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Nu

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Por Giovani Ângelo (matemático)

Hoje vou ficar nu. Acometido de um tédio absurdo que me deixou irracional Enlouqueci, e em meio a isso tirei toda a minha roupa. Tudo mudou, fiquei nu. Senti-me vazio, as forças acabaram, as lágrimas cessaram. Agora faz sentido limpar minha boca da saliva que saiu enquanto eu gritava. Eu estou nu. Achei divertido não ter nada em mim, era interessante algo que só fosse eu, meu corpo em contato com ar e tudo que me cobria era só o ar. Nada roupa com bolsos cheios de papéis, carteira com mais papéis, com cartões de créditos, documentos, caneta, lápis, chaveiro com suas inúmeras chaves que abrem portas do trabalho, de casa, do carro, do quarto, das gavetas que tem mais papéis com mais documentos. Eu estou nu.

Olhando o que a nudez me revela vejo dezenas de marcas. Histórias que vivi, e agora leio e releio na minha mente. Tudo isso estava escondido em mim, mas estavam inativos pois eu estava vestido, agora eu estou nu.

Agora posso ouvir um silêncio que não sentia na minha mente. Estar nu é divertido. Se eu sair por aí as pessoas vão olhar pra mim, vão se sentir horrorizadas ou vão rir, vão me julgar, vão pensar de imediato sobre mim, vão tirar conclusões, vão comentar, vão querer saber quem sou, vão me notar e vão achar espantosa uma pessoa nua. Vão chamar as autoridades, vão ser amáveis comigo querendo me dar roupas ou um cobertor, vão bater em mim, vão querer me matar porque estou nu.

As autoridades vão fazer a lei valer, vão me prender, vão chamar um (ou uma) assistente social, um (ou uma) psicólogo (a) para entender do porque de que estou nu. Vou responder um processo por andar nu em lugares públicos, tenho que esta com roupas que tem bolsos cheio de chaves e papéis e cartões e uma etiqueta que me arranha o pescoço como se estivesse suado e sujo de areia de praia. Mas pra onde iria a paz que estou sentindo agora? Pois estou nu.

Vou ficar nu enquanto eu posso estar. Como estava no ventre da minha mãe, em paz.