Por Emanuel Freitas
Doutorando em Sociologia (UFC)
Professor de Sociologia (UFERSA)
Conhecer a política brasileira é, antes de tudo, conhecer seus personagens, os atores que jogam o jogam, aceitando suas regras. E, sem dúvida alguma, um dos mais intrigantes (e, por isso mesmo, fascinantes) chama-se José Serra. Egresso do movimento estudantil, tem em seu currículo a presidência da UNE quando do Golpe Civil-Militar de 64. Ainda consta gravado seu discurso antes desse fatídico assassínio de nossa democracia, em que escutamos Serra a denunciar a utilização da religião para enganar as pessoas (Ah, se esse Serra visse o Serra de 2010!!!!).
Serra teve de exilar-se durante a ditadura. Junto com Fernando Henrique Cardoso foi o responsável pela elaboração da “Teoria da Dependência”, que encetou um debate muito proveitoso com os rumos do país, em contraponto às idéias de Ruy Mauro Marini. Voltou ao Brasil em 1977 e ocupou cargos no CEBRAP. Elegeu-se deputado constituinte e depois senador por São Paulo. Na Era FHC ocupou os cargos de Ministro do Planejamento e de Ministro da Saúde, que lhe deu um grande destaque internacional, sobremaneira pela criação dos genéricos e pela política de combate à AIDS.
Enfim, José Serra escreveu seu nome na história brasileira.
Foi candidato à Presidência da República em 2002. Na disputa interna, travou um confronto com Tasso Jereissati, que deixou rusgas entre os dois até hoje, levando o cearense a retirar seu apoio e de todo o tucanato cearense a Serra, preferindo o nome de Ciro Gomes. Perdeu para Lula. Em 2004 derrotou Marta Suplicy e tornou-se prefeito de São Paulo, deixando Gilberto Kassab dois anos depois no cargo para disputar e sair-se vencedor ao governo estadual. Nesse cargo, algumas de suas atitudes o tornaram mais impopular; exemplo disso foi sua sugestão de que os baixos índices de educação em São Paulo concentravam-se na região com “nordestinos”.
Veio a disputa presidencial de 2010. O Serra da UNE que combatera o uso da religião como palanque eleitoral viu agora outro Serra: frequentador de missas e cultos, leitor da Bíblia, utilizador de dossiês etc. Um Serra que, segundo queixas do DEM, maior partido a apoiá-lo, não escutava ninguém, tocava a campanha sozinho. Mas Serra disputou aquela eleição sufocando, mais uma vez, um outro possível candidato do PSDB: o mineiro Aécio Neves, que tentara todas as possibilidades de debate interno e, até mesmo, a realização de prévias para a escolha do candidato tucano. Serra prevaleceu. São Paulo prevaleceu. Quem não lembra do episódio da “bolinha de papel”?
Terminada a eleição, protagonizou uma das maiores deselegâncias da política dos últimos anos: esperou que Dilma Rousseff, candidata vencedora, fizesse seu discurso de vitoriosa para depois fazer o seu, de perdedor.
Contudo, segundo ele mesmo, não havia perdido aquela eleição: “quis o eleitor que não fosse dessa vez”, disse ele.
Bem, Serra quis disputar, em 2012, a eleição para a Prefeitura de São Paulo. Novamente operacionalizou o sufocamento das outras candidaturas tucanas que se colocavam. Novamente, nada de prévias. O trator Serra passou por cima. Perdeu a eleição para o petista Fernando Haddad.
Em 2014 o PSDB decide por Aécio Neves. Serra permaneceu calado por muito tempo. Retornou ao espaço político por meio de “notas” que asseguravam ser ele o candidato a vice de Aécio. Deixou a expectativa criar corpo. Eliane Catanhêde, sua defensora-primaz, chegou a escrever que Serra não se conformaria em ficar morando num apartamento funcional de deputado. Melhor, e digno, para ele seria o Palácio Jaburu, onde fica o vice-presidente.
Serra, mais uma vez deselegantemente, vem a público negar. Vejamos suas palavras: “Há coisas que chegam a ter a sua graça”, disse ele, há coisas que fazem rir!!! Serra diz ter sido “literalmente atropelado” (teria sido na Paulista ou na Augusta?) pela informação de que seria vice de Aécio. “Nunca fui candidato a vice”, diz ele. Mas, e se o PSDB optasse por essa via? O que Serra faria? Ele não diz. A decisão é apenas dele. “Quem fala o que penso sou eu mesmo”, o partido não fala por mim, nem eu tomo para mim a voz do partido, parece sugerir ele. “Serei candidato a um cargo no Legislativo …. e só”, diz ele. Somente a isso! Portanto, Serra lança sua candidatura e já pede o voto do eleitor. A nota termina sem nenhum pedido de Serra de votos à candidatura de Aécio. Não diz que este será o sei candidato a presidente. Diz apenas querer derrotar o projeto que está aí. Ok, mas com quem? Com Aécio? Com Eduardo? Com o Pastor Everaldo? Com quem? Serra não diz.
Lembre-se da troca de acusações que protagonizou com Aécio na pré-campanha de 2010, tudo muito bem documentado no livro “A privataria tucana”.
Serra é um poço de amargor, de amargura, de rancor. Infeliz de quem tiver a sorte de ser um seu desafeto. Serra é ele e pronto. O resto, bem o resto.