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A BRASILIZAÇÃO DO OCIDENTE

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Por Ulrich Beck, sociólogo, professor emérito da Universidade de Munique e professor da London School of Economics – Referência da esquerda alemã e europeia- El Pais, 27

 

Traduzido pelo ex-blog do Cesar Maia

 

1. A consequência involuntária da utopia neoliberal é uma brasilização do Ocidente: são notáveis as semelhanças entre como está se configurando o trabalho remunerado no chamado Primeiro Mundo e como é o do Terceiro Mundo. A temporalidade e a fragilidade do trabalho, a descontinuidade e a informalidade estão alcançando as sociedades ocidentais, até agora baluartes do pleno emprego e do Estado de Bem Estar.

2. Assim, no núcleo duro do ocidente, a estrutura social está começando a se parecer com uma espécie de colcha de retalhos que define a estrutura do sul, de modo que o trabalho e a existência das pessoas se caracteriza agora pela diversidade e insegurança.

3. Em um país semi-industrializado como o Brasil, aqueles que dependem do salário de um trabalho em tempo integral representam apenas uma pequena parte da força de trabalho; a maioria ganha a vida em condições precárias. São representantes comerciais, vendedores ou artesãos, e oferecem todo tipo de serviços pessoais ou alternam entre diferentes tipos de atividades, empregos ou cursos de formação.

4. Na Europa, na década de 1960, apenas 10% dos trabalhadores pertenciam a esse grupo. Na década de 1980 esse número ficava em torno de um quarto, e agora é cerca de um terço do total. Se as mudanças continuarem nesse ritmo – e existem muitas razões para acreditar que será assim – em outros dez anos apenas a metade dos trabalhadores terá empregos em tempo integral, enquanto a outra metade será, por assim dizer, empregos à brasileira.

5. Assim, a política econômica da insegurança está diante de um efeito dominó. Fatores que nos bons tempos iriam se complementar e se reforçar mutuamente – o pleno emprego, as pensões garantidas, as elevadas receitas fiscais, a liberdade para decidir a políticas públicas – agora enfrentam uma série de perigos em cadeia. O trabalho remunerado está se tornando precário, os fundamentos do Estado de bem-estar estão se desfazendo, as histórias atuais de vida desmoronam, a pobreza dos idosos é algo programado com antecedência, e, com os cofres vazios, as autoridades locais não podem assumir a demanda crescente de proteção social.

6. Enquanto o capitalismo global dissolve nos países ocidentais os valores essenciais da sociedade do trabalho, rompe-se um vínculo histórico entre o capitalismo, o Estado de bem estar e a democracia. Não se engane: um capitalismo que não busque mais do que o benefício, sem levar em conta os trabalhadores, o Estado de bem-estar e a democracia, é um capitalismo que renuncia a sua própria legitimidade.