como objeto de consumo, dissociado de qualquer tipo de emotividade ou envolvimento. Sendo a negação do desejo feminino também evidente nos apelos sexistas e pornográficos da indústria coisificadora. Tal indústria obtém êxito graças à existência de uma sociedade desumana formada por indivíduos afetivamente impotentes e emocionalmente doentios, que, em seus cotidianos de vazio, vão procurando qualquer tipo de “preenchimento” ou promessa de gozo, mesmo que a artificialidade seja evidente.
A erotização precoce aparece também como uma questão muito preocupante, pois principalmente as meninas, em momento pré-púbere, são fortemente estimuladas a se vestirem com roupas “provocantes” e a fazerem caricaturas sexuais pejorativas, mesmo sem condições emocionais e psíquicas de lidar com a própria sexualidade. A iniciação sexual, para muitas, é marcada pela inexistência de intimidade, gravidez precoce, DST e ausência de qualquer tipo de afeto, o que completa a tragédia do abandono e da falta de diálogo de acolhimento dos supostos adultos sobre o tema.
Nesta estrutura social em que as subjetividades são vilipendiadas em nome da ordem consumista, o sexo é muito falado e exposto como objeto de consumo, mas não é discutido nem problematizado, ou seja, os seus aspectos psíquicos, afetivos, emocionais são subestimados em nome do controle dos corpos e da manutenção da democracia do capital. Lamentavelmente, parte significativa dos indivíduos não consegue lidar de forma sadia com a delicadeza de seus reais desejos e caem, com freqüência, nas armadilhas de um cotidiano repleto de prazeres artificiais e doentios.
Entendemos que o caminho de se estimular o discernimento e da reflexão dos mais jovens sobre sexualidade (e suas várias dimensões) ainda é o mais viável para o alcance de vivências mais sadias e que possam promover crescimento e bem-estar psíquico.