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Operações Policiais Desaceleradas

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Day's first arrest by Mr KainulainenCrimes de Gaveta: O Ciclo da Impunidade (Parte 01)

 

Por Ivenio Hermes

 

O Paradigma Operacional

Quando uma operação policial é divulgada na mídia como “deflagrada”, é uma referência às ações de conhecimento público que órgão de polícia está executando. Entretanto, esse momento é apenas uma parte de um trabalho grandioso e que muitos não compreendem plenamente.

Tanto as polícias ostensivas quanto as investigativas possuem seu processo peculiar para dar início a um procedimento operacional que um dia poderá ou não se tornar público, dependendo dos resultados obtidos.

As ações da Polícia Federal e das Polícias Civis dos Estados, bem como do Ministério Público, normalmente seguem o seguinte cronograma:

  1. Algum fato chega ao conhecimento da autoridade policial que possui a obrigação de adotar providências para a averiguação de sua veracidade. Essa fase denominada investigação preliminar pode ser rápida, vai depender de uma série complexa de fatores que não abordaremos agora;
  2. Constatados os indícios na investigação preliminar de que o fato conhecido é verdadeiro, a autoridade inicia a investigação propriamente dita;
  3. O grau de sigilo e as ramificações da investigação determinarão a dependência de outros fatores para seu prosseguimento, como a disponibilização de mais investigadores, peritos, autorizações judiciais, verbas para pagamentos de diárias, etc;
  4. Então é reunido todo material que gere convencimento ao Juiz de que há necessidade da emissão do mandado de prisão preventiva dos suspeitos, de busca e apreensão de matéria de comprovação, de objetos e outros artigos que configurarão como evidências;
  5. Enfim, a deflagração daquilo que chega ao conhecimento público com o nome de uma operação.

É um método operacional que visa reunir o possível necessário para completar a investigação que subsidiará o ministério público a dar prosseguimento na ação persecutória que objetiva apurar todos os fatos, definir culpados, os crimes que cometeram, e por fim, imputar a pena que lhes for definida em lei.

Um paradigma de trabalho policial necessário, que demanda tempo e efetivo preparado para realizar uma investigação bem feita, que precisa do suporte de uma polícia científica capacitada e com material para realizar um trabalho pericial inquestionável, e que depende da disponibilidade do poder público, cuja vontade nem sempre se manifesta com celeridade, para que seu desfecho aconteça.

The Invincible Police by ImmanuelComissionados Para a Ação

Em meio aos problemas tipicamente brasileiros e particularmente potiguares que se pode deduzir que o paradigma operacional possa vir a suscitar, outros problemas são evidenciados para a falta de ação inicial que se desenvolva numa investigação e posteriormente numa operação deflagrada, e se for deflagrada, pode repousar numa inércia atitudinal de diversas esferas de competência.

Um exemplo disso foram algumas ações do Batalhão de Choque da Polícia da Polícia Militar – o BPCHOQUE. No entorno da região onde o batalhão realizava um policiamento ostensivo preventivo foram detectadas diversas casas onde funcionavam caça níqueis e nenhuma ação da Polícia Civil, que estava consciente da situação, foi iniciada.

O comandante do BPCHOQUE decidiu agir e prendeu diversos caça niqueis, algo que desagradou o delegado. Comparando as ações do BPCHOQUE com as da Polícia Civil, enquanto a PM apresentava uma apreensão entre cinco e seis mil reais, a Polícia Civil pouco mais de 500 reais. Além disso, no entorno da delegacia de defraudações havia vários pontos de caça níquel que não eram importunados pela Polícia Civil.

Nesse ponto verifica-se que a polícia judiciária encontra-se fragilizada demais pela falta de efetivo operacional, a ponto de ser incapaz de realizar operações dentro de sua própria vizinhança, ou levando a crer, numa hipótese que se prefere afastar, de que o delegado se beneficiava da situação.

A falta de priorização de ações estratégicas e planejadas em segurança pública, levaram o Delegado Federal Aldair Rocha, chefe da Secretaria de Estado da Segurança Pública e da Defesa Social (SESED), a manter congelado seu projeto da criação da Divisão de Homicídios, um projeto muito bom e essencial para o Estado Potiguar.

A ausência da Divisão sonhada por Aldair se reflete no crescimento do número de homicídios sem solução. Somente no último fim de semana do janeiro de 2013 foram registrados 17 assassinatos e no fim de semana seguinte, o primeiro de fevereiro, foram mais 15 homicídios. O Estado possui uma taxa de aumento de 157% no índice de homicídios.

O crime organizado, a despeito das negativas de alguns, está instalado no Rio Grande do Norte, não importando mais se é uma representação dos grupos do sudeste e sul do país ou se é algo novo que ainda não há dados para a correta mensuração da situação.

 

Riot Police by Einar SOs Entraves Operacionais

Se houvesse um investimento maior na área de inteligência, outro projeto de Aldair Rocha preso pela falta de contingente na Polícia Civil, a polícia judiciária, com a utilização de poucos recursos financeiros, teria meios de acabar com o crime organizado dentro do RN, porém, como não tem estrutura de homens para direcionar suas ações, quase nada pode fazer. E o pior de tudo é que quem controla o crime organizado está ciente dessa fraqueza da PC.

