Por Julez Queiroz, Advogado e especialista em direito eleitoral
O Tribunal Superior Eleitoral respondeu, em 29 de setembro de 2011, a curiosa consulta[1] da Deputada Federal Nice Lobão: programas de recuperação fiscal, com redução total ou parcial de juros e multas, são considerados conduta vedada a agente público em campanha eleitoral?
As condutas vedadas, previstas no artigo 73 da Lei no 9.504/94 (Lei das Eleições), são ações administrativas realizadas com o objetivo de favorecer o candidato e caracterizam desvio de finalidade que constitui abuso de poder político. Dentre elas constam, por exemplo, as proibições de nomear e contratar novos servidores públicos nos três meses anteriores ao pleito até a diplomação dos eleitos.
Um dos casos mais eloquentes de condutas vedadas está descrito no § 10 do artigo 73: no ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior.
Com base nesse dispositivo, com redação dada pela Lei no11.300/2006, que ficou proibida a distribuição dos famosos bonés e camisetas de candidatos.
Pois bem.
O TSE entendeu na Consulta citada que configura infração ao § 10 do artigo 73 a concessão de “benefícios concernentes à dívida ativa do Município”, ou seja, benefícios fiscais.
Entendeu ainda o Tribunal que não se podem implementar os referidos benefícios fiscais em ano eleitoral, nem tampouco pode o Prefeito enviar à Câmara de Vereadores iniciativa de lei para implementar os referidos benefícios.
Assim, não se podem implementar regimes de parcelamento ou descontos em tributos no ano da eleição (exemplo é o famoso REFIS da Receita Federal).
Em Natal há um caso que, no nosso entender, é digno de atenção: o desconto no Imposto de Transmissão inter vivos de Bens Imóveis – ITIV – que reduziu a alíquota desse tributo de 3% para 1,5% desde setembro de 2011, com previsão de término em 23 de janeiro de 2012.
Contudo, a Prefeitura do Natal prorrogou o desconto até 22 de maio de 2012 pelo Decreto no 9.626/2012.
Pergunto: à luz do entendimento do TSE, essa prorrogação configura conduta vedada? Prorrogar um benefício em ano eleitoral equivale a implementá-lo?
Outra discussão a ser travada é a delimitação do conceito de benefícios fiscais.
Isso porque a isenção de tributos, sua remissão ou anistia também podem se encaixar no conceito lato de benefício fiscal. Na verdade, em uma visão mais superficial, qualquer benefício que atue no plano da receita pública derivada pode ser considerado como conduta vedada.
Nesse ponto, encontramos outro exemplo aqui em terras de Poti: a autorização de renúncia fiscal veiculada no Projeto de Lei nº 158/2011, alterando a redação da Lei de Incentivo à Cultura Djalma Maranhão (Lei Municipal no 5.323/2011).
A antiga redação da lei renunciava a, no máximo, 2% da receita tributária do ISS e do IPTU em virtude de projetos de apoio a cultura patrocinados pelos contribuintes. A nova redação, por sua vez, ampliou a renúncia para 2% de toda a receita da Lei Orçamentária Anual, razão pela qual o projeto de lei foi vetado pela Prefeita.
Contudo, o veto foi derrubado pela Câmara Municipal em 25 de abril de 2012.
Claramente, o novo texto estabelece novos benefícios fiscais, inclusive em tributos não abarcados pela redação anterior. A implementação desses benefícios importará em conduta vedada? E os nobres vereadores que derrubaram o veto e aprovaram a lei incorreram em condutas vedadas?
A nosso ver, a Consulta do TSE não trouxe respostas. Apenas mais perguntas e mais consequências.
[1] TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL.Consulta nº 153169, Acórdão de 20/09/2011, Relator(a) Min. MARCO AURÉLIO MENDES DE FARIAS MELLO, Publicação: DJE – Diário da Justiça Eletrônico, Tomo 207, Data 28/10/2011, Página 81.