Minha Nossa Senhora das Dores, de Nazaré, do Desterro, do Parto, da Apresentação, de Sant’Anna, da Saúde, Aparecida, de Guadalupe e dos Aflitos, ajudai o nosso ABC.
A conjuntura atual não é nenhum pouco agradável. Restam cruéis sete jogos e só temos 27 pontos. O primeiro time fora da zona de rebaixamento tem onze pontos a mais. Já sinto o cheiro ruim do rebaixamento debaixo do meu travesseiro.
Perguntei aos tocos das árvores ao meu redor – sim, os tocos daqui, tais como os paralelepípedos das crônicas de Nelson Rodrigues, falam o que pensam – o que carece o Mais Querido para escapar da desonra, do rebaixamento.
Antes que você estranhe os meus amigos tocos nessa estória, explico-lhes que rabisquei esse texto no meu escritório do bosque, cercado por mais ou menos quinze tocos de árvores, com muita sombra, ar puro, canto de passarinhos e apenas alguns simpáticos raios de sol que atravessam as copas da vegetação de mata atlântica preservada da maldade urbana irracional.
Mas voltando ao futebol, meus amigos tocos não erram jamais. Estão convencidos que para o ABC fugir do fundo do poço no final do ano, precisa vencer seis dos sete jogos que restam. Difícil. Muito difícil.
Meu leitor qualificado, se é que eu tenho algum leitor, deve estar me achando um chato pessimista, um falso torcedor. É que eu sou realista, te peço desculpas. Eu juro que me empenho para entender essa sua crença de torcedor. Mas a cada nova tentativa, fico mais certo de que não há esclarecimento racional e coerente para tanto.
Como disse o sociólogo e escritor Roberto DaMatta, a relação entre um time e seus torcedores é difícil e curiosa. Lembra os laços entre os amantes apaixonados. Se a mulher olha para o lado, o amante pode ser devorado pelo ciúme. Se ela não olha para ninguém, o homem reclama da falta de confiança. Assim é com o seu time. Se ganha é o melhor do mundo. Se joga mais ou menos, torna-se o pior time do mundo. Da mesma maneira, irracional, mas inversamente proporcional, apresenta-se a fé. Quanto mais complicada é a missão, mais fé o torcedor parece ter do sucesso.
Deve ser mesmo uma crença metafísica, muito bem citada pelo jornalista Bob Faria esta semana num desses programas diários do noticiário esportivo. Se você não sabe, crenças metafísicas são crenças sobre a existência, natureza e estrutura de aspectos não observáveis da realidade. Em outras palavras, é a construção de uma realidade psiquicamente, a partir do pensamento. De tanto pensar que vai conseguir as seis vitórias, o torcedor do ABC passa, inevitavelmente, a acreditar e ter fé de que elas irão acontecer.
Não lembro exatamente onde li e de quem é essa reflexão, mas diz que “devemos seguir acreditando nas utopias, pois sem utopias não existem sonhos, sem sonhos não existe esperança, sem esperança não existe transformação, nem luta por uma sociedade melhor (mais humana, livre, igualitária e justa)”. Completo: sem esperança não existirão as vitórias e sem elas estaremos rebaixados.
Continue acreditando sim. Acredite que é possível o impossível. Assim como é possível um homem pousar nu na revista Playboy, político parar de fazer promessas em época de campanha eleitoral e o Silvio Santos ser, um dia, dono da Rede Globo. Assim como é possível Mossoró ser nomeada, por um natalense, capital do Rio Grande do Norte, e o sertão do Seridó viver livre, para sempre, dos males da seca e da falta d’água.
Pra falar a verdade, admito que em 99% das vezes falo com a razão, prefiro ser a voz realista. Aprendi vivendo e aperfeiçoei com o mestre Fernando Amaral. Mas também sou 1% torcedor. Também sofro dessa crença metafísica e tenho um pouquinho de fé guardada no fundo do meu coração.
Hoje mesmo, no meu escritório do bosque, pedi uma forcinha aos meus santos prediletos e rabisquei uma vontade no chão de areia.
– ABC, 6 vitórias.
Fiz minha parte! Mesmo que a chuva, o vento, os passarinhos ou algum tipo de adversário passe por ali e apague de uma vez por todas as chances de uma recuperação do meu time no campeonato.
E continua a oração interesseira. Minha Nossa Senhora…