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Telexfree: um (péssimo) sinal dos tempos

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Não sou adepto de uma visão sociológica que só olha para macro-estruturas e desresponsabiliza totoalmente os sujeitos envolvidos. Tal perspectiva, ao meu ver e de estudiosos, acaba tratando os agentes como marionetes de regras sempre engajadora (opressora) dos indivíduos em projetos pré-determinados. No fim, é retirado da pessoa a possibilidade – real – de se relacionar estrategicamente (não passivamente) com normas sociais, de produzir mecanismos de reflexividade e de, através dos próprios condicionamentos aos quais é submetido, transformar às instituições.

Penso que o fenômeno do Telexfree, suposta empresa promotora de um estranho “Marketing Mult Nivel”, que funciona na forma de pirâmide financeira, pode ser analisado sem retirar dos indivíduos a capacidade analítica de compreensão do próprios limites e perigos desse tipo de “negócio”.

castelo de cartasOra, o sistema do Telexfree é claro: quem ingressa investe quantidade X de recursos. O novo membro ganha um rendimento mensal sobre o que colocou na empresa e passa a receber também uma porcentagem sobre aqueles que ele convencer a entrar. Para os primeiros os lucros são altos. O problema fica para os que chegam depois, já que o dinheiro dos novos membros é utilizado para remunerar os antigos. A pirâmide entra em colapso pela sua natural incapacidade de trazer novos investidores infinitamente e na próporção necessária. A base da pirâmide se torna insustentável e contamina toda a “matrix” – crise financeira, de confiança e o mundo cor de rosa se revela tragicamente cinzento.

Além de ser considerado um crime contra a economia popular – pela experiência que já se teve no Brasil e no mundo com outros produtos similares -, muitas foram às matérias publicadas a respeito da fraude nas últimas semanas. E é nesse momento que faço a minha crítica: até que ponto aqueles que lutam por dinheiro fácil são apenas vítimas do sistema?! Para mim, está fora de questão que os iniciadores devem ser os principais questionados e que muita gente com boas intenções é envolvida acreditando na suposta possibilidade única que se desenha para ele.

Mas desconfio que tal explicação não consiga dizer tudo, ou o satisfatório sobre o assunto. Semana passada vi um texto escrito na forma de desabafo por um cliente da Telexfree. Além da grande apreensão de perder o dinheiro, ele enfatizou: “torço para que eu não tenha sido o último a entrar na pirâmide”.

Com uma clareza pertubadora ele demonstra que conhece a insolvência da Telexfree. Mais. Sinaliza que tem plena compreensão de que alguém irá perder. Mas se ele conseguir retirar o que “investiu”, pouco importa. Só não quer ser ele o enrolado.

Semana passada, fui abordado por dois conhecidos que me perguntaram se eu não queria entrar num investimento seguro e que só precisava trabalhar “cinco minutos por dia”. Oportunidade de ouro para entender melhor o assunto, ouvir mais relatos e capturar algo que não estivesse contemplado nos textos e análises jornalísticas.

Tirei algumas lições do papo descontraído e “espontâneo”. Momentos como esse são mais interessantes para tentar compreender como os agentes estão dando sentido às suas práticas do que nas, às vezes, mal formuladas e (in)controladas entrevistas de grupos focais ou até mesmo conversas sobre apreciação de currículo. Nesses casos, um pesquisador inexperiente pode se emaranhar na performance daquele que quer impressionar e tomá-la como dado acabado, não atentando para outras questões (a performance também é relevante, mas ela não descarta outras possibilidades).

Mas voltando. O que me chamou a atenção foi a maneira como as pessoas hoje querem se libertar do labor diário, através de fórmulas “egoístas”. Como é frustrante planejar os ganhos pelo prisma da sociedade do trabalho, do expediente sempre demorado e cansativo – “eu trabalhava o mês todinho num escritório e não ganhava o que eu estou ganhando”, me falou o mais interlocutor mais persuasivo.

Já querendo ir para casa tomar um banho (voltavamos de uma atividade física) e angustiado para me convencer a entrar, o colega me disse mais ou menos assim: “Rapaz, eu já tirei o meu dinheiro”. E ao ouvir a pergunta se aquilo não era uma pirâmide e iria prejudicar outras pessoas, ele me disse com o sorrisinho maroto no rosto: “sei que é pirâmide, mas ela está começando agora. Você vai colocar seu dinheiro e vai tirar muito mais. A bomba ainda vai demorar a estourar. Vai ficar para quem entrar depois”.

Enfim, Telexfree, Bbom, etc, para repetir o clichê, é um sinal dos tempos. Alias, um péssimo sinal.