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Diante de nossa teatralidade social é proibido ficar triste

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Muitos desconhecem ou ignoram o fato de que para a vida em sociedade como a nossa, é necessário existência de uma curiosa e teatralidade social que faz com criemos poderosas máscaras. E neste contexto as individualidades são sufocadas e pessoas acabam por se sustentar em personagens adaptativos para sobreviver e serem aceitos no grupo em que estão inseridos.

E uma das trágicas características de nossa teatralidade social é a proibição de sentir tristeza, que mais parece ser interpretada como doença em nossos dias. Observe o quanto de opressão (psíquica e emocional principalmente) os indivíduos suportam em seus cotidianos de trabalho alienante, adoecendo e tendo que camuflar suas reais condições para não comprometer a sustentação de suas máscaras (rico, bonito, fashion, gostosa, erudito, etc).

Em nossa concepção a tristeza pode ser um convite à si mesmo, mas parece um sinal de alerta avisando que existem questões psíquicas há serem resolvidas. Mas, a reação mais comum é evitar a dor, uma dor que convida para reflexão sobre o que se está fazendo, quem se é de fato, etc.

Nesta sociedade desumana e intolerante não assumir a tristeza é um fingimento social fundamental para sua manutenção. Pois o que sustenta as máscaras sociais são as aparências e a permanente representação a realidade!!! Isso mesmo, uma realidade que não tem que ser sentida com emoção, calor humano e envolvimento, mas representada, bastando apenas aparentar ser o que se diz por aí.

Um dos importantes mecanismos de fuga e negação da dor e tristeza é construção de um mundo imaginário, presente nos discursos e aparências. As redes sociais parecem ser um reflexo deste fenômeno, observa-se em muitos casos uma diferença abissal entre o que a pessoa é de fato, na crueza do dia-dia, e o que a mesma deseja ser (pensa ser) ou aparenta em suas poses narcísicas e exibicionistas no facebook.

A ilusão da completude é um dos grandes tormentos do indivíduo contemporâneo, que acha que poderá viver sem dores, fragilidades e conflitos, sendo “feliz” absolutamente. Pergunto: quem são os seres sociais (rico, pobre, feio, bonito, homo, hetero) que não carregam insatisfações, fragilidades e angústias existenciais??? A diferença é que uns as assumem e outros camuflam, negam e por isso adoecem seriamente. E querer eliminá-las (sem entender e administrar) é perigosa ilusão.

Neste contexto é inevitável que o indivíduo fique despersonalizado e incapaz de sustentar uma singularidade, pois sempre tentando uma adaptação e apego aos modelos de comportamento majoritário. As características comuns são a falta de espontaneidade e pobreza de afeto em seus atos, pois alegria e tristeza são substituídas por pela indiferença e animação de plástico e artificial.

Outro caminho pode ser construído a partir do momento em que o indivíduo assume suas angústias e aprende a lidar com as emoções (boas e ruins). Pois ao invés de viver de adaptações à modelos de comportamento massificado, terá uma singularidade à administrar. Com um EU consolidado pode até deixar de ser uma fácil cobaia do consumismo doentio e do fascinante discurso de achar que será feliz quando tiver um carro ou uma casa como daqueles passam na TV.

Discursos imaginários comuns: “se for rico serei finalmente feliz”, “se obter tal aparência serei feliz e muito respeitada/admirada”. E em nome disso muito energia psíquica e emocional é desperdiçada e mal direcionada para o aparentar e uma buscas ilusórias. E o ignaro ainda pergunta porque que tal lacaio  está em depressão, com comportamento agressivo ou usando drogas, etc.

Este mesmo ignaro é capaz de pensar: “Poxa, não consigo entender…o ator hollywoodiano milionário, bonito, cheio de mulheres e carros de luxo morreu de overdose, deixou uma carta infeliz! Mas ele tinha tudo!!!” ou “Por que a atriz linda e famosa, capa da Revista Caras, suicidou-se?” . Sobre esta opinião só podemos afirmar que a ignorância é vizinha da maldade.

Mesmo num cotidiano de tristeza (insensibilidade, miséria afetiva, precariedade pessoal, olhares opacos, corpos maltratados e autorejeição extremada), os seres perambulantes alimentam o ritual de fingimento social, que camufla a realidade e proporciona um alívio instantâneo: dançar e ouvir em volume máximo a música da rádio que diz “ÔÔÔ Alegria meu amor!!” ou aquela que diz “Deixa a tristeza de lado e vamos dançar’!!

Para finalizar, reconhecemos que o pior é que quando as máscaras sociais se tornam rostos e os indivíduos nem se quer tem condições de perceber o quando se despersonalizam e perambulam a vida inteira em mundos imaginários e buscas ilusórias. Que só geram adoecimento e reprodução de poderoso rebanho social.