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Sobre o debate de candidatos à Prefeitura de Natal na TV Ponta Negra

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Por Alisson Nunes (professor e mestre em comunicação social) *

“A TV PONTA NEGRA PRECISA APRENDER A FAZER DEBATES E OS CANDIDATOS DEVEM APRENDER A DEBATER MELHOR”

carlos-eduardo-alves-magnus-nascimento-tribuna-do-norteSe cada povo tem o governante que merece, a sociedade natalense ainda precisa melhorar muito para poder produzir políticos de melhor qualidade. Ao contrário do que disse a apresentadora no final do evento, o nível do debate de ontem foi baixíssimo. Comecemos pelas falhas de produção da própria emissora: para citar poucos exemplos do flagrante mau planejamento do espaço, tempo e logística, basta mencionar a pouca qualidade discursiva da maioria dos convidados da sociedade (quais foram os critérios seletivos? Sorteio ou relevância social?), as câmeras mal posicionadas, o microfone livre para militantes anti-Temer gritarem palavras de ordem inoportunas ao debate em si e também a clara ausência de controle sobre a performance dos candidatos, que andavam por onde bem entendiam, sem que ninguém os orientasse.

Além disso, não poderiamos esquecer de um fato muito intrigante: não pareceu justo que a emissora tenha dado direito de resposta a Carlos Eduardo e o negado a todos os demais que o solicitaram. Quais foram os critérios para essa decisão do “departamento jurídico” da emissora? A população de Natal ainda não sabe.

Mas como não bastasse a gritante incompetência técnica da emissora, a enorme maioria dos candidatos escancarou despreparo intelectual, formal e ético. Fiz uma lista dos pontos que julguei mais negativos.

1) Todos os candidatos, uns mais, outros menos, se recusaram sistematicamente a seguir o protocolo do debate, interrompendo a fala da apresentadora antes que ela desse a permissão para falarem e abandonando o diálogo (ou a tentativa de fazê-lo, pelo menos) com os oponentes para simplesmente usá-los como “escada” para fazer palanque e monólogos. Infelizmente, a apresentadora em nenhum momento tentou amenizar ou melhorar o show de horrores que se instalou.

2) O despreparo intelectual da maioria dos candidatos se mostrou assustador. Discursos em geral pouco coesos e firmes, cheios de lapsos de sentido e erros gramaticais graves. Com exceção de poucos candidatos, o baixo nível cognitivo imperou.

3) A falta de cordialidade e etiqueta entre os candidatos me fez lembrar uma discussão numa mesa de bar. Ao invés de usarem o termo “senhor” ou “senhora” ou pelo menos chamar o adversário pelo nome, abusou-se do “você” e até mesmo “cara”. Alguns foram até mais longe, usando adjetivos desnecessariamente agressivos.

Agora faço um esboço da performance de cada candidato, mencionando os pontos fortes e fracos perceptíveis em cada um:

Carlos Eduardo: o

* Carlos Eduardo (PDT) – Teve o mérito de usar o debate mais para falar de seu governo que para atacar os oponentes. Demonstrou formalidade e elegância no trato com os demais candidatos. Discursos coesos e claros, com começo, meio e fim. Deixou de responder algumas perguntas, se saiu muito mal na hora de justificar a má condição dos transportes públicos e escorregou muito feio na casca de banana que Mineiro jogou para ele: a questão dos conselhos de bairro.

unnamed-15* Márcia Maia (PSDB) – A mais perdida de todos. Foi logo sangrada pelos sucessivos ataques contra as gestões da mãe e a prisão de familiares, e não conseguiu se recuperar bem, passando a atuar na defensiva e, portanto, a reforçar a ideia de que “tinha algo a temer”. Preparo intelectual fraquíssimo, atrofiado ainda mais pelo nervosismo. A gentileza artificial da candidata não conseguia disfarçar sua raiva e incômodo.

mineiro

* Fernando Mineiro (PT) – Teve o mérito de soar natural, espontâneo e preparado intelectualmente para as questões, mas pecou na grosseria: não esperava a apresentadora autorizá-lo a falar e perdeu as estribeiras da elegância após ser criticado duramente pelo candidato Freitas Júnior. A capacidade de diálogo e o nível intelectual de Mineiro colocam ele entre os políticos mais capacitados do RN, mas sua arrogância e cabeça quente dão o que falar. Não deu uma resposta satisfatória à provocação de Rosália Fernandes sobre as alianças promíscuas e incoerentes do PT: “Ninguém governa sozinho” – se limitou a defender. Em tempos de Lava-Jato e crise petista, o candidato poderia ter tentado responder algo mais inteligente e convincente.

roberio-paulino* Robério Paulino (PSOL)Sem dúvida, quem mais se sobressaiu no debate no quesito duelo aberto e franco. Fez muitas críticas pertinentes às últimas gestões municipais e aos outros candidatos, mas exalava petulância na maneira de se movimentar no cenário e olhar para os adversários. Parecia querer entrar dentro da câmera e sistematicamente se esquecia que estava num debate, não num palanque. Despreparo emocional patético. Parecia um pastor enlouquecido pregando, em transe. O candidato tem ideias interessantes e valentia, mas sua figura é pesada, desagradável e autoritária. Cacoetes de tirano, infelizmente.

kelps* Kelps Lima (SD) – Sem dúvida, quem mais lucrou no debate no quesito comunicação. Não perdeu a elegância no trato com os demais candidatos, mesmo fazendo críticas cirúrgicas ao prefeito. Soube apresentar-se didaticamente à população, sobretudo a menos intelectualizada. Em termos gerais, se saiu melhor que os outros no debate, mas não se defendeu de maneira convincente da grave crítica que Robério fez ao financiamento de sua campanha anterior, associando-a à Lava-Jato.

freitas1* Freitas Júnior (REDE) – O candidato tropeçou muito no Português e transmitiu certa imaturidade. Não soube responder algumas perguntas cruciais. Adotou a estratégia do ataque porra-louca, desprezando completamente a coerência discursiva, temática e dialógica do debate. Apresentou críticas interessantes ao sistema político, defendeu propostas convincentes, mas não conseguiu esconder seu baixo nível intelectual e certo ar de aventureiro político oportunista.

entrevista_com_rosalia_fernandes-_fc_1* Rosália Fernandes (PSTU) – A candidata socialista fez algumas críticas interessantes à gestão do prefeito e teve a audácia de denunciar em público a relação criminosa de Carlos Eduardo com o SETURN – adequadamente chamado de “máfia”. No entanto, suas propostas administrativas não soam viáveis dentro do quadro de forças que configuram a política natalense atualmente. Além disso, a candidata é pouco carismática e sua dificuldade de falar fluidamente não ajuda a convencer e transmitir autoridade, confiança e serenidade. Se depender de candidatos assim, o alcance do PSTU continuará restrito aos seus poucos militantes e à figura solitária de Amanda Gurgel.

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A TV Ponta Negra precisa aprender a fazer debates e os candidatos devem aprender a debater melhor. Assumir um posto tão decisivo para quase um milhão de vidas requer um bom nível intelectual e moral. À medida que a sociedade natalense evoluir intelectualmente e moralmente, a política com certeza refletirá isso. Parece que vai demorar. A velha maneira de fazer política precisa morrer. E acabar com ela é algo que só a juventude pode fazer.