Por Ivenio Hermes e Marcos Dionisio Medeiros Caldas
A correnteza da violência do Rio Grande de Morte, sem obstáculos efetivos ofertados pelo Governo do RN, continua arrastando vidas em seu curso cruel, destruindo famílias e inviabilizando qualquer mínima qualidade de vida nas comunidades mais atingidas.
Essa correnteza quer desmoralizar também nosso frágil Estado de Direito.
A mediocridade que se apossou da gestão estadual, que parece satisfeita com a contínua marcha do RN na direção da barbárie consubstanciada no elenco das vidas ceifadas, nos justiçamentos de pessoas, da agressão ao gestor da Semob, no atentado a ônibus em Natal e em Mossoró, no genocídio contra crianças e adolescentes, no assassinato de moradores de rua, nas mortes e nas agressões a membros da comunidade LGBT potiguar, nas mortes que se repetem nos lastros da guerra entre torcidas, ditas organizadas, nos 15 grupos de extermínio, em franco funcionamento na Região Metropolitana de Natal, no crescente número de feminicídios num Estado governado por uma mulher, num festival de assaltos, arrombamentos, roubos, furtos e uma ciranda de roubos de carros, alguns tomados de assaltos, que já preocupam as empresas seguradoras.
A violência vai apresentando também sua fatura econômica, e vastos setores começam a descobrir que não estão numa redoma, por mais cuidadosos e bem aquinhoados que sejam.
Já são sete municípios com 10 ou mais assassinatos nesses 75 dias de 2014, pois o policiamento ostensivo com a quantidade pequena de agentes, não pode fazer frente à impunidade que deveria ser obstaculizada por ações concorrentes e supervenientes da polícia judiciária e da perícia científica. Somente Natal é responsável por 52,9% ou 127 mortes, seguido por Mossoró com 14,1% ou 34 homicídios. Dos 7 municípios, 6 pertencem à Região Metropolitana ou Grande Natal, concentrando 85,8% dos crimes violentos letais intencionais.
Mas se a ausência do Governo é sentida, vozes já um tanto roucas, de tanto alertar sobre a guerra civil potiguar, recebem o apoio de outras vozes, para juntas cobrarem da atual gestão um posicionamento coerente e verossímil sobre a segurança pública no Rio Grande do Norte. Reforçar o estado de Direito, superar a impunidade seletiva, desativar atos de violência anunciados pela falência estatal, que nos vulnerabilizou em relação aos estados vizinhos que se esforçam para proteger suas comunidades.
Somente na última semana o Ministério Público do Estado do RN concretizou duas importantes intervenções. Na primeira entrou com uma ação civil pública pedindo suspensão de contrato de R$ 25 milhões com publicidade, até que o Governo justifique a não priorização da segurança pública em detrimento da publicidade, e na segunda iniciou um trabalho interno de controle mais incisivo sobre o índice de solução nas investigações de homicídios, pois atualmente somente 8% são encerrados com a confirmação de autoria e destes, apenas 20% atingem o restante da persecução penal chegando à uma condenação.
O SINPOL – Sindicato dos Policiais Civis do Rio Grande do Norte é outro órgão que impõe acirrada fiscalização ao descaso com a segurança e na semana passada levou a situação da DP de Macau à rede nacional de televisão, onde presos estavam sendo mantidos amarrados nos corredores, num convívio inadequado entre homens e mulheres, pondo em risco os policiais e o público. As associações de praças da Polícia Militar também cobram veementemente soluções da Gestão Administrativa Estadual, sobretudo no que diz respeito a necessária superação das castas constituídas pela não promoção.
Policiais que deveriam labutar na investigação e elucidação dos crimes ficam zelando pelo tratamento desumano e cruel ofertados pelo Governo do Estado aos presos, que os mantêm atados por cordas ou afivelados em argolas presas às paredes e chãos. Cenas que nos remetem diretamente às senzalas e cafuas.
O jornalismo esclarecido se uniu em busca de ampliar a divulgação dos índices de violência e fazer um chamamento à sociedade. O Jornal De Fato está sempre divulgando artigos, publicando matérias e expondo estatísticas. Nesse contexto, a Tribuna do Norte lançou uma série de matérias radiografando os números da insegurança social no Estado. O Jornal de Hoje também tem coberto o tema, cobrando uma intervenção estatal que suste o descalabro administrativo e o ceifar de vidas, no que são bem acompanhados pelas InterTV Cabugi e TVU, dentre outros veículos. Além dos espaços democráticos do mundo virtual.
No 3º final de semana de março de 2014, houve um homicídio a mais que o período correspondente em 2013, continuando com assassinatos de adolescentes e sem nenhum feminicídio. Os municípios de Caicó e Natal foram os únicos que se repetiram em número de mortes nos períodos comparados.
Como faz parte da contrapartida do Estado no projeto Brasil Mais Seguro convocar policiais e estabelecer a Divisão de Homicídios, essa seria com certeza, a alternativa mais perceptível. Enquanto isso não ocorre, nesse Rio Grande de Morte, surgem novos construtores de barragens visando diminuir a vazão da violência. Os crimes que ocorrerem devem ser represados e direcionados para o sumidouro da resolutividade resgatada que encerre a impunidade inundante, e para esse papel não existe melhor solução do que reforçar o número de trabalhadores dessa grande obra de edificação social. Portanto, recompor o plantel das Polícias, sobretudo, da Polícia Civil, não passa pela violação à Lei de Responsabilidade Fiscal, passa pela adoção de medidas modernizadoras da administração, na diminuição do excessivo número de cargos comissionados que tem sua assunção determinada por conchavos politiqueiros e não pelo dever de servir ao público.
Reduzir o conforto político partidário, enxugando o quantitativo de cargos comissionados, ensejaria a economia razoável para nomeação dos policiais necessários para instituição da Divisão de Homicídios.
Até éramos contrários à criação da Divisão, uma vez que, conceitualmente, deveria caber às circunscrições policiais, sediadas nas comunidades a adoção de investigação para o esclarecimento dos crimes. A expansão dos homicídios por comunidades antes pacatas, todavia, nos força a aceitar essa iniciativa que pode se prover num atalho para reversão urgente, da alarmante criminalidade corrente no nosso estado.
Construamos com nossa luta cívica, represas e barragens de Cidadania para dar um #Basta de Violência no RIO GRANDE DE MORTE inserido, infelizmente, numa torrente de dores, traumas e no vilipêndio aos direitos humanos elementares, dentre eles, o direito à segurança e a paz.
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SOBRE OS AUTORES:
Ivenio Hermes é Escritor Especialista em Políticas e Gestão em Segurança Pública e Ganhador de prêmio literário Tancredo Neves. Colaborador e Associado Pleno do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró. Pesquisador nas áreas de Criminologia, Direitos Humanos, Direito e Ensino Policial.
Marcos Dionísio Medeiros Caldas, advogado e militante dos Direitos Humanos, Presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos/RN e Coordenador do Comitê Popular da Copa – Natal 2014, com efetiva participação em uma infinidade de grupos promotores dos direitos fundamentais, além de ser mediador em situações de conflito entre polícia e criminosos e em situações de crise de uma forma geral.
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DIREITOS AUTORAIS E REGRAS PARA REFERÊNCIAS:
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HERMES, Ivenio; CALDAS, Marcos Dionisio Medeiros. Para Construir Barragens e Represas no Rio Grande de Morte. Disponível em: < http://j.mp/1g8oMIp >. Publicado em: 18 mar. 2014.