Nada de artilheiros matadores, zagueiros xerifões, muito menos defesas de placa de goleiros. O nome da rodada estava do lado de fora das quatro linhas dos gramados. O treinador do América, Roberto Fernandes, que um dia não muito distante já foi endeusado no ABC, foi o grande destaque do fim de semana futebolístico na terra dos comedores de camarão.
Enquanto discursava bonito na coletiva de imprensa, após o empate com o Globo, em Ceará-Mirim, Roberto resolveu tirar satisfação com um torcedor adversário que estava quase ao seu lado, xingando o treinador. Só não foi as vias de fato, porque os seguranças do América impediram o pior de acontecer.
E não foi a primeira vez que Roberto Fernandes protagonizou cenas, digamos, de descontrole temperamental. Tudo bem que o caboclo torcedor do time de Marcone Barreto provocou. Aliás, aquele espaço onde ocorreu o quiproquó deveria ser restrito aos profissionais do espetáculo, diretores e a imprensa que cobria a partida. Na verdade se tratou de uma sucessão de erros. O Globo ao permitir a presença de um estranho em local restrito, o torcedor por desrespeitar Roberto e o próprio Roberto Fernandes pela atitude desmedida, não condizente ao cargo e a posição pública que possui.
Roberto Fernandes precisa entender – e ele é inteligente o suficiente para isso – que suas atitudes serão sempre espelho para seus comandados. Ainda mais na fase atual que enfrenta o time americano – em declínio de resultados, visualizando o crescimento do maior rival – o ABC – e por enquanto único candidato a fazer frente a si no campeonato. Convenhamos que o técnico do América as vezes parece querer que sua estrela brilhe mais do que as de seus jogadores.
Não vou absolvê-lo, mas talvez a culpa nem seja totalmente dele. Aparentemente essa parece ter sido mais uma transformação ou padronização das que sofreu o futebol nas últimas décadas. Tostão inclusive abordou esse tema em sua crônica de domingo esta semana.
“Nas décadas de 1950 e 1960, os técnicos eram discretos, orientadores. Ninguém se lembra de Lula, técnico do Santos de Pelé, talvez o maior time de todos os tempos. Ayrton Moreira, treinador do Cruzeiro, batia papo com os repórteres, enquanto fazíamos longos treinos coletivos. Dizem que o gordo Feola cochilava durante as partidas da Copa de 1958. Com o tempo, por causa do avanço da ciência esportiva e da estatística, houve, progressivamente, uma supervalorização e uma vedetização dos treinadores. As análises das partidas passaram a ser feitas a partir dos resultados e da conduta dos professores”.
Não quero com isso afirmar que essa “supervalorização e vedetização dos treinadores” citadas no texto são fatores negativos. Muito pelo contrário, acredito que essa evolução foi boa para o jogo. O jogo passou a ser aprimorado – e aqui não entro na discussão se o futebol se tornou mais chato, pois são cenas de outros capítulos mais polêmicos ainda – a medida que os treinadores ganharam mais peso na balança. O que critico é a conduta de alguns treinadores atuais.
Não é difícil perceber a personalidade forte de Roberto Fernandes. No futebol moderno, cada treinador tem seu estilo e sua maneira de impor liderança. Roberto segue uma conduta à sua maneira. Ele necessita de atenção de todos para ser um líder. Nem que seja da pior forma possível, se envolvendo em polêmicas ou através de declarações egocêntricas. Tudo bem, ninguém é obrigado a mudar. Mas assino o texto com toda certeza de que assumir esse papel de protagonista exageradamente, como ele faz, é altamente prejudicial a ele e principalmente a quem ele serve, o América Futebol Clube.