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CPI DO CACHOEIRA: O EFEITO REBOTE?

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Por Paulo Afonso Linhares, Professor da UERN

 

As peripécias do bicheiro Carlos Augusto de Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira, e de quem estaria associado a ele no cometimento der ações criminosas, deveria ser apenas um rumoroso caso de polícia, mesmo porque o levantamento do caso e todo o seu arcabouço investigativo foi brilhantemente realizado pela Polícia Federal. Jamais deveria dar ensejo a uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) no Congresso Nacional. Deputados e senadores têm muito mais coisas relevantes com que se preocupar, sobretudo, quando se sabe que a Constituição vigente espera a longos 24 anos que o Congresso cumpra o dever de aprovar as normas complementares sem as quais algumas disposições constitucionais, posto que eficazes, não têm como ser aplicadas. Uma CPI é algo que deve ser usado para coisas infinitamente maiores, no interesse do conjunto da nação.

Focar esse instrumento em casos como o do bicheiro Carlos Cachoeira inequivocamente é um erro abissal, parta de onde possa ter partido essa ideia maluca, dos governistas ou da oposição. Aliás, uma das tendências naturais das CPIs é abrir demais o foco das investigações, pois na lógica das lideranças partidárias e do conjunto de parlamentares das duas Casas do Congresso, numa CPI cabe tudo. E o resultado? O mais completo embananamento das investigações que leva, em regra, a nenhuma conclusão, principalmente no que se refere à temática que ensejou a sua convocação.

Ao que parece, as CPIs são sempre instituída para fins alheios àqueles que dão motivos às convocações. Os simples tumultos que elas causam no funcionamento das casas legislativas são muitas vezes o suficiente para satisfazer os interesses do grupo de partidos que a patrocinou uma CPI que, por isto, não deixa de ser um ótimo instrumento de diversionismo (conforme o Aurélio “… manobra usada nos órgãos legislativos ou deliberativos, e que consiste em desviar a atenção dos seus membros para matéria diversa daquela que se discute, com o fim de lhe impedir a aprovação.”).

A CPI do Cachoeira resultará em nada produtivo para as instituições jurídico-políticas nacionais. Talvez sirva apenas para desmascarar e tirar o mandato do senador Demóstenes Torres (ex-DEM, Goiás), por ser amigo do bicheiro Carlos Cachoeira. Deve sobrar uma rebarbazinha também para a revista Veja, do Grupo Abril, porquanto as investigações da Polícia Federal, muito baseada em escutas telefônicas, têm mostrado muitas ligações (perigosas) de seus jornalistas com o contraventor goiano.

Aliás, Carlinhos Cachoeira é um falastrão deslumbrado com o poder que tem, de modo que passou a utilizar essa poderosa revista semanal para mandar seus recados aos seus adversários políticos dos governos petistas. Não poderia haver alguém mais útil para o bloco político formado pelo PSDB e o DEM, isto sem falar nas generosas quantias que a Máfia dos Caça-Níqueis, da qual Carlos Cachoeira é o cappo di tutti cappi, despejava nas campanhas de alguns dos membros desses partidos; foi certamente essa “mão” milagrosa que teria colocado uma cachoeira de dinheiro para reeleger o senador Demóstenes Torres, nas eleições de2010, com a fabulosa votação de 2,5 milhões de votos, quase o dobro do que obtivera em 2002 (cerca de 1,3 milhões de votos). Mesmo a aura de anjo vingador da moralidade pública, que batia ferozmente no governo Lula, não daria ao senador Demóstenes Torres o privilégio de ser eleito sem gastar dinheiro muito, sem necessitar desse enorme cardume de azuis garoupas a pulular no seu caixa de campanha.

Todavia, tudo isso são coisas a serem resolvida na esfera policial e, posteriormente, no Judiciário. Por essas e outras é que a CPI do Cachoeira será um tiro n’água, mesmo porque não serve, neste momento, nem como peça de diversionismo: o governo Dilma vai muito bem e não precisa desviar a atenção da opinião pública. E os governistas de todos os matizes, no Congresso Nacional, deveriam ter na lembrança, como severa advertência, aquele verso de GOETHE (Fausto, II): “No fim tão sempre dependemos / Das criaturas que criamos (Am Ende hägen wir doch ab / Von Kreaturen, die vir machten). O perigo é ocorrer aquilo que, em Medicina, chama-se efeito rebote. Afinal, mexer com fogo sempre cheira a queimadura.