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E se existisse no Brasil o Colégio Eleitoral?

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Por Alan Daniel Lacerda

(Cientista Político e Prof. do Dep. Políticas Públicas UFRN)

Publicado: http://lordedaniel.blogspot.com.br

As eleições presidenciais americanas deste ano geraram a usual curiosidade entre as pessoas que acompanham eventos políticos no Brasil. A disputa apertada entre o presidente democrata Barack Obama e o candidato republicano Mitt Romney atraiu a atenção de muitos observadores na imprensa e também em redes sociais como o Twitter. Os números das pesquisas de opinião, revelando empate técnico entre os dois aspirantes, conduziram alguns à conclusão de que se tratava de uma disputa imprevisível, em que qualquer um dos dois poderia ganhar. Na verdade, diversos modelos preditivos elaborados nos EUA já previam a reeleição do presidente Obama desde a semana anterior à eleição, com probabilidades próximas a 90%. Apesar de apostarem que o democrata ficaria à frente de Romney na votação popular, a segurança das predições derivava bem mais dos números do chamado Colégio Eleitoral, o real determinante do vencedor das eleições presidenciais nos EUA.

O que é o Colégio Eleitoral? A eleição presidencial americana é popular, mas indireta. Os eleitores votam para presidente, mas em rigor sufragam listas estaduais de delegados. São estes que na verdade votam para presidente nas capitais estaduais após o fim da apuração. Cada estado americano tem direito a um número de delegados, correspondente à soma de seus deputados federais e senadores. A Califórnia, por exemplo, o estado mais populoso, tem 55 delegados, pois envia para Washington 53 deputados federais (ou representatives) e dois senadores. Já Montana, estado pouco povoado, tem direito a 3 delegados, uma vez que elege um deputado federal e dois senadores. Ao todo, o Colégio Eleitoral é composto atualmente por 538 membros. Como a Constituição dos Estados Unidos exige que o vencedor atinja a maioria absoluta dos delegados para vencer no colégio, são necessários 270 delegados para o triunfo eleitoral.

À exceção de dois estados, a regra de eleição dos delegados é a mesma no país: o vencedor da votação popular em cada estado leva todas as vagas que o estado tem no colégio. Obama venceu na Califórnia, obtendo por isso todos os 55 delegados californianos. No total, o presidente amealhou nada menos que 332 delegados, enquanto seu adversário pôde atingir apenas 206. Sua vantagem no voto popular, porém, não chega a quatro pontos percentuais neste momento da apuração (50,8% a 47,5%, com outros candidatos atingindo percentuais abaixo de 1%).

O que aconteceria se a regra da eleição presidencial brasileira fosse a mesma? Não sabemos, é claro, pois provavelmente as campanhas dos candidatos e os eleitores reagiriam ao sistema de maneira diferente do que sob a regra do segundo turno, atualmente vigente. É possível, no entanto, simular resultados de eleições passadas, entendendo em nosso contexto como funcionaria um colégio eleitoral.

Na eleição de 2010, por exemplo, Dilma Rousseff (PT), com quase 47% dos votos no primeiro turno, obteria 403 de um total de 594 delegados (correspondendo ao número total de deputados federais e senadores do Brasil). Isso porque a atual presidente ganhou em muitos estados, vários deles com grandes eleitorados e muitos deputados federais: MG, RJ, ES, RS, PE, CE, BA, MA, RN, PB, AL, SE, PI, GO, AM, PA, AP e TO. O segundo colocado, José Serra (PSDB), com 32,6% do voto popular, receberia somente 180 delegados, correspondendo à sua vitória nos seguintes estados: SP, PR, SC, MT, MS, RO, RR e AC. Marina Silva (PV), por fim, ainda que com mais de 19% do voto popular, receberia míseros 11 delegados, em virtude de ter chegado à frente no Distrito Federal.

Mesmo na eleição presidencial de 1955, bastante competitiva, o primeiro colocado poderia exibir números vistosos em um hipotético colégio eleitoral. Juscelino Kubitschek (PSD) amealharia nada menos que 254 delegados, de um total de 412, apesar de ter recebido os votos de apenas 35% dos eleitores. Seus adversários, Juarez Távora (UDN) e Adhemar de Barros (PSP), ficariam com 83 e 75 delegados, respectivamente (30% do voto popular foi para Távora e 25% para Barros).

Como se pode depreender, a regra do Colégio Eleitoral pode nem exibir grande discrepância em relação à definição do nome do vencedor na comparação com outros sistemas eleitorais majoritários. Nos EUA, é precisamente isso o que acontece em geral: em apenas três eleições presidenciais o primeiro colocado na votação popular não foi o vitorioso no colégio. O problema maior do mecanismo reside na força desproporcional que