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Semana de 22: marco de um novo tempo

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Há exatamente 90 anos atrás, nos dias 13, 15 e 17 de fevereiro, a Semana de Arte Moderna foi realizada no Teatro Municipal de São Paulo. Reunindo nomes de escritores, pintores, músicos e escultores, tais como Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Anita Malfatti, Graça Aranha, Di Cavalcanti, Heitor Villa-Lobos, Sérgio Buarque de Holanda e outros, assinalou o início de uma das fases de maior produção intelectual do nosso país. E, embora não tenha sido tão importante quanto muitos fazem crer, a Semana de 22 ainda deve ser lembrada como um marco daquilo que ainda estava por vir.

No Brasil e no mundo, o início do século XX não foi fácil. Passamos por uma guerra mundial, pela difusão do comunismo, por crises e alguns conflitos internos (a rebelião tenentista de Copacabana, em 1924, movimento dos operários, a Coluna Prestes, entre 1925 e 1927, a Revolução de 1930, etc.). O país estava em pleno processo de industrialização e urbanização, mas ainda na política do café com leite e nas vésperas do fim da Republica Velha. Juntavam-se o tradicionalismo agrário com a agitação dos centros urbanos. Era uma fase de grandes mudanças, em que todos esses eventos faziam parte de um “amplíssimo mosaico”¹.

No afã de progresso, uma minoria intelectual com recursos que a possibilitava realizar viagens ao exterior, trazia novidades sobre movimentos de vanguarda da Europa, ansiosa para renovar a arte no Brasil. Patrocinada pela elite paulista e com influência de várias tendências modernas (nesse momento havia apenas a repetição de padrões europeus), realizou a Semana de Arte Moderna. Mas, ninguém se enquadrava em qualquer escola. Como explicou Menotti Del Picchia: “Ao nosso individualismo estético, repugna a jaula de uma escola. Procuramos, cada um, atuar de acordo com o nosso temperamento, dentro da mais arrojada sinceridade”.

A idéia inicial era a de radicalizar e subverter padrões estéticos – “que o rufo de um automóvel, nos trilhos de dois versos, espante da poesia o último deus homérico que ficou anacronicamente, a dormir a e a sonhar” (Menotti). Seu lado escandaloso (por ser taxada de “futurista”) também conseguiu chamar atenção dos jornais e abrir a discussão de pequenos grupos intelectuais para o grande público. Essa foi uma conquista da primeira fase do Modernismo (também chamada de “fase heróica”), cujo início data da Semana de Arte Moderna. Porém, uma mudança consistente na arte nacional estava longe da maturidade. Por isso, Mário de Andrade afirmou que “a aurora continha em si todas as promessas do dia, só que ainda não era dia”.

Na época da Semana de 22, apenas os primeiros passos eram dados a caminho do entendimento da realidade brasileira e da própria informação que era importada da Europa – “Éramos uns inconscientes” (Mário de Andrade). Somente a mudança no âmbito estético fora alcançada. Com o tempo, o movimento entrou num processo de maturação e, na década de 30, passou à “subversão do conteúdo”¹ e à produção intelectual autêntica, não mais se limitando a copiar os moldes europeus.

Na realidade, poucas obras dessa fase inicial do Modernismo foram realmente significativas. E a Semana de Arte Moderna funcionou mais como “ponto de encontro de várias tendências modernas desde a Primeira Guerra” e como “plataforma que permitiu a consolidação de grupos, o seu desdobrar-se em viva realidade cultural”². A Semana de 22 abriu o caminho para esses grupos que, com cisões, disputas e manifestos acabariam por amadurecer e criar, pela primeira vez em nossa história, uma arte genuinamente brasileira. É assim que devemos lembrar-nos da Semana de Arte Moderna.

 

1 SODRÉ, Nelson Werneck. História da Literatura Brasileira. 10ª ed. Rio de Janeiro: Graphia, 2002.

2 BOSI, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira. 3ª ed. São Paulo: Editora Cutrix.

 

Imagem: “Obaporu”, de Tarsila Amaral (banco de imagens Google)