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Imersão no Desgaste Policial

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Verdades Temporárias e Mitos Permanentes (1/2)

Imersao Policial

Introdução

No dia 20 de Agosto de 2013 o homicímetro, o contador de homicídios, chegou à marca de 1008 mortes no Rio Grande do Norte segundo a Comissão Estadual de Direitos Humanos. Os números obtidos por essa contagem criteriosa apontam a ineficácia das políticas públicas de segurança, a falta de uma gestão integrada entre os órgãos que compõem o sistema de segurança pública e o minimalismo com que a questão dos homicídios tem sido tratada como se fosse algo de importância secundária, uma antítese daquilo que deveria ser praticado.

Imersão Violenta

As principais medidas adotadas pela atual Administração Estadual nunca evitaram que o crime fosse minorado em índices mais trabalháveis pelas forças de segurança, parecendo sempre pertencerem ao rol das ações paliativas cujo mote seria uma resposta imediatista e mediática. Com isso, a atividade criminosa saiu da timidez para o bote intrépido de grupos criminosos que até pareciam organizados em face da desorganização das ações policiais.

Um disparo na gestaoA recrudescência da ação criminosa rapidamente demonstrou que a “Interiorização da Polícia Civil” e a criação de outro batalhão de Polícia Militar em Mossoró não passavam de factoides criados para alimentar o Imaginário popular de algo estava sendo feito.

Indicada como insubstancial, a “Interiorização” não passava, e continua não passando, da mera reposição das vagas abertas por aposentadorias, falecimentos e exonerações dentro da Polícia Civil. Essa reposição, se respeitasse critérios de lotação, colocaria os novos nomeados no lugar deixado por ocasião do fato que ensejou a vacância, contudo, para dar a aparência de interiorização, os policiais foram lançados para diversos locais do Estado, inclusive alguns sem a menor estrutura física ou pessoal.

Nomeando policiais civis de forma fracionada, a Administração Estadual oportunizou a evasão dos candidatos que, sem a menor perspectiva de serem convocados, buscaram outros concursos em estados vizinhos e outros órgãos. Além disso, os novos policiais que deveriam trazer doutrinas atualizadas para dentro da corporação, ficaram oprimidos pela deficiência do treinamento e pela inferioridade numérica.

Uma das respostas que muitos governos estaduais mais “acham que sabem” dar à violência é atividade ostensiva de policiamento, e isso é facilmente explicável, pois a população acredita que o crime se combate com “polícia nas ruas”. Em Mossoró essa tentativa de colocar mais policiais nas ruas sem a contratação de efetivo se deu em desgaste de alguns policiais em detrimento do conforto de outros, pois para que fosse criado um novo batalhão, outro precisou ser dividido.

Evidentemente que uma ação assim não se daria através de uma divisão matemática pura e simples, mas o certo é que policiais foram deslocados para compor esse novo quadro. A conclusão é simples, se não houve contratação, esses policiais militares vieram de algum outro batalhão.

Alguns policiais foram enviados para áreas com menos ocorrências, outros para regiões mais perigosas, e assim a ação do policiamento ostensivo, ao invés de deter a marcha do crime, apenas afugentou criminosos de um lado para o outro. Essa corrente migratória logo foi perceptível pela sociedade que se encontra refém de uma insegurança nunca vista antes pela população mossoroense e das cidades circunvizinhas que são diretamente afetadas.

O Governo do RN “acha que sabe” utilizar o policiamento ostensivo, mas o fato é que não há evidência desse conhecimento. Ao ampliar essa parte do ciclo do policiamento e desprezar a parte subsequente, o investigativo, a gestão pública estadual amplia seus gastos e promove a impunidade.

Mais policiais nas ruas significam mais viaturas caracterizadas, mais aperto nas escalas de trabalho em decorrência do baixo efetivo, mais consumo de combustível e mais gastos com manutenção.

Enterro da SegurancaO impacto desse gasto é previsível e logo sentido, tanto é que percebe-se o contingenciamento do consumo de combustível (algo impraticável para a atividade), desequilíbrio na folha de pagamento de diárias por ocasião de eventos que demandem convocação de policiais extras, ausência de manutenção programada na frota cujo desgaste leva rapidamente os veículos ao sucateamento e até a falta de cumprimento de contrato com locadoras de viaturas (a própria locação é algo também considerado questionável, haja vista que o valor do aluguel poderia ser usado na aquisição de novas ou no custeio da manutenção).

A promoção da impunidade se dá quando o policial militar esbarra na soltura de seus detidos pela interrupção do ciclo do policiamento, pela demora desse se concretizar ou pela ação posterior da justiça. Destarte, os policiais militares trabalham subutilizados, sobrecarregados, em constante estado de enfrentamento com criminosos de alta periculosidade, cujos confrontos indelevelmente geram vítimas periféricas além dos próprios policiais cujo constante estresse pode desencadear uma série de problemas profissionais.

Considerações Finais

As ações de combate ao crime não podem se consolidar apenas conhecendo uma parte do problema, é preciso estar imerso num estudo dos fatores ensejadores da violência para que sejam elaborados diagnósticos confiáveis para deliberação de ações profissionais. Sem um trabalho que cuja referência seja a população potiguar e não a publicidade, o Governo Estadual continuará a propagar verdades temporárias, que se desfazem com o tempo e logo se tornam mitos permanentes.

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Texto escrito por Ivenio Hermes e publicado originalmente em parceria com o amigo e jornalista Cezar Alves (Coluna Retratos do Oeste) do Jornal De Fato.

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SOBRE O AUTOR:

Ivenio Hermes é Escritor Especialista em Políticas e Gestão em Segurança Pública, Ganhador de prêmio literário Tancredo Neves tendo publicado diversos livros, dentre eles três sobre segurança pública no Rio Grande do Norte. Consultor de Segurança Pública da OAB/RN Mossoró, Conselheiro Editorial e Colunista da Carta Potiguar, Colaborador e Associado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.