A Confirmação da Octingentésima Morte Matada no Estado Elefante
Por Ivenio Hermes
No dia dos namorados e também o dia da estreia do Brasil na Copa do Mundo de 2014, que Ítalo Vinicius da Silva Rodrigues, de 22 anos de idade, se tornou a octingentésima morte matada no Rio Grande do Norte. Ítalo Vinicius assistia ao jogo Brasil x Croácia com sua esposa e uma criança, quando homens invadiram sua casa e o puseram fim à sua vida usando armas de fogo.
A curva de tempo tem se mostrado ligeiramente constante entre cada período que completa um ciclo de 100 mortes, sendo que no mês onde o grande reforço na segurança para a copa deveria fazer mais efeito, temos de fato o segundo período mais curto.
O ciclo da morte continua no Estado Elefante e nem o pseudo patriotismo desencadeado pelos jogos da seleção brasileira foi capaz de impedir que que o Rio Grande do Norte mantivesse o índice de mais 4 mortes violentas letais intencionais por dia. Apenas 19 dias após o 700º assassinato, a vítima de número 800 foi feita em Umarizal, um município que se destaca nos números da violência homicida.
Umarizal possui uma população de cerca de 10.900 habitantes e 11 assassinatos em 2014, sendo 3 vítimas com idade inferior a 29 anos. O índice por cem mil habitantes, eleva Umarizal para a primeira colocação entre as 17 mais violentas do estado, ou seja, 100,98 cvli x 100mil hab. Outras cidades seguem Umarizal nesse ranking de mortes matadas: Baraúna (72,11), São José de Mipibu (59,04), Extremoz (56,23), Areia Branca (40,94) e Macaíba (39,71).
Em números absolutos as cidades que se destacam são: Natal, com 261 homicídios sendo 175 vítimas menores de 29 anos, Mossoró com 84 homicídios sendo 55 contra menores de 29 anos, Parnamirim com 70 e São Gonçalo do Amarante 37 homicídios, sendo 36 e 26 contra menores de 29 anos de idade respectivamente.
O Estado do Rio Grande do Norte já está com 23,78 homicídios por cem mil habitantes e suas 800 vítimas estão mais presentes no Leste Potiguar, onde se encontra a Região Metropolitana de Natal. São 62% ou 487 vítimas, sendo 320 destas pertencentes à população jovem, ou seja, menores de 29 anos. Em seguida vem o Oeste Potiguar, no outro extremo do Estado, onde se concentram 26% ou 205 vítimas de mortes matadas, sendo 111 vítimas jovens.
O Agreste e a Central Potiguar juntos não somam nem a metade do Oeste. Com 5% no Agreste e 7% na Central, as duas regiões somam 98 homicídios sendo 55 contra a população jovem.
Todas as Regiões do Estado se encontram em escala ascendente na linha de tendência da medição da violência homicida entre jovens e entre adultos.
A mortandade deflagrada tem se apresentado com extremos facilmente identificáveis. Dos 800 crimes letais cometidos, 672 deles se deram com o uso da arma de fogo como instrumento para efetivação do delito; 750, foram cometidos contra homens; 550 contra negros e pardos; 490 contra os menores de 29 anos de idade e 253 contra aqueles que tem acima desta idade.
Outra marca lamentável que temos registrado diariamente são as tentativas de homicídio, que apenas adiam e/ou freiam a contagem dos cvli no Estado Elefante. Nesses 163 dias, temos o registro de 255 tentativas. Encabeçando a lista, temos Mossoró, a Capital do Oeste, com 127 ocorrências, contabilizando sozinha 50% das ocorrências dessa modalidade de crime, sendo então seguida por Macaíba, com 42 tentativas ou 16% e Natal com 26 crimes ou 10%. A partir daí surgem outros municípios que dividem o restante desse quantitativo de crimes contra a vida.
As 800 mortes em 163 dias, ou seja, 5 meses, uma semana e 5 dias do ano de 2014 mostram que a segurança planejada para a Copa do Mundo é sazonal e sua efemeridade parece ser mais frágil do que se imaginava. Cada dia a população potiguar acorda para a sorte de chegar viva ou não no final dele, não pelos meros acasos da vida, mas pela insegurança que torna a morte matada cada vez mais cotidiana e banalizada.
Toda a falta de investimento e contratação de pessoal, de ausência de políticas públicas de segurança e planos estratégicos bem definidos para sua efetivação, dão a mostra de seu resultado na vida e morte diária de cidadãos potiguares.
Não basta somente adquirir viaturas, armamentos, munições, coisa que nem se faz de forma suficiente, sem antes investir em quantitativo e qualitativo do plantel de policiais que querem prestar um bom serviço, mas que não possuem os meios para isso. A população potiguar precisa de segurança pública atual, iminente, inadiável para depois da copa ou eleições, precisa de uma segurança pública duradoura e que dure além das festividades de um esporte mega valorizado acima de vidas humanas e cujo maior legado será a riqueza de poucos, e a perda das vidas de muitos.
_______________
SOBRE O AUTOR:
Ivenio Hermes é escritor Especialista em Políticas e Gestão em Segurança Pública e Ganhador de prêmio literário Tancredo Neves, ativista de direitos humanos e sociais e pesquisador nas áreas de Criminologia, Violência Homicida, Direitos Humanos, Direito e Ensino Policial.
_______________
DIREITOS AUTORAIS E REGRAS PARA REFERÊNCIAS:
É autorizada a reprodução do texto e das informações em todo ou em parte desde que respeitado o devido crédito ao(s) autor(es).
HERMES, Ivenio. Os 800 Assassinatos no RN em 2014. Disponível em: < http://j.mp/1p2ryQ5 >. Publicado em: 13 jun. 2014.