A Extrema Situação de Insegurança Potiguar
Por Ivenio Hermes
Resumo Introdutório
A crise na Segurança Pública potiguar há muito desocupou os patamares da normalidade, entrando num processo de impunidade que estabelece grande sentimento de insegurança.
Esse sentimento experimentado pela população hipossuficiente, ou seja, que não tem condições de contratar guardas noturnos, gradear suas casas e reforçar os cadeados de suas portas de entrada e janelas, também já é experimentado pelas próprias forças de segurança que não possuem material humano para fazer frente aos criminosos e nem equipamento individual (armamento e coletes balísticos) para desempenharem suas funções com um pouco mais de tranquilidade.
A força policial mais vitimada pela ineficácia das políticas públicas de segurança é a PC/RN que desde 2010, observa seus concursados serem nomeados aos poucos e pulverizados pelo estado adentro numa falsa política de interiorização de efetivo.
O Governo do Estado do Rio Grande do Norte, ao invés de se utilizar de ações estudadas para corrigir esse erro, se escuda nos limites estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal e age contra a população potiguar e contra o direito à nomeação que os concursados possuem.
Ainda por cima, desgasta os concursados fazendo-os mendigar pelo seu direito que não é respeitado desde o curso de formação, quando não receberam na integralidade suas bolsas de estudo e precisaram recorrer ao Judiciário para receberem os provimentos financeiros.
A Crise Estabelecida
Evitando que o Governo do Estado do RN possuísse mais desculpas para não nomear os policiais civis, entidades sindicais conseguiram retirar das delegacias, através de ações judiciais, os policiais militares que estavam em desvio de função realizando o trabalho de policiais civis.
Djair Oliveira, o presidente do Sindicato dos Policiais Civis e Servidores da Segurança Pública (SINPOL/RN) percebe que a polícia investigativa precisa de urgentes investimentos em investigação e perícia técnica, objetivando a solução de casos de homicídios e outros, e assim reestabelecendo a ordem pública.
Atualmente estima-se que apenas cinco homicídios sejam elucidados para cada 100 outros cometidos no Estado Potiguar. Ainda assim, é mister ressaltar que desses cinco assassinatos “elucidados”, 2 são por prova testemunhal e não oriundo de um trabalho efetivo de investigação inicial, posterior ou forense.
Quase todas as delegacias param durante a noite! Os policiais já trabalham em escala que não contempla o atendimento ao público nas horas noturnas, quando a concentração de ocorrências criminais aumenta e as investigações que não podem parar, aguardam o dia amanhecer para terem sua continuidade, ou ainda pior, se o fato ocorrer na sexta-feira durante a noite, o trabalho investigativo somente iniciará no dia útil seguinte, prejudicando sobremaneira a solução do crime.
Já são 471 pessoas assassinadas no Rio Grande do Norte desde o início do ano, num aumento estatístico de 50% em relação ao mesmo período do ano passado. A propagação da impunidade se alastra de leste a oeste no território do Estado Mamute, sendo continuamente disfarçados pela Administração Estadual contrariando as informações do primeiro Diagnóstico da Perícia Criminal no Brasil realizado em 2012 e publicado em fevereiro de 2013 pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP). Os dados deste relatório colocam o ITEP – Instituto Técnico-Científico de Polícia do RN – entre os de pior capacidade de trabalho, tanto no âmbito da estrutura pessoal como em uso de equipamento modernos.
A falta de preservação do local do crime, a falta de celeridade na ação pericial oriunda da falta de capacidade técnica e as condições de preservação de provas são fomentadores de impunidade e de arquivamento de crimes.
O pífio resultado de apenas 4,95% (Conforme dados do Conselho Estadual de Direitos Humanos) envergonharia uma Administração Pública comprometida com a segurança de seu povo.
Da Crise ao Caos
A Administração Ciarlini, contudo, somente crê no investimento que salte aos olhos do povo. Embora todos os problemas na Segurança Pública não se resumam à Polícia Civil ou ao ITEP, percebe-se que esse quadro de descaso nessas instituições está exacerbado.
O Dr. Rodolfo Penna Lima, em entrevista concedida para este autor com vistas à publicação do último livro da trilogia iniciada em Crise na Segurança Pública Potiguar e continuada em Crimes de Gaveta, nos forneceu informações e material estarrecedor sobre o quadro da Perícia Técnica no Estado do RN. Como ex-diretor do ITEP, o Dr. Penna Lima lamenta a falta de capacidade de gestão do órgão cujos gestores são escolhidos sem critérios para o exercício da função.
Ele ressalta que a falta de investimento tornou o ITEP num cabide de empregos para funcionários de outras instituições que foram extintas e que passaram a ocupar cargos técnicos no órgão que ainda amarga a era pré-digital no trato com seu acervo documental. A realidade nos estapeou no rosto ao vermos milhares de documentos se deteriorando por falta de conservação adequada. São mais de 3 milhões de documentos somente relacionados ao registro da população que perecem.
As instalações descentralizadas do ITEP pelo Estado Potiguar estão em pé de igualdade em relação ao descaso. Penna Lima alerta para essa situação e nos forneceu documentos que mostram que todos os planos já elaborados para o ITEP foram descaracterizados e transformados em “papel a ser comido pelas traças” diante da falta de gestão estratégica da administração anterior, elevada ao extremo pela administração estadual hodierna.
Os laudos balísticos e de DNA, tão comuns de serem solicitados pelo Ministério Público e pela Polícia Civil, pois são de especial importância para a determinação da autoria de grande parte dos crimes, pois estabelece nexo material entre a munição e à arma de um crime, ou entre um material genético e um suspeito ou vítima, se perde pela falta de equipamento e de peritos.
A crise já estabelecida caminha marcialmente para um caos que vem sendo devidamente alertado pela mídia e por especialistas em Segurança Pública.
Na Contramão da Segurança
Atualmente, as Delegacias Regionais de Alexandria e Pau dos Ferros não têm sequer um escrivão de polícia. O cargo de escrivão era desempenhado por antigos policiais militares, muitos deles, antigos “Delegados Comissionados”, cargo existente até poucos anos e observem que foi justamente a retirada desses delegados que viabilizou o concurso de 2009 da PC/RN.
Com a acertada decisão do Comandante Geral Francisco Araújo, que recebeu o apoio dos comandantes de 12º BPM, Major Correia Lima e do 2º BPM, Tenente Coronel PM Alvibá Gomes, de Mossoró, pois além de cumprir uma recomendação do Ministério Público Estadual, Francisco Araújo também combateu o desvio de funções dos PM’s, que passaram a ser vistos com desconfiança pela Polícia Civil que se vê em desvantagem para buscar o respeito pelas suas atividades.
Alvibá Gomes, ainda comentou que existem mais de mil Policiais Militares que estão em desvio de função no RN.
O lugar vago gerado pelas saídas dos PMs, contudo, não recebeu a importância da Administração Ciarlini e com isso, mais de 30 (trinta) cidades pertencentes às Delegacias Regionais de Pau dos Ferros, Alexandria e Patu ficaram sem o policial militar que desempenhava a função de escrivão.
As delegacias passaram adotar o mesmo paradigma operacional da Capital Natal, isto é, ficaram fechadas ou sem capacidade de funcionamento nos plantões dos finais de semana.
Ao invés de impor que o Estado convoque o efetivo da Polícia Civil, o Juiz Rivaldo Pereira Neto, da Comarca de Pau dos Ferros, no sábado, dia 11, determinou (Processo 0101135-39.2013.8.20.0123) o retorno dos oitos policiais militares à Delegacia Regional daquele município, resolvendo de forma imediata o problema do plantão do final de semana. Mesmo tendo descrito em sua decisão ser sabedor do desvio de função que os policiais militares estão exercendo, o juiz, devido ao imediatismo que a situação o coloca, determinou o retorno deles às delegacias.
Mas não ocorreu assim com a Regional de Alexandria. Lá, o desempenho das atividades de escrivão era realizado pelos policiais militares Fransueldo Alves de Lima e Carlindo Dias da Silva. Como o juiz não determinou a volta deles, talvez para não impactar de forma tão abrupta na possível convocação dos concursados, o plantão do final de semana de Alexandria ficou por conta da Cidade de Pau dos Ferros.
O caos está generalizado: atividades cartorárias paralisadas e todo trabalho da polícia judiciária comprometido! Urge a necessidade de que sejam nomeados imediatamente todos os escrivães que fizeram o curso de formação em 2010.
Ainda há Esperança
Embora o SINPOL/RN cobre a convocação dos restantes 309 policiais civis aprovados no concurso público de 2009 e formados há dois anos, a previsão de esse efetivo ser nomeado, hoje se baseia apenas na necessidade que o Programa Brasil Mais Seguro, pois não há vontade política e nem administrativa do Governo Atual como já ficou demonstrado no artigo Polícia Civil do RN x Direito Fundamentado x Jurisdição de minha lavra.
A Dra. Regina Miki, a Secretária Nacional de Segurança Pública, reveste-se de coragem para ampliar o debate que leve a soluções exequíveis no Rio Grande do Norte, como já fez em outros estados por onde pode esparramar sua influência intelectual.
Disfarçando todos os problemas que enfrenta na tentativa de potencializar a segurança, a Secretária entre sorrisos e gestos de carinho com todos que a cercam, não deixa de falar verdades quando afirma que é reconhecer a importância de se investir corretamente é primordial para “realização de investigações inteligentes e profissionais, que resultem na identificação do criminoso e na produção de provas que possibilitem sua condenação”.
Durante o IV Colóquio Programa Brasil Mais Seguro, estivemos com a Dra. Miki que se mantém esperançosa na solidificação de bases sustentáveis em um acordo que traga para o RN importantes investimentos na Segurança Pública.
A nomeação dos concursados para uma tarefa difícil ou sem interesse para a Administração Ciarlini e talvez a solução resida apenas no pacto entre o Governo Federal e o Estadual para a consolidação do Programa Brasil Mais Seguro, pois o envio de incentivos financeiros da União exige a contraprestação do Estado do RN em desenvolver ações estratégicas para a Segurança Pública e áreas afins.
Enquanto isso, o caos impera no sistema de Segurança Pública do Rio Grande do Norte.
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FONTES ADICIONAIS:
LIMA, Cézar Alves de. Justiça determina o retorno imediato de PMs a DP de Pau dos Ferros. Disponível em: < http://db.tt/c4FbJ50t >. Publicado em: 11 maio 2013.
ARAÚJO, Ricardo. Crimes: 95% não são desvendados. Disponível em: < http://db.tt/CsADFz5b >. Publicado em: 12 maio 2013.
HERMES, Ivenio. Crise na Segurança Pública Potiguar: Um Atentado à Polícia Judiciária. 2. ed. Natal RN: Clube de Autores, 2013. 137 p.
HERMES, Ivenio. Crimes de Gaveta: Arquivos da Impunidade. Natal RN: Clube de Autores, 2013. 118 p.