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Evitando a Efervescência da Violência Numa Sociedade Carente

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Por Ivenio Hermes

Um discurso sem equilíbrio

Durante recentes eventos acontecidos em todo Brasil, onde a face da inversão de valores, demonstrada por incentivadores da “falsa justiça”, percebe-se um retrocesso social em direção à barbárie. Essa prática que subverte valores inverte conceitos morais e destroçam o tecido social já tão sofrido com as manobras políticas em cima das leis e a falha na promoção dos direitos humano fundamentais, tem sido objeto de diversas incursões da mídia, causando muitos discursos pró e contra a ação popular.

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Recebendo menos notoriedade, contudo num grau maior de repercussão, estão as execuções sumárias, onde pessoas são perseguidas e mortas com tiros no rosto, numa violência exacerbada e com excesso de meios, onde se observa claramente a intenção prévia de eliminar a vítima. Embora os meios físicos sejam os mais perceptíveis, como o linchamento e o assassinato praticado por grupos de justiceiros.

Sendo feita pela ação popular que busca uma justiça rápida ou pela ação de vigilantes, justiceiros, grupos de extermínio ou outro tipo qualquer, o justiçamento precisa ser visto sob a iluminação de algumas lâmpadas diferentes dos holofotes que “glamourizam” esse comportamento.

Há também a ação de parte da mídia tendenciosa em promover um tipo de jornalismo que leva algumas pessoas à condenação pública, antes de lhes serem garantido o direito de se defender e outras formas que causam nulidade aos direitos de defesa que todos possuem ou tornem essa defesa ineficaz diante de um olhar preconceituoso.

Um incentivo à barbárie

A impunidade coletiva e individual que deixa o indivíduo sem confiança no Estado como seu protetor e protetor de seus direitos, o faz enveredar pela justiça própria, sendo que esta provoca a mesma reação nas vítimas de sua justiça, que retornam em busca de vingança, criando um ciclo que se renova a cada morte, a cada ato de violência.

A prática de “fazer justiça com as próprias mãos” é uma ação danosa à sociedade e ao sistema de convívio social baseado no respeito à vida e à dignidade humana, pois subverte conceitos de paz e do julgamento adequado, promovendo uma punição rápida para alguém que ainda não foi julgado segundo as leis vigentes.

Essa prática encontra incentivadores em todos os meios, pessoas formadoras de opinião agem segundo seu próprio senso de realidade e não percebem o dano potencial de suas palavras.

Além disso, falhas na forma de promover a segurança pública e a persecução penal têm levado alguns a optarem por essa prática, ou seja, a ausência do Estado em cumprir com sua parte na proteção de seus cidadãos motiva pessoas e grupos a cobrirem essa lacuna de acordo com seu julgamento.

Juntando o incentivo de alguns e a ausência do Estado, um falso senso de justiça se cria e recria, adotando diferentes nuances e facetas que apenas evidenciam que o homem, propenso à violência e sem os freios das regras de convivência em sociedade – as leis – retornam ao seu estado de barbárie e voltam à prática primordial da lei de talião: olho por olho, dente por dente, e retalia o crime cometendo outro.

Uma sociedade em ebulição

A sociedade civil pode despertar para o discurso à favor da violência e se posicionar contra a promoção da barbárie, como no recente caso mostrado por Jackson Damasceno, da TV Ponta Negra, afiliada do SBT, que apresentou um homem que tentara assaltar uma menina com uma faca de serra, mas foi detido por populares, que poderiam ter feito pior, mas se detiveram diante da vontade indômita de “justiçar” e o deixaram amarrado numa parada de ônibus.

Sem policiamento ostensivo suficiente para responder ao chamado dos populares, o criminoso ficou amarrado por mais de 25 minutos quando foi libertado por seus amigos e foram embora tomando rumo ignorado.

A sensação de impunidade angustiou aquelas pessoas, assim como o faz como quem já foi vítima de qualquer tipo de violência e percebe a ausência mascarada do Estado que afirma está fazendo algo que ninguém enxerga.

Entretanto, a maioria das pessoas ainda sonha em ver a justiça ser alcançada de forma isonômica e respeitadora de todos os seres humanos, diferente do justiçamento, que não percebe os direitos e utiliza preconceitos para aplicar uma pena, muitas vezes desproporcional ao delito cometido.

Para prevenir que a situação de prática de justiçamento continue, é preciso redefinir Segurança Pública como Política de Estado, integrando-a com a Educação, principalmente, num remodelamento da forma de pensar das gerações futuras, que serão menos propensas ao crime, se tiverem mais chances de pensarem na sociedade como um ente coletivo. Todo esse processo não se limita a ações imediatistas, que somente abrangem um período de Governo, quando conseguem esse efeito, elas visam soluções programadas e planejadas para serem executadas por todos os Governos, independente da política partidária.

Enquanto esse processo se desenvolve, é necessário coibir a prática atual através de policiamento ostensivo integrado com o investigativo, da valorização profissional do policial, do aumento da velocidade do processo de investigação e da criação de um sistema de segurança pública célere, que evite o desperdício de tempo e o dinheiro público, recriando a fé da população na polícia e na justiça, evitando a efervescência da violência numa sociedade carente de ordem e paz.

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SOBRE O AUTOR:

Ivenio Hermes é Escritor Especialista em Políticas e Gestão em Segurança Pública e Ganhador de prêmio literário Tancredo Neves. Colaborador e Associado Pleno do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró. Pesquisador nas áreas de Criminologia, Direitos Humanos, Direito e Ensino Policial.

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DIREITOS AUTORAIS E REGRAS PARA REFERÊNCIAS:

É autorizada a reprodução do texto e das informações em todo ou em parte desde que respeitado o devido crédito ao(s) autor(es).

HERMES, Ivenio. Evitando a Efervescência da Violência Numa Sociedade Carente. Disponível em: < http://j.mp/PlzFf7 >. Publicado em: 10 mar. 2014.