Quando da explosão do poema/processo, nós fomos vítimas da mídia provinciana potiguar, que entre outras, nos acusou de que, nós poetas processo, iríamos rasgar livros do Mestre Cascudo, no nosso anunciado happening. Eu fui chamado à Secretaria de Segurança Pública, para “explicar” esta mentira na mídia. Uma mentira que permaneceu no ar durante anos. Pra começo de conversa, nossa guerrilha era contra os versificadores e idiotas líricos em geral. Cascudo, apesar de ter escrito alguns poemas, jamais se consagrou como poeta. É em minha opinião um dos ícones mais necessários para se conhecer as raízes do Brasil. Logo… não havia motivo para rasgar a obra do Mestre, com quem tive uma convivência intensa, quando era um adolescente que vestia a farda do Ginásio Municipal, na administração do prefeito Djalma Maranhão. Fui à casa do Mestre, levando comigo uma timidez imensa, para fazer uma pesquisa escolar. Ele me recebeu com um carinho imenso e me convidou para voltar aos seu casarão, independente de pesquisas escolares. Voltei várias vezes. Ele me emprestou alguns livros raríssimos, me contou muito da sua vida e do peso de ser Câmara Cascudo. Uma tarde me mostrou um “Guia de Copacabana”, cujo autor insistia em que o Mestre fizesse uma apresentação. Ossos do ofício. Ele me falou, “veja, meu filho, eu lá tenho tempo para essas besteiras…”
O Mestre me pediu para fazer uma pesquisa de campo, para seu livro “História da Alimentação no Brasil”. Nunca tive coragem para mostrar meus poemas de adolescente ao Mestre. Ainda bem. Eram poemas da pior qualidade. Cascudo me ensinou a amar as tradições populares, junto com Djalma Maranhão, com quem trabalhei. Aliás, o Mestre amava o trabalho de cultura popular feito por Djalma Maranhão. Fiz com Cascudo uma entrevista para as páginas amarelas da VEJA. Uma vez, o João Gualberto, este amigo e poeta pop delirante, o Keith Richards potiguar, me disse “Dai, leia “Canto de Muro” é uma obra prima”. Li e só confirmei a genialidade do Mestre Cascudo, cuja sabedoria era múltipla e sem fronteiras.