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Conto de Natal

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“Se o homem chora e continua escravo, de que foi que Jesus savar-nos veio?” (Tobias Barreto)

Por José Expedito de Carvalho Rêgo.

black jesusJesus morreu na cruz, em terrível suplício, para salvar a humanidade, segundo nos ensinaram os religiosos, mas parece que não adiantou mesmo. O mundo continua de mal a pior, até perdemos a esperança, nas horas de maior desolação e angústia. A não ser que a salvação esteja na própria morte, o que não é uma boa. A duvidosa vida eterna, com a qual podemos sonhar apenas, pouca gente a leva em conta, se é que alguém faz isso. O fato é que pessoa alguma deseja morrer e até os mais devotos e crentes tremem, quando chega a hora. O próprio Cristo, em Getsêmani, tem uma súplica que, para nós humanos, seria de medo: “Pai, se possível, afasta de mim este cálice!”.

Pouca gente lembra-se do Menino Deus durante o Natal, que se transformou numa festa profana, de consumo, ceia regada a vinho, tocada de mensagens batidas, iguais todos os anos, sem mais significado, permuta de presentes, de votos de felicidade. Para os comerciantes é muito lucrativo. Para os pais pobres é um aperto, para os pobres de verdade o Natal não existe.

Em vez de morrer adulto, no cimo do Calvário, sofrendo um sacrifício humilhante, como se fosse o pior dos bandidos, Jesus, que era inocente, poderia ter morrido em criança, subnutrido e desidratado, talvez assim os homens acreditassem mais n’ele, menino prodígio a ensinar a palavra do Pai. A morte de uma criança é absurda, injustificável , desesperadora. Não se compara à morte de um Deus de 33 anos. Maria Santíssima teria sentido dor maior se o Filho tivesse morrido criancinha, nas mãos dos soldados de Herodes. As mães das crianças que morrem no hospital gritam loucas de dor e desespero, saem pelos corredores puxando os cabelos e rasgando as vestes. São mulheres ignorantes, que não sabem controlar seus sentimentos. Ou então a dor que sentem é maior do que as das ricas e educadas, cujos filhos nunca morrem de vomitação e diarréia.

Uma vez vi uma criança agonizante numa enfermaria de hospital, o rosto vultoso e pálido, a respiração estertorosa e impossível, o quadro impressionou-me, fiz um poema cujo título era: “nunca entendi por que as crianças morrem!”…
Um padre meu amigo leu o poema, publicado num suplemento literário, disse que gostou muito, mas teve desejo de escrever uma réplica, explicando por que as crianças morrem… A réplica jamais foi escrita.

Eu sempre fico triste no Natal. Não sei explicar o motivo. Fui um menino pobre, mas não assim tão pobre de não ganhar presentes de Papai Noel. Não acredito que na minha infância tenha havido algum trauma relacionado ao Natal. Talvez minha tristeza venha do desencanto, vendo tanta gente açodada no corre-corre das compras, no alvoroço das lojas, adquirindo cartões e presentes para esposos e filhos, pais e irmãos, parentes e namorados, cartões que repetem as mesmas mensagens de fé, de esperança e de paz, mensagens que não partem do íntimo, do coração, mas são apenas palavras vazias, que muita gente nem lê, olha apenas as figura quando são bonitas e traçadas com arte.
Talvez que a melhor mensagem para mandar a um amigo seja a seguinte: desejo que neste Natal você seja sincero e autêntico, deixe de ser mentiroso e falso, pense menos em si e mais nos semelhantes, principalmente naqueles que, neste mesmo dia, estão morrendo de fome pelo mundo afora, nos que estão matando seus irmãos, nos que têm ódio, nos que juram vingança, nos que têm sede de justiça. E que pense de modo particular, em todos os meninos do mundo, nos que já nascem pedantes nas mansões dos ricos, para que se tornem humildes e bons; nos que nascem ladrões nas favelas sem lei, para que as injustiças sociais não o façam para sempre perdidos. E que não pense apenas em comer e beber e festejar com os amigos, mas que se lembre, pelo menos uma vez, do pobre Menino, que nasceu em Belém de Judá, para salvar os homens, e que não conseguiu cumprir sua missão!