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MALUF LULOU OU LULA MALUFOU?

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Por Paulo Afonso Linhares, Professor da UERN

 

Na política, cada vez mais sombrios são os tempo de agora, justos porque as balizas das certezas não mais existem, os padrões ideológicos se esgarçaram diante da pragmática imposta pela crise de valores que grassa nas sociedades contemporâneas. Lastimável, mas, nem temos mais a velha “esquerda festiva” nem a “direita empedernida”. Aliás, sequer mais parece ter sentido essa coisa de direita ou de esquerda para demarcar as posições político-ideológica das pessoas, grupos ou partidos. Tudo se mistura a partir do centro: é centro- direita, é centro-esquerda. Os rotuladores de sempre caíram em desuso, pois está difícil colar um rótulo na testa de alguém quando se trata de posições políticas ou ideológicas, nos dias atuais.

Entretanto, não é preciso maiores elocubrações político-metafísicas para saber que esse é um fenômeno muito típico das sociedades marcantemente democráticas, cuja regra fundamental é a da convivência de contrários e da solidariedade social. Essa convivência aliada à participação de todos nos processos sociais e políticos, tem o condão de igualar as pessoas, de modo que, pense o que pensar, alguém jamais será diferenciado ou excluído se seguir as regras do sistema. Na ditadura, era quase impossível uma aliança Lula-Maluf; na democracia, cada vez é mais necessário que todas as forças políticas participem do consenso social.

Bem, essas ideias são jogadas assim para tentar entender esse balaio de gatos criado pela aproximação política de Lula com Maluf em torno da candidatura de do ex-ministro Fernando Haddad a prefeito do Município de São Paulo. A grita foi geral. Se não houvesse a foto publicada na grande imprensa do abraço desses dois, ninguém acreditaria. De repente, falou-se no “casamento de jacaré com cobra d’água” e outras coisas do gênero. A média das pessoas ficou chocada e somente os palavrões e anátemas mais duros poderiam expressar a indignação popular. Aliás, o próprio Lula demonstrou esse desarmamento de ânimos quando teve como aliado fiel, na base de seu governo, o Partido Progressista (PP), cuja maior liderança nacional é justamente Paulo Maluf.

Agora, com a questão local da eleição de prefeito de São Paulo, a aliança política ganhou novos contornos: Lula foi à casa de Maluf buscar apoio para seu afilhado Haddad. Nada demais, sobretudo porque ele não vai votar em Maluf, mas, deseja o voto de Maluf e principalmente dos malufistas (cerca de 20% do eleitorado paulistano). É uma aliança meramente para composição de interesses eleitorais. No campo da esquerda, Lula não é o primeiro nem será o único: 1) o insuspeito Lenin fez um acordo político-militar com o que havia de pior do militarismo alemão para possibilitar a vitória da Revolução Russa de 1917 (a famosa história do “Trem Blindado”); 2) Saído dos porões da ditadura de Getúlio Vargas, o “Cavaleiro da Esperança” Luiz Carlos Prestes fez aliança política de apoio a Vargas, o algoz de Olga Benário Prestes, entregue pelo governo brasileiro à Gestapo, para morrer martirizada em campo de concentração. Coisas da política, às vezes difíceis de serem compreendidas pelo homo medius.

A despeito da grande surpresa que causou esse affair político, são perceptíveis alguns indicativos de que a diabo não é assim como pintam. A indignação contra Maluf de importantes porta-vozes do conservadorismo, representado pelo jornal O Estado de São Paulo, que apostam em José Serra, é indicativo de que mais uma vez, mesmo que por vias transversas (e bote transversas nisso!), Lula acerta na mosca, pois a única chance de Haddad se eleger prefeito de São Paulo é contar, de saída, com o eleitorado malufista. E se o Estadão está contra, Lula deve estar certo. Com efeito, o Estadão está a publicar editoriais terríveis contra Lula e seu aliado Maluf, porém, não compreende que nem Lula malufou nem Maluf lulou: são dois políticos talentosos (cujos nomes até se transformaram em verbos – lular e malufar) que, como diria o velho Chacrinha, estão ai para confundir, não para explicar.