Search
Close this search box.

Haneke sem fim

Compartilhar conteúdo:

Muito se pode falar sobre o cinema do austríaco Michael Haneke. Seja por suas escolhas estéticas, os ensaios sobre o fracasso da civilização, seu recorrente discurso sobre a natureza da imagem, tramas violentas ou seu olhar insipiente sobre as personagens. Mas algo que pontua com bastante destaque a sua obra são seus desfechos. Quase sempre abruptos, desconexos e implacáveis deixam um gostinho de “o quê?” no juízo de quem acabou de assisti-lo. Isso pode ser verificado em filmes como “A professora de piano”, “A fita branca”, “Violência Gratuita” e “Caché”, por exemplo.

Como alternativa a estrutura da narrativa clássica, o final “sem fim”, que não dá satisfação sobre o destino da trama e deixa a experiência com ares de inconclusão e sem respostas, já era usado há muito na literatura, e até mesmo no próprio cinema, principalmente entre os rincões de filmes experimentais e surrealistas, onde nem tudo, obrigatoriamente, tenha um sentido linear, tampouco compromisso com os símbolos temporais.

 

Dentro de uma narrativa, o tempo e o espaço é chamado de Diegese. Haneke desrespeita ambos. No melhor sentido possível. Ele vai implodindo pouco a pouco todas as estruturas e abrindo novos caminhos.

Diz ele que “O cinema tem tendido a oferecer um sentido de fechamento para certos temas e envia os espectadores para suas casas com sentimentos de conforto e paz. Meu objetivo é desestabilizar o espectador e roubar qualquer possibilidade de consolo e autossatisfação”

Nesse sentido, os “não fins” de suas obras tentam estabelecer uma ideia de continuidade e amplitude para além da dimensão ficcional. Isso corrobora a tese de que Haneke faz um cinema de reeducação do espectador, do mesmo modo que Lars Von Trier fazia em seus primeiros filmes ao deixar claro, até mesmo por um pequeno detalhe – o boom do microfone que teima em aparecer no topo da imagem – que aquilo é um filme.

Não é difícil imaginar, portanto, que todo o universo da obra de Haneke esteja interligado. Ao não “encerrar” a experiência ele a estica e a conecta as demais. Entre seus filmes “sem fim” basta uma cena de transição e todos eles viram uma coisa só, um todo. Pelas muitas leituras possíveis sobre sua obra, não é de se estranhar que ele seja um dos diretores europeus mais aclamados da atualidade.