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3
Mark se viu rodeado por microfones de todas as emissoras de televisão desse lado do continente. Flashes e mais flashes o cegavam, obrigando-lhe que falasse com os olhos baixos. À sua frente, um batalhão de repórteres loucos para ouvir sua tímida voz respondendo às suas perguntas. Uma ordem se fez e um deles começou:
_ Dr Robbins, é verdade que há uma menina confinada em seu prédio?
_ Olha…eu não diria confinada, e sim, uma menina que está aos nossos cuidados.
_ Dr Robbins, é verdade que o assassino serial Jeb Irons manteve suas vítimas vivas alimentando-as com seu próprio esperma?
_ Sim, é verdade…
Houve um burburinho por entre os presentes. Seguindo a fila, um outro repórter perguntou:
_ É também verdade que a menina foi peça-chave para o descobrimento do local?
_ sim, é verdade.
_ Dr Robbins, o senhor poderia explicar como isso ocorreu?
Mark se remexeu na cadeira. Ele sabia que essa pergunta viria mais cedo ou mais tarde, mas concordara em responder a todas as perguntas.
_ Johana tem o dom de ver a verdade, e foi o que ela viu.
Houve mais um burburinho. Dessa vez Mark foi evasivo, com sua explicação filosófica sobre o dom de Johana.
_ Mas doutor, como comprovar que ela realmente faz essas coisas?
_ As crianças estavam lá, não?
Ele se referiu às crianças seqüestradas por Irons e que foram encontradas numa casa abandonada, no centro, em frente à igreja San Martín.
_ Doutor, não é crime manter uma criança em cárcere privado?
_ Senhora, Johana não está aqui à força, e ela é muito bem tratada por sinal. Se quiserem, podemos marcar uma visita. O caso é que se ela for para as ruas, só Deus sabe o que pode acontecer. Agora, se me dão licença…
Mark sai visivelmente irritado, deixando uma dúzia de repórteres sem conseguirem fazer suas perguntas.
4
Johana tinha agora 12 anos. Ainda no mesmo quarto, ainda fazendo as mesmas coisas. A voz onipresente que a acompanhava há anos voltou a falar. Era uma voz macia e bondosa, como a voz de um pai.
_Bom dia, Johana. Vê este homem que está entrando?_ Johana apenas se vira para o homem, sinal de que entendera a pergunta. _ Sente-se de frente para ele, está bem? _ ela obedece.
Um par de minutos se passa em completo silêncio. A menina de cabelos loiros olha fixamente para aquele homem amarrado e amordaçado, que treme e sua sobre a cadeira. A voz finalmente volta a falar.
_ Johana… Por que?
“Por que”: A terceira pergunta. A prova da evolução de uma espécie, enquanto os não-evoluídos não passam do “como” e “onde”.
***
Uma imagem de Nossa senhora de quase meio metro bem desgastada, à primeira vista, aparece. Em volta há uma parede branca que segue para cima, donde se tem uma abóbada bem alta. Bancos. Altar. Mickey, como todos o chamavam, está ajoelhado e murmura rezas para a santa à sua frente. Ele chora. Está nervoso. Por que chora, Mickey? Johana tem vontade de perguntar. Mas ele não a vê. Uma voz. Será ele? A voz que vem do seu quarto?, Johana pensa. Não. É um homem vestido com uma roupa branca que vai dos pés ao pescoço, fazendo Johana se perguntar se ele é um dos enfermeiros que ela vê todos os dias. O dono da voz chama por Mickey, mas Mickey não olha. Ao invés disso, ele sai correndo.
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Mickey chora, mas não pode gritar. A dor é enorme, tão grande que Johana chora também. E grita. Mickey grita. Johana grita.
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_ ENFERMEIRO MAU! ENFERMEIRO MAU!_ Johana grita sem parar, e, histérica, arrancou os eletrodos presos à sua cabeça e a agulha do soro, por onde viria o sedativo no caso de isso acontecer. Com a evolução do tratamento, era possível aos médicos verem o mesmo que Johana via e isso podia ser exibido num monitor de tv. E enquanto Mark e seus colegas viam a horrenda cena de estupro, uma forte dor lhes foi acometida no meio da cabeça, fazendo-os gemer e se ajoelharem. Imediatamente, homens cobertos dos pés à cabeça com uma roupa de lona azul entraram gritando e segurando a menina. A histeria continuava. Um dos três homens saltou no pescoço do que estava com a seringa e começou a sufocá-lo. O terceiro, chamado “reserva”, apartou os colegas e levou uma espetada da seringa que continha o sedativo. Mickey, também histérico, gritava e se sacudia na cadeira, que nesse momento já estava encharcada de urina. Johana correu para a porta, na tentativa de fugir dali, e encontrou mais dois enfermeiros, que lhe aplicaram o sedativo. Johana caiu no chão, imóvel.
Meses depois a defesa usou o vídeo feito por Johana e a pena de Mickey “horror das crianças” Gomez foi abrandada, dando lhe apenas 458 anos de detenção no manicômio estadual. Esse julgamento entrou para a história como o primeiro a usar imagens mentais como evidência. Johana virou capa de revista no mundo inteiro e no mundo inteiro não se falava em outra coisa. Ela virou deus, xamã e demônio. Crédulos faziam orações e cultos para ela. Militantes dos Direitos Humanos protestavam em frente à ONU e na frente do centro psiquiátrico em favor da liberdade da enigmática menina que lia pensamentos. A situação ficou tão insustentável que Mark, numa entrevista coletiva, marcou uma visita da imprensa ao Centro para o dia seguinte. E assim foi.
7
Numa das salas do centro psiquiátrico Thomas de Aquino há uma menina que corre desesperada e sem rumo. Ela não está tão apavorada por causa das tantas luzes, das tantas portas e do barulho ensurdecedor dos alarmes, mas sim por causa das vozes mentais de 157 pessoas entrando vertiginosamente na sua cabeça de doze anos.
***
uhhh, vou comer a estagiária hojAcho que o Hobbes está se drogandopor que? Por que ele escolheu aquela vaca?hahahah, que idiotGOSTOSA!e se o Trautman souber?Não! pára, pai! A menina fugiu, e se ela descobrir o desfalque que fiz na empreshummm, acho que estou com sífili–
***
Longe do quarto protegido contra emanações psíquicas Johana está vulnerável, assim como todas as outras pessoas. Por onde passa ela vê gente caindo e gritando. A dor é tão grande que algumas batem com a cabeça contra a parede para ver se diminui, ou se acaba com aquilo de vez. Ela desce escadas, entra aleatoriamente em portas e esbarra em várias e várias pessoas. Quando, de repente, tudo acaba.
_ AAAAAAHHGGGHH!!_ Grita Mark Robbins, diretor do centro psiquiátrico. Ele estava em plena reunião, quando começou a doer. Seus assistentes ainda meio zonzos, tentam se recompor._O que aconteceu?_ Mark Pergunta.
_ Euguuuu, não sei…
_ Johana!_ Grita Mark olhando para o monitor que dava para a cela da menina, que neste momento está vazia._ Acionem todos os homens!
_ Hã?_ pergunta Jacob, seu irmão mais novo._ Os vivos?
_ Como? “Vivos”?!
_ Sim. Veja!_ Ele aponta para os monitores de tv que dá para os corredores. Mark pôde ver as dezenas de pessoas tendo espasmos e sangrando pelos olhos.
_ Oh, meu Deus…_Exclama Mark.
_ Senhores,_ disse Jacob, engrossando a voz_ nós merecemos morrer hoje.
Continua.