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Paz: A Palavra de Ordem

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birds-nestRefletindo sobre a era da violência (publicado no Blog do Ivenio Hermes)

Por Canindé dos Santos[1]

Hoje, o Brasil vive um momento político em que a paz é a palavra de ordem na hora que os grandes partidos, que estão na frente do comando da nossa nação, articulam na esfera governamental os projetos que serão aplicados na administração pública. Pelo menos é assim que imaginamos, pois a maioria dos nossos políticos ao proferir seus discursos faz questão de destacar o caminho democrático para se resolver problemas.

Contudo, nem sempre foi assim, pois nosso país conheceu uma fase negra da História que durou aproximadamente 20 anos. Como todos já devem ter percebido, esse tempo compreendeu o período que o governo brasileiro estava nas mãos de uma ditadura militar.

A violência foi uma prática comum durante esse regime. Na época, estudantes, intelectuais, artistas e militantes partidários de esquerda eram presos, torturados e exilados. Quem promovesse qualquer manifesto contrário à “ordem estabelecida” estava passivo de sofrer as duras consequências da represália de quem estava no poder.

Os militares, ao assumirem o controle, reprimiram as reivindicações populares através de mecanismos de repressão, fechando sindicatos e prendendo suas lideranças. Militantes sindicais, políticos e membros de organização de esquerda iam para a prisão, onde eram submetidos à torturas físicas e psicológicas. Prisões, invasão de domicílios, espancamentos e mortes aconteciam com bastante frequência nos tempos da ditadura, que após sua instauração tornou-se cada vez mais violenta.

Diante de tantas atrocidades, surgiu no cenário político mais um inimigo do regime. As rebeliões estudantis na França, Estados Unidos e outros países induziram os estudantes brasileiros a ocupar um espaço fundamental na luta pela democracia, com greves comícios e passeatas que enfrentavam a violência policial e desafiavam o sistema ditatorial. O poder jovem tornou-se um “perigoso” inimigo, ocupando ruas e escolas.

“Caminhando contra o vento, sem lenço, sem documento, no sol de quase dezembro, eu vou…” (Alegria, Alegria/Caetano Veloso)

9btapestryAs passeatas quase sempre ocorriam num clima de paz e serenidade, mas a represália do governo se dava de modo diferente. É tanto, que em Março de 1968 um pelotão de choque da Polícia Militar invadiu no Rio de Janeiro o restaurante apelidado “Calabouço”, que servia refeições subsidiadas a estudantes pobres. Os policiais já entraram atirando, e uma bala matou o secundarista Edson Luís de Lima Souto de 18 anos.

A violência do regime provocou mais desordem na sociedade, pois as esquerdas, que estavam postas na clandestinidade, não viram outra saída, senão usar a luta armada para recuperar a democracia brasileira, além do objetivo de transformar a sociedade, distribuindo renda.

Organizaram várias guerrilhas urbanas e rurais passando a praticar o chamado terrorismo de esquerda, com assaltos a bancos, ataques a quartéis e postos policiais, além de sequestros de diplomatas estrangeiros que eram trocados por presos políticos.

Um dos episódios mais fantásticos desses eventos foi o sequestro do embaixador norte-americano Charles Elbrick. O fato, retratado tanto pela literatura e pelo cinema, além de se assemelhar a um produto da fantasia, já que elementos como suspense, aventura e romance (ingredientes explorados pela ficção) acompanhavam toda trama, gerando a seguinte interrogação: A arte imita a vida, ou seria o contrário? Não é pura imaginação dizer que violência gera violência; embora o imaginário artístico tenha participado da oposição política ao governo militar.

A ideologia oposicionista saiu da consciência crítica e invadiu a cultura de massa. Em 1968, no Festival Internacional da Canção, Geraldo Vandré apresentou a música “Para não dizer que não falei das flores”. O público se identificou rapidamente com o trabalho do cantor, deixando claro, seu repúdio em relação à ditadura. Livrar-se daquela situação tinha tornou um sonho coletivo na imaginação do cidadão brasileiro. Ainda bem que tudo saiu da esfera ideológica e se transformou em realidade.

A intervenção militar dos Estados Unidos nos assuntos políticos do Iraque é mais um exemplo de que Política e violência se dão as mãos em várias circunstâncias. O governo republicano de George W. Bush decidiu que destruiria o regime nacionalista de Saddam Hussein, que ousou invadir o Kuwait em Agosto de 1990. Na guerra do Golfo Pérsico (Janeiro a Fevereiro de 1991), o exército iraquiano foi completamente esmagado. Mas a Casa Branca se limitou a expulsar as tropas de Saddam e a impor condições. Isso porque a ação estava sob a autorização da ONU e participaram dela 30 países.

Global-Matrix-2Entretanto essa vitória não foi suficiente para deixar o Tio Sam satisfeito, e novamente, mais de 10 anos depois (20 de Março de 2003), com a alegação de que as Forças Armadas do Iraque tinham armas de destruição de massa, houve um segundo ataque ao país, com o pretexto de acabar com a ditadura iraquiana. Contudo o motivo político foi apenas um álibi para justificar o uso da violência, que até hoje tem causado vários estragos na região. O mundo já sabe que a demonização da figura de Saddam obscurecia a verdade nua e crua: os Estados Unidos tinham interesses econômicos nessa operação. Aliás, praticamente, todas as decisões políticas deliberadas do governo norte-americano visam defender a economia dessa nação, mesmo que para isso seja necessário levantar as armas.

Essa afinidade da violência com a Política não se restringe aos acontecimentos atuais. Nicolau Maquiavel (1469-1527), considerado o pai da Política Moderna já conciliava nas suas teorias uma aliança desses dois elementos. Ele disse:

“O príncipe defende o Estado com boas armas e com bons amigos, e sempre que tiver boas armas terá bons amigos.”

Até mesmo na hora de formular bases teóricas sobre determinados assuntos, o imaginário humano, às vezes, recorre a ideias influenciadas pelas pulsões agressivas que passeiam no psiquismo. O que é um perigo, inclusive, quando se trata de Política, pois este instrumento, pelo menos na teoria, foi criado para trazer ordem e organização à sociedade. E como essa missão civilizadora pode acontecer se a metodologia da agressão fizer parte do processo?

Convidamos a todos para refletir sobre essa questão.

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[1] (Francisco) Canindé dos Santos é escritor com dois livros publicados, formado em Comunicação Social com habilitação em jornalismo pela UFRN.