MICARLA, ANTEDEMOCRACIA E O “MAU JORNALISMO”
Não entro no mérito do processo. Porém, penso que toda essa confusão foi montada, a partir do momento em que colocaram o segredo de justiça na frente da necessidade de apresentar para o eleitor, que é quem tem o poder político de eleger o seu representante, os motivos do afastamento da prefeita.
Justiça pode (deve!) tirar um gestor desonesto. No entanto, com ampla publicização. Afinal, o cidadão deve ser informado porque seu direito soberano foi suspenso. Do contrário, a prática ganha verniz de “ativismo judicial”, que tem a perniciosa intenção de invadir a esfera política. Se tivesse tomado o caminho da transparência desde o início, não haveria margem para tanta dúvida.
MANIQUEÍSMO DO MP-RN
Agora, impressiona o maniqueísmo expresso pela nota (publicada depois do longo texto que acabei escrevendo). Sou, por exemplo, a favor de uma parte da PEC 37. Quer dizer, então, que defendo a impunidade?! E os delegados do Brasil também querem institucionalizar a impunidade?! Ao invés de trabalhar para uma alteração que municie o seu papel e fortaleça às polícias judiciárias – para que não existam “perdedores”, como bem sinalizou Henrique Alves em sua fala -, o MP lança nuvem de poeira sobre o assunto.
Sou um crítico de alguns aspectos do MP, mas sem retirar o ganho oxigenador que sua existência e fortalecimento representam hoje para a democracia brasileira. Por que critico o MP?! Ora, porque vejo que ele não tem controle em suas atuações. Alias, não é a minha avaliação, apenas. Mas da ciência política de ponta praticada no Brasil (veja os textos abaixo e retire suas conclusões), que, ao analisar a arquitetura do parquet verde e amarelo – como eram chamados os promotores na França -, não encontra resposta para a seguinte indagação: quem está investigando os investigadores?!
O MP não tem controle externo e há um frágil e corporativista controle interno, que é produzido pelas corregedorias e conselho. Pior: são dois pesos e duas medidas. Há uma exposição dos investigados, enquanto que os averiguados pelas suas corregedorias são devidamente não mostrados, ou, ao menos, não com os mesmos critérios.
E outra, não é porque alguém cometeu um delito, que deve ser exposto a execração social. Mais complicado: às vezes, depois de preso e condenado pela opinião pública, nada é provado contra ele. E aí? Um delito não extingue o estado democrático e direitos individuais. Muita gente morreu, desde os tempos dos absolutismo, para que a máquina estatal tivesse limite na forma como interage com o cidadão.
O direito contemporâneo trabalha com a noção de justiça, não de vigança, quer seja ela na forma de extermínio físico ou da imagem da pessoa.
O princípio que deve reger a relação entre os poderes é o madsoniano. Em resumo, o de que não existe santo ou alguém moralmente superior a outro. Portanto, todos os poderes devem ser contrabalançados. O “político” só é pego frequentemente com a “mão na botija” porque ninguém é atualmente no Brasil mais vigiado do que ele (TCEs, MP, Controladorias, PF, PC, etc.) e não porque se caracterize como moralmente inferior, ou algo do gênero.
O TJ-RN, depois das importantes investigações proporcionadas pelo Ministério Público, serve como um bom exemplo para estabelecer que a questão da corrupção não é moral, mas institucional. O poder do Ministério Público deve ser afirmado, mas firmado também a partir do respeito a regras elaboradas e aprovadas por processo democrático. Ninguém pode estar apartado disso.
PS. A atuação nacional do MP, prendendo pessoas no Brasil inteiro durante a semana de combate à corrupção, mostra os seus excessos. Ficou claro naquele momento que operações foram aceleradas ou retardadas, para virarem vitrine contra a PEC 37. Repito, numa democracia, ninguém pode ser trancafiado para virar estatística comprovadora do desempenho de quem quer que seja.
O novo desenho institucional do Ministério Público e o processo de judicialização da política
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1808-24322010000200003&lng=pt&nrm=iso
PROMOTORES DE JUSTIÇA E NOVAS FORMAS DE ATUAÇÃO EM DEFESA DE INTERESSES SOCIAIS E COLETIVOS*
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-69092001000100007&lng=pt&nrm=iso
Judicialização ou juridicização? As instituições jurídicas e suas estratégias na saúde
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-73312010000100004&lng=pt&nrm=iso
DIREITO E POLÍTICA:
o Ministério Público e a defesa dos direitos coletivos
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-69091999000100005&lng=pt&nrm=iso
Do MP-RN
NOTA DE ESCLARECIMENTO
O Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte, por intermédio da Procuradoria–Geral de Justiça e da Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público da Comarca de Natal, esclarece que não procedem as notícias veiculadas no final de semana e repercutidas nas mídias sociais de que a ex-Prefeita de Natal Micarla de Sousa foi excluída de denúncia relacionada à Operação Assepsia.
A ação recentemente encaminhada à Justiça Federal, após o declínio de competência da Justiça Estadual, diz respeito a irregularidades constatadas no curso da investigação da Operação Assepsia sobre o Projeto Natal contra a Dengue, a respeito da contratação do Instituto de Tecnologia, Capacitação e Integração Social (ITCI), com o uso de recursos federais transferidos e incorporados ao erário municipal. Trata-se, portanto, de denúncia já anteriormente ajuizada pelo Ministério Público Estadual que migrou para a Justiça Federal e que não se debruçou sobre a conduta da ex-Prefeita.
A investigação sobre as irregularidades praticadas pela ex-Prefeita Micarla de Sousa, que deram ensejo ao seu afastamento no final do ano de 2012, ainda não foi concluída, permanece na Justiça Estadual, e está, após a perda do foro privilegiado, sob análise da Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público de Natal.
Em relação ao afastamento da ex-Prefeita Micarla de Sousa do cargo, recorde-se que a decisão do Tribunal de Justiça foi mantida pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Supremo Tribunal Federal.
Os bons jornalistas souberam distinguir as duas situações, a do processo que foi para a Justiça Federal e a da investigação da ex-Prefeita Micarla de Sousa. Já para os que praticam o mau jornalismo, pouco importa se a Assessoria de Imprensa do Ministério Público explicar reiteradamente as situações, como o fez na semana passada. O que importa mesmo, para esse tipo de jornalismo, é desinformar conscientemente a população com o objetivo de desacreditar o Ministério Público, relacionando a inexistente exclusão de Micarla de Sousa como um precedente negativo da instituição, a justificar a aprovação da PEC DA IMPUNIDADE.
Os artífices dessa aventura publicitária que envergonha o jornalismo potiguar são sempre os mesmos, marionetes de determinados grupos que não toleram o Ministério Público livre e independente.
O Ministério Público assume o compromisso de dar ampla divulgação, logo que conclua as investigações sobre a ex-Prefeita Micarla de Sousa e proceda ao devido encaminhamento dos resultados à Justiça.
PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO DE NATAL