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Até onde vai seu preconceito?

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Por Handersson Barros

Hoje de manhã despertei aflito de um pesadelo. Tive um sonho bizarro em que todas as pessoas falavam a verdade, o que sentiam e o que pensavam – mas isso não seria bom? -. Nesse sonho não havia moralismo, preconceito ou o “politicamente correto”. As pessoas falavam o que vinha na telha. – mas isso é ótimo? – também pensava dessa forma até ter esse maldito pesadelo. O que vi foram pessoas falando mal uma das outras, vi xingamentos explícitos, homofobia, misoginia, machismo, transfobia, racismo e todas as formas de preconceito e opressão existentes.

Não estou aqui cantando uma ode ao preconceito ou mesmo validando sua prática; ao contrário, penso que o julgamentos-estereotipos-e-preconceitos-290269-8moralismo e seus arraigados são na verdade formas de ignorância revestidas por hábitos. Mas será que todas as pessoas têm preconceitos? Certamente sim. A categorização é uma das formas que nossa mente encontrou para economizar tempo, atenção e nos prevenir frente às adversidades. Esse artifício mental é adaptativo e utilizado com constância no nosso dia-dia. Categorizamos objetos, lugares, sentimentos e, infelizmente, pessoas. Quando uma avaliação de valor é aplicada sobre as categorias têm-se os estereótipos; quando uma avaliação afetiva é empenhada sobre as categorias têm-se os preconceitos. A expressão desses traz consigo a discriminação, esta ocorre quando indivíduos são tratados de forma diferente por pertencerem a determinado grupo, tal distinção pode beneficiar ou prejudicar a pessoa discriminada.

O problema se dá quando tentamos distinguir o afeto e o valor das coisas – se é que isso é possível -. Nesse sentido, caímos no antagonismo cartesiano razão x emoção que até hoje quebra a cabeça de muitos filósofos. Apesar de ainda haver discordância entre os cientistas sobre essa distinção, pode-se notar atualmente uma desconstrução do binômio cognição x emoção, esta última passando a representar parte da primeira. Em outras palavras, a emoção passa a ser considerada como parte da cognição.

Nesse contexto, podemos montar um breve silogismo para melhor compreender a afirmação feita no segundo parágrafo sobre todas as pessoas terem preconceitos. Vejamos bem: todas as pessoas categorizam; toda categoria trás consigo um avaliação afetiva; toda avaliação afetiva sobre as categorias resulta em preconceitos. Logo, todas as pessoas têm preconceitos. – Mas como? Eu sempre fui politicamente corretx; tenho plena certeza de não ter preconceito algum -. Dostoiévski explicita bem essa questão quando “pré-conceitua”: Todo homem tem recordações que ele não diria a ninguém, a não ser aos seus amigos. Também possui outras lembranças na sua mente que não revelaria mesmo aos seus amigos, mas apenas a ele próprio, e assim mesmo em segredo. Mas há outras coisas que um homem tem medo de dizer até a si próprio e todo homem decente tem um certo número dessas coisas guardadas na mente.” Nessas linhas o autor demonstra que existem pensamentos os quais escondemos da nossa consciência, quando tais pensamentos são preconceitos se constitui o que chamamos na psicologia de preconceito implícito. Apesar de ser mais velada, tal forma de julgamento pode nos levar a agir de forma preconceituosa com outros, mesmo sem nos darmos conta disso.

      Neste momento você deve estar se perguntando: – então como posso saber se estou agindo de forma preconceituosa com um certo grupo?- Frente a questionamentos desse tipo um grupo de cientistas da Harvard University desenvolveu o Implicit Association Test (IAT), o qual, felizmente, já foi traduzido para o português e pode ser facilmente encontrado no Google como “Teste de Associação Implícita” (TAI). Qualquer um, gratuitamente, pode realizar o teste e receber o resultado na hora. O TAI se distribui em sete modalidades: Gênero, Sexualidade, Cor da pele, Raça, Países, Idade e Peso. O teste basicamente mensura atitudes e crenças que não queremos ou não conseguimos revelar, desse modo expondo alguns preconceitos que possuímos e muitas vezes não nos damos conta.

      Voltando ao pesadelo, se o que impede uma pessoa de expressar seus reais pensamentos não existisse como seria a sociedade? Responderia que seria perfeita; até ter meu pesadelo. Pensava que a causa do preconceito fosse o moralismo chulo, mas vejo que esse serve apenas para encobrir a sua feia face. É vestindo a expressão do preconceito que o moralismo estrutura o edifício da opressão.

Admitir que fazemos prejulgamentos com relação as pessoas não equivale a aprovar ou apoiar tal prática; recusar esse fato não resolve a problemática que o constitui – por mais difícil que seja aceita-lo-.Uma melhor compreensão sobre essa temática é a via de saída para diminuir o preconceito e todas as suas reverberações na sociedade.