No domingo, 17, mulheres de 23 cidades brasileiras foram às ruas manifestar apoio pelo direito de escolha ao parto domiciliar e por melhorias das condições obstétricas
Depois de ler a matéria “Mães farão marcha pelo parto domiciliar”, publicada pela revista Veja, em 6 de junho de 2012, onde atribui o parto domiciliar a “modismo”, assim aspeado, mas sem deixar claro quem disse. Fico me questionando se quem deu a informação não sabe que 52% dos partos realizados no Brasil são cesarianas, dados da tabela de Nascidos Vivos, do Ministério da Saúde, ou se não sabe o que é modismo. E o absurdo não parou aí, a matéria traz declaração de uma médica que diz: “Só torço para que isso acabe antes de uma mulher famosa morrer e servir de exemplo para as outras”. Como se o problema de morte materna no Brasil fosse os partos domiciliares.
A institucionalização do parto começou mesmo na década de 1970, e isso não repercutiu na taxas de mortalidade materna e neonatal, e essas mortes não tem associação com o parto domiciliar. Explica Paula Viana, que é enfermeira e coordenadora do Grupo Curumim, organização que defende os direitos das parteiras tradicionais e atua no norte, nordeste e algumas regiões do sudeste e centro-oeste. Paula informou que o parto domiciliar não é brincadeira, é uma opção para mulheres com gravidez de baixo risco, ou seja, ela está com perfeita saúde. A gestante faz pré-natal e realiza exames periódicos, prepara espaço da casa para o momento, e chegada à hora, o parto pode ser acompanhado por parteira.
Gestação e parto são temas sérios e os problemas que eles apresentam na implementação dos direitos reprodutivos no País também. Embora relatório da Organização das Nações Unidades (ONU) revele queda de 120 para 56 mortes maternas, entre 1990 e 2010, no Brasil. Mostra também a lentidão brasileira e a distância para atingir dados considerados aceitáveis, que são de 35 mortes. O relatório considera ainda que 90% das mortes maternas são de causas evitáveis. Ou seja, temos mortes anunciadas, que são simplesmente ignoradas. As causas de morte materna são em decorrerem de infecções hospitalares, falta de infraestrutra e demora em entrega de exames como ultras e de sangue, que revelem problemas de saúde a tempo de serem solucionados. Sem falarmos na violência obstétrica, que só aumenta a dor, sofrimento e, muitas vezes, afasta a gestante do auxílio médico.
Escolha. Essa é a real palavra que cabe no debate sério sobre maternidade e saúde da mulher no Brasil. Reduzir o direito de escolha de parto a modismo contribui em nada para o avanço dos direitos reprodutivos. A prática não é proibida, o Ministério da Saúde mesmo tem programa que se chama Trabalhando com Parteiras Tradicionais, da Área Técnica de Saúde da Mulher (ATSM). Para Paula Viana o que está em jogo é a autonomia da mulher em optar por ter seu bebê em um lugar que remete segurança, tranqüilidade e esse bem estar reflete no metabolismo e faz o parto transcorrer como deve ser fisiologicamente.
Nesse sentido, não se trata de seguir uma tendência, mas de respeitar um direito de autonomia das mulheres. De respeitar e garantir que nós, mulheres, precisamos é de acesso à informação correta e responsável sobre o funcionamento de nossos corpos para decidirmos e planejarmos: quando queremos engravidar, e saber onde faremos, no mínimo, as 6 (seis) consultas recomendadas do pré-natal, todos os exames necessários, quem será o médico-obstetra, qual hospital faremos o parto e se temos condições de parir em casa, assistida por parteira, enfermeira ou por médico. E foi por isso, que mulheres de 23 cidades foram às ruas gritar por direitos.
E se o problema é estudo científico, reproduzo abaixo informações de release da colega Ellen Paes.
Escolha baseada em evidências
Há todo um corpo de evidências científicas reforçando as vantagens e a segurança do parto domiciliar em mulheres com gestações de baixo risco. Em 12 grandes estudos publicados nos últimos anos em diversos países do mundo foi demonstrado que o parto domiciliar planejado se associa com menor risco de intervenções, como episiotomia (corte na vagina para aumentar a passagem), analgesia, uso de ocitocina (hormônio sintético usado para induzir ou engrenar o trabalho de parto), fórceps e cesariana, além de elevado grau de satisfação materna. Além disso, não há aumento dos riscos para a mãe e a taxa de transferência para o hospital varia entre 10 e 15% dos casos, sendo, em geral, programadas sem urgência. Um grande estudo holandês publicado em 2011 analisando quase 680 mil mulheres que tiveram a chance de escolher entre parto domiciliar ou hospitalar evidenciou taxas semelhantes de mortalidade perinatal entre os dois tipos de parto – 0,15% nos partos feitos em casa e 0,18% nos partos feitos no hospital. A conclusão foi que um parto domiciliar planejado não aumenta os riscos de mortalidade e morbidade perinatal grave entre mulheres de baixo risco, desde que o sistema de saúde facilite essa opção através da disponibilidade de parteiras treinadas e um bom sistema de referência e transporte.