Nos municípios do interior os entraves operacionais se agravam. Como não têm delegados e agentes suficientes para atender a demanda, eles são retirados de outras cidades, prejudicando o andamento dos inquéritos da cidade de origem ou de diversas cidades pelas quais aqueles policiais estejam responsáveis. Reunindo vários delegados, escrivães e agentes de diferentes locais para a condução de um inquérito, é natural que seu resultado não seja tão bom, e por vezes é até mal feito.

Em Vila Em Paz, uma comunidade de Ponta Negra, foram feitas diversas prisões de pessoas envolvidas com tráfico de drogas, vários pontos de venda, as famosas bocas, foram estourados e o flagrante foi feito. Entretanto, aqueles que não estavam em flagrante, mesmo sob fortes indícios de se tratarem dos tenentes e chefes do tráfico, nada sofreram, pois não houve uma investigação concreta que subsidiasse o inquérito que acabou sendo mal feito e de nada resultou.

A maioria das prisões efetivas que ocorrem no Estado é obra da Polícia Militar. A Polícia Civil faz um inquérito pobre de dados adicionais e não consegue concluir as investigações porque não têm delegados e agentes para realizarem o trabalho.

A maior parte dos inquéritos se transforma num trabalho péssimo, sem investigação e nem apuração real. Alguns agentes e escrivães ficam revoltados, pois se esforçam com os poucos recursos humanos disponíveis para investigarem e não veem resultado concreto. A captação de provas para os crimes é mínima, e no caso de homicídios, somente quando há testemunhas do fato.

Contudo, a demora decorrente da apuração, a falta de prisão preventiva, ou a liberação via habeas corpus, colocam os suspeitos frente à frente com as testemunhas que são ameaçadas e posteriormente modificam suas versões originais.

Não há memória jurídica no Rio Grande do Norte de julgamentos cuja absolvição foi resultado da prova da inocência do acusado, mas sempre por falta de evidências que comprovassem o contrário.

Não há chance para uma justiça clara e bem feita.

 

Violence Routine in Rio by LatuffPonderações

São os entraves das operações policiais, que ocorrem desde que ela é pensada no momento em que a autoridade toma conhecimento do fato até a finalização do inquérito que postergam a promoção da justiça no Estado do Rio Grande do Norte.

Alheia a toda essa situação, a administração pública somente apresenta desculpas para sua falta de investimento em segurança pública e parece não perceber que ela é a grande fomentadora do caos ora instalado na sociedade potiguar.

A falta de efetivo policial civil e de equipamento na polícia técnica oportunizam inquéritos mal feitos. Um problema que progride diariamente, pois eles levam o judiciário a empacar diante da falta de materialidade para prosseguir.

Mas os entraves operacionais potiguares não terminam por aqui. Há também investigações bem feitas que levam anos tramitando pela falta de conhecimento adequado de promotores não muito bem qualificados.

No próximo artigo da série Crimes de Gaveta, faremos um estudo da falta de celeridade na finalização de grandes operações como a Operação Hígia, Operação Impacto, Operação Máfia dos Gafanhotos, Sinal Fechado, e outras que levaram muito tempo para serem resolvidas e outras, como a Operação Foliaduto, que mesmo com todos os trabalhos concluídos, até a data desse estudo ainda não terminaram efetivamente.

 

 

CONSULTOR ESPECIAL DESSE ARTIGO:

Henrique Baltazar Vilar dos Santos. Exmo. Sr. Juiz de Direito, especialista em direito processual civil e penal e MBA em gestão judiciária.

 

REFERÊNCIAS:

TRIBUNA DO NORTE (Brasil Rn Natal). Divisão de Homicídos sai este ano. Com Informações da SESED. Disponível em: < http://db.tt/1phsNpcf >. Publicado em: 07 fev. 2013.

ZAULI, Fernanda; JULIÃO, Valdir. RN tem registro de 17 assassinatos. Tribuna do Norte. Disponível em: < http://db.tt/MosFCjLR >. Publicado em: 29 jan. 2013.

TRIBUNA DO NORTE (Brasil Rn Natal) (Ed.). Polícia registra 15 homicídios no primeiro fim de semana de fevereiro. Tribuna do Norte. Disponível em: < http://db.tt/6HLp7ZSX >. Publicado em: 04 fev. 2013.

LUCENA, Roberto. Número de homicídios cresce 157%. Tribuna do Norte. Disponível em: < http://db.tt/jCNBAtLr >. Publicado em: 27 jan. 2013.

DANTAS, Anna Ruth; POLÍTICO, Blog Panorama. Operação Foliaduto: processo é concluído e aguarda sentença da juíza. Disponível em: < http://db.tt/tW7v5seX >. Publicado em: 02 mai 2012.

WIKIPÉDIA; LIVRE., A Enciclopédia. Operação Hígia. Disponível em: < http://db.tt/dr9k0gOe >. Acesso em: 06 fev. 2013.

LIMA, Cezar Alves de; HERMES, Ivenio; SANTOS, Henrique Baltazar Vilar. Compêndio de Anotações e Entrevistas. Natal – RN: Não publicadas, 2012/2013. 40 p.

 

ASSISTENTE DE PESQUISA:

Sáskia Sandrinelli. Graduada em Sociologia e Ciência Política, com atuação em pesquisa e divulgação de tendências em redes sociais.