Uma Tortura Aos Estudantes
Por Ivenio Hermes
O Fio da Meada
O ingresso em uma universidade, seja por motivos concernentes ao número de vagas limitadas ou à difícil adequação de suas atividades com os horários oferecidos, tem sido a grande barreira para os futuros acadêmicos. Para conquistar uma vaga numa instituição de educação superior pública é necessário um preparo que muitos não possuem mais condições de obter devido ao tempo afastado do ambiente escolar, e a forma de ingresso ainda não comtempla a análise de situações individuais como as instituições pagas fazem ao ofertar vagas para alunos que reúnam as condições de arcar com os valores das mensalidades cobradas.
Contudo, muitos alunos que não têm condições de pagar os altos estipêndios de uma educação de nível superior numa instituição particular, e tampouco podem ingressar em uma pública, ainda conseguem entrar nas salas de aula de curso superior graças aos financiamentos disponíveis.
O grande ajudador do futuro acadêmico é o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES), um programa do Ministério da Educação (MEC) destinado à concessão de financiamento a estudantes regularmente matriculados em cursos superiores presenciais não gratuitos e com avaliação positiva nos processos conduzidos pelo MEC.
O Aluno, antes de tudo, precisa estar matriculado, e para isso, se ele não tem como arcar com as mensalidades, as Instituições já o matricula sob a condição de conseguir o FIES.
Em dois estados do nordeste, Rio Grande do Norte e Alagoas, os alunos foram inicialmente beneficiados por uma liminar que dispensava fiador para a aquisição do financiamento. Particularmente no Rio Grande do Norte, apenas nas filiais da Universidade Estácio de Sá, ou seja, Faculdade Câmara Cascudo ou Faculdade Estácio de Natal, FAL – Faculdade de Natal e FATERN – Faculdade Estácio do Rio Grande do Norte, foram 400 alunos que ingressaram nessa situação, que parecia certa e tranquila, até que um juiz decidiu derrubar a liminar, deixando esses alunos abandonados à própria sorte.
O Enrolado do Novelo
Ao se matricularem, devido ao peso da liminar então vigente, os alunos eram dispensados da fiança solidária, que é a garantia oferecida reciprocamente por estudantes financiados pelo FIES reunidos em grupo de três a cinco participantes. Nessa opção, cada um deles fica comprometido como fiador solidário da totalidade dos valores devidos individualmente pelos demais.
Mesmo que a constituição do grupo da fiança solidária não exigisse comprovação de rendimentos, contudo demandava que o grupo fiador pertencesse obrigatoriamente à mesma instituição de ensino, matriculados no mesmo local de oferta de cursos.
Apanhados de surpresa, os alunos precisavam adotar novas providências em meio ao andamento do calendário acadêmico, ficando completamente sem condições de se manterem nos seus trabalhos e nos estudos de forma eficaz. Era o começo de uma tortura psicológica que perdura até a data de hoje.
Os estudantes precisam conseguir aditamento do contrato, (que é a prorrogação semestral do financiamento) cujo fim foi postergado para até final de março de 2013, para não se tornarem inadimplentes, contudo o novo semestre iniciou dia 04 de fevereiro, com muitos alunos sem pelo menos terem conseguido se matricular. Lembrando, que a maioria não dispõe e nem consegue dispor fiadores para garantir suas mensalidades em um curso superior e aqueles que conseguiram, não logram êxito em modificar a cláusula de fiança solidária para fiança convencional, por um subjetivismo interpretativo das instituições financeiras federais responsáveis por essa linha de crédito: o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal.
O Emaranhado do Barbante
Em ambos os casos em que os alunos se encontram (conseguindo ou não fiador), é imperativo que haja urgente Revisão e Alteração Do Contrato, e é justamente isso que lhes está sendo negado, pois se há uma obstaculização dos gestores desta modalidade de financiamento estudantil até mesmo para a troca de fiança solidária para a convencional, percebe-se clara insensibilidade, intolerância e irredutibilidade no trato com o problema.
Além disso, esses alunos que estão tendo perdas acadêmicas pela falta de tranquilidade para estudar, pela busca incessante de soluções, ainda precisarão arcar com os juros dos atrasos semestrais, que um dia serão cobrados. Além disso, eles estão recorrendo a advogados para conseguirem ter seu pleito reavaliado, pois somente tratar do assunto direto nos Bancos Federais não têm sido suficiente.
Patrícia Vasconcelos, diretora da Faculdade Estácio de Natal (Câmara Cascudo), foi procurada pelos alunos e já consciente do problema procurou informações, conversou com professores da área de Direito da instituição e até buscou a OAB para expor o problema dos alunos.
O Banco do Brasil, tendo sido procurado por inúmeros alunos e pela diretora Patrícia Vasconcelos, se pôs à disposição para discutir sobre o assunto e tentar uma solução. De forma contraditória, os representantes da Caixa Econômica Federal não quiseram nem dialogar, mesmo tendo sido procurados pela diretora.
Patrícia, ao ser entrevistada, ela foi sincera em dizer que se preocupava com a situação da inadimplência que impactará na instituição que não poderá manter esses alunos, porém, demonstrou que seu desejo maior era que eles estivessem bem e tranquilos em sala de aula porque isso havia prejudicado o rendimento acadêmico no semestre anterior.
Alguns alunos conseguiram reconquistar seu financiamento após terem nova liminar deferida judicialmente, mas isso ocorreu somente nos casos de ações ajuizadas contra o Banco do Brasil, pois como foi dito, após diálogo aberto com os alunos e com a diretora, demonstrou interesse e conseguir acordos e promover concessões.
Aos que ajuizaram ação contra a Caixa Econômica Federal, nada aconteceu de sensibilização mínima, e o tempo decorre contra esses alunos porque o Juiz Federal negou o pedido de Tutela antecipada, indeferiu o pedido, e pelo visto, provavelmente negará o recurso.
A Trama dos Fios
Se tudo gira em torno da garantia do pagamento, por que não aceitar a mudança de fiança solidária para fiança convencional? Ou no caso dos alunos que não conseguem fiadores, por que não disponibilizar para eles outra linha de financiamento para que eles não tenham seus estudos interrompidos ou prejudicados pela falta de sossego?
Num país onde a educação é relegada para segundos e terceiros planos, as entidades que visam dar apoio aos alunos que precisam de uma linha de crédito demonstram sua insensibilidade para com o futuro. Um claro exemplo disso é a utilização do FGEDUC (Fundo de Garantia de Operações de Crédito Educativo), já que não se quer saber do aluno como ser humano e futuro profissional, querendo apenas a garantia do pagamento.
O FGEDUC é uma modalidade de garantidor de financiamento estudantil onde não há necessidade de fiança, haja vista que o próprio governo já disponibiliza uma forma de garantia de pagamento para os bancos! Mas que fique evidenciado, que no sítio do FIES nem há opção de aderir a esse financiamento, mesmo que o aluno satisfaça a todos os pré-requisitos para a adesão. A atual utilização do FIES sem precisar apresentar fiador, somente beneficia novos contratos.
Não se trata de evidenciar conhecimento legal ou trato jurídico com o problema. De fato, essa situação expõe na face da sociedade a falta de sensibilidade para com os problemas relacionados aos estudantes. Agora são apenas os 400 alunos que estão com esse problema somente nas filiadas da Universidade Estácio de Sá em Natal, sem citar os outros de outras instituições e do outro estado onde a liminar foi derrubada.
Talvez as pessoas não tenham se dado conta, de que está havendo uma desonestidade com aqueles que precisam do governo cujo assistencialismo se faz presente em diversas áreas questionáveis, mas que não procura nenhuma solução para fazerem esses alunos pagarem por uma situação que eles não desejavam.
Não é assim que haverá progresso e nem evolução social, porque o próprio Estado não entende a necessidade de intervir numa solução rápida e permanente. É urgente evitar que mentes em busca de conhecimento fiquem envolvidas nesse emaranhado de fios toscos, barbantes puídos e novelos amarrados que formam o tecido do descaso de uma atual tortura aos estudantes.
REFERÊNCIAS:
PORTAL NACIONAL DE DIREITO (Brasil Sp São Paulo) (Org.). N° Acórdão 2005.71.00.029076-4. Disponível em: < http://db.tt/nDFUELZ3 >. Publicado em: 04 jun. 2008.
GUIA DO ESTUDANTE (Brasil SP São Paulo) (Org.). Estudantes de baixa renda não precisam mais de fiador para o FIES: Governo anunciou ontem (20/10) novas regras para o Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior. Disponível em: < http://db.tt/zvYDcGOH >. Publicado em: 21 out. 2010.
COLARES, Flávio. Aditamento Simplificado liberado mesmo com restrição cadastral: Portaria Normativa N° 17 de 06/09/2012. Tudo Sobre FIES. Disponível em: < http://db.tt/ejuv8UlA >. Publicado em: 18 set. 2012.
GIOVANNI, Bruno. Justiça decide que estudantes têm direito ao Fieis sem necessidade de fiador. Blog do BG. Disponível em: < http://db.tt/ifZxZSuY >. Publicado em: 13 nov. 2012.
COLARES, Flávio. Liberada a contratação e os aditamentos dos estudantes com restrição cadastral: Portaria 28 de 28/12/2012. Tudo Sobre FIES. Disponível em: < http://db.tt/dkCrDqtm >. Publicado em: 08 jan. 2013.
BRASIL DF BRASÍLIA. Portal do FIES. FIES – Fundo de Financiamento Estudantil: Perguntas Frequentes. Ministério da Educação e Cultura. Disponível em: < http://sisfiesportal.mec.gov.br/faq.html > ou < http://db.tt/xeslmYr7 >. Acesso em: 08 jan. 2013.