Por José cleyton, Mestrando em Ciências Sociais
O caso da jovem de Goiânia, Fran, traz à tona um crime cada vez mais comum: a exposição não consentida da intimidade com o único fim de destruir publicamente a reputação da vítima. Mas se não bastasse o sofrimento causado por esse ato tão perverso e covarde, a vítima ainda precisa conviver com os comentários hipócritas, difamadores e não menos perversos.
Esse tipo de crime é visto por parte da sociedade do mesmo modo que o estupro, isto é, a vítima teria dado algum “motivo” e apenas sofreu os efeitos. Nesse caso, é associado, quase sempre, à indumentária e ou estar num local e horário inapropriado para uma mulher “descente” (leia-se: privada de liberdade, confinada a uma moral autoritária e opressora).
O crime virtual descrito acima, por sua vez, é vinculado ao suposto caráter da vítima. Já que uma mulher “descente”, conforme a mentalidade opressora, não se presta a nenhum tipo exposição. Poucas coisas, a meu ver, são tão horrendas quanto esse tipo de “justificativa”. Primeiro porque transforma a vítima em algoz. E, segundo, porque expressa a mais intragável hipocrisia de uma sociedade machista e patriarcal.
Não é demasia afirmar que por todos os lados a mulher é oprimida e explorada. E que não lhe resta nenhuma “zona de proteção”, livre da violência física e ou simbólica. Vale lembrar que um dos principais calvário para as mulheres (talvez o principal no Brasil) é sua própria casa. Além disso, seu principal “predador”, é o homem com quem decidiu ser companheira.
Nesse sentido, então, a resistência se torna algo necessário à sobrevivência. Subverter a ordem vigente, meta de vida. Radicalizar os atos feministas, algo inadiável. Construir uma sociedade pós-capitalista, utopia imperiosa.
Isso mesmo: construir uma sociedade pós-capitalista também. Pois o caso de Fran só foi possível em razão da “consciência reificada” inerente ao capitalismo cujas relações humanas são vistas como relações entre “coisas”, ou melhor, entre potenciais mercadorias e consumidores. Ora, se o outro é uma “coisa”, uma mercadoria, poderá ser usado e maltratado como e quando seu “dono” desejar. Inclusive ser “descartado” para os “corvos” terminar o serviço de destruir a reputação.
O caso de Fran só nos mostra, em suma, a ponta do iceberg. Há, todavia, uma enorme montanha de gelo que dar sustentação para que mais casos como este continue a existir. Até porque quando a “coisa cai na rede” vende bastante. Ainda que isso custe um preço inestimável à vítima que fora “coisificada”: a sua dignidade humana.