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A República Federativa do Brasil é uma ficção

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Aprendemos nos livros de História e, sobretudo, de Geografia, que existem cinco regiões no Brasil: Norte, Nordeste, Centro-Oeste Sul e Sudeste. Bem, sem o menor lamento, venho informar que isso foi uma grande mentira contada a partir das maquilagens de Vargas.

Lá em 1970 surgiu a atual regionalização do Brasil, em termos político-administrativos, que foi adaptada em 1988, com o enxerto de novos estados, e em 1990, com a criação do estado do Tocantins. Porém, desde 1913 existem modelos de regionalização do país. Primeiro, se dividiu o Brasil em regiões através de uma geografia física:  Setentrional (o Amazonas, o Pará e o Acre), Norte Oriental (Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Maranhão) , Oriental (Bahia, Minas gerais, Espírito Santo e Rio de Janeiro), Meridional (São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul) e Central (Mato Grosso e Goiás).

A segunda regionalização veio em 1940, sob o Governo de Vargas, que criou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Além dos aspectos físicos, se levou em consideração os aspectos socioeconômicos. Com essa nova configuração, a região Norte era composta pelos estados do Amazonas, Pará, Maranhão, Piauí e o Acre – este último só virou estado em 1962. A região Leste era composta pelos estados da Bahia, Sergipe e Espírito Santo, enquanto que a região Centro era composta por Goiás e Mato Grosso e Minas Gerais. Já o Nordeste era composto pelos estados do Ceará, do Rio Grande do Norte, do Pernambuco, da Paraíba e da Alagoas. Por fim, temos a região Sul, que era composta pelos estados do Paraná, de Santa Catarina, do Rio Grande do Sul, de São Paulo e do Rio de Janeiro.

Porém, mal se fez essa composição regional apresentada acima, logo depois, em 1945, já se tinha outra reconfiguração regional. Nessa época, ao invés de cinco, o país passa a ter sete regiões.  São elas: Norte, Nordeste Ocidental, Nordeste Oriental, Centro-Oeste, Leste Setentrional, Leste Meridional e Sul. Nesse período há algumas criações de estados, em vez de realocamento no mapa. O território de Rio Branco foi criado (hoje é o estado de Roraima, a partir de 1960), assim como o estado do Amapá ladeado pelo Pará. Houve também algumas modificações nos estados do Mato Grosso, no Paraná e em Santa Catarina.

Cinco anos depois, como se fosse um rito, houve outras mudanças, mas, novamente, somente de realocamento no mapa. Os Estados do Maranhão e do Piauí passaram a integrar a região Nordeste – em 1940, integravam a região Norte. A região Leste passou a ser integrada pelos estados da Bahia, do Sergipe, de Minas Gerais, do Espírito Santo e do Rio de Janeiro.

Quinze anos depois, nova configuração no mapa, que vigora até hoje, havendo algumas mudanças me relações aso estados. No mapa atual, a Bahia e o Sergipe integram a região Nordeste. Goiás, integra o Centro-Oeste, sendo que o Mato Grosso foi dividido – a partir de então tínhamos o estado de Mato Grosso do Sul.

Todavia, se engana quem pensa que essas regionalizações se iniciaram no século XX. A bem da verdade, tudo começou lá em 1534, com as 15 Capitanias Hereditárias (Capitania do Maranhão I e II, Capitania do Ceará, Capitania do Rio Grande I e II, Capitania de Itamaracá, Capitania de Pernambuco, Capitania da Baía de Todos os Santos, Capitania de Ilhéus, Capitania de Porto Seguro, Capitania do Espírito Santo, Capitania de São Tomé, Capitania de São Vicente, Capitania de Santo Amaro e Capitania de Santana), que eram faixas de terra entregues pela Coroa Portuguesa aos doze donatários. Essa primeira regionalização, ou corte de terra, para ser mais preciso, não deu certo; durou apenas 16 anos, sendo a maioria delas administradas pela Coroa até o século XIX.

Em 1834, em vez de cortes de terra, o país, já com um Governo Geral, passa a ter 18 províncias (Pará, Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia, Espírito Santo, Minas Gerais, Fluminense, São Paulo, Mato Grosso, Goiás, Santa Catarina e Rio Grande do Sul) e o Rio de Janeiro que se transformou em Município Neutro da Corte. a rigor, eram 17 províncias e uma ‘capital’.

Entretanto, se engana, novamente, quem pensa que essa foi a única divisão oficial e extra oficial do Brasil àquela época. Além de, no século XVIII, haver o Estado do Brasil, o Estado do Grão Pará e Rio Negro e o Estado do Maranhão e Piauí; ou seja, o país era dividido ao bel prazer de todos.

Ao se estudar com cuidado a formação territorial do Brasil, a única certeza que temos é que nunca houve nem consenso entre os habitantes dominadores da terra, nem controle da Coroa em relação à sua colônia. Pelo menos não na época colonial e imperial, assim como não no período republicano, o qual começou com 20 estados.

Aqui eu ignorarei os detalhes das criações das províncias e dos estados ao longo dos séculos. Não entrarei em detalhes sobre a criação, por exemplo, dos estados de Alagoas, Amazonas e Pará. Também deixarei de lado as novas reconfigurações, que duraram pouco tempo, a partir de guerras separatistas como a Revolução Pernambucana, a Confederação do Equador, Revolução Praieira, Guerra do Contestado e Guerra dos Farrapos – só para ficar nos movimentos reconhecidos pela historiografia oficializada.

Eu trouxe essas informações acerca da constituição histórica e geográfica do Brasil, apenas para assentir que, de fato e de Direito, a “República Federativa do Brasil” não passa de uma ficção. A arbitrariedade com a qual se divide administrativamente o país só prova que a estabilidade da tal da “brasilidade” é apenas uma narrativa débil, que não resiste a uma consulta nos livros de história e aos jornais dos séculos passados e do ano de 2021.

Haja vista que cada um faz a configuração que quer do país, eu também farei a minha. Sou do entendimento de que só existem três regiões no Brasil, a saber, a Região Norte-Nordeste, que implica todos os estados dessas faixas de terra, a região Serrana, que incluem os estados do Mato Grosso, Mato grosso do Sul e Goiás, e a Região Sul-Sudeste, que inclui todos os estados ali alocados.

Não quero discutir os efeitos práticos de qualquer divisão regional. Quero apensas assentir que as motivações para as variações de descrição regional dizem menos respeito ao rigor administrativo que à necessidade de manter o controle político, discurso, econômico e policial dos estados que estão distantes dos grandes centros políticos. O objetivodesse controle é, também, enfraquecer qualquer tipo de organização autodeterminada pelos habitantes das regiões marginalizadas. Isso não se dá sem motivos, pois, sempre sentem calafrios e tentam desconversar, quando ouvem as linhas eternas do cantador Ivanildo Vilanova: “imagina o Brasil ser dividido e o Nordeste ficar independente”. Com isso, quero dizer que ao invés de regiões, essas posições administrativas que citei poderiam ser Estados-Nação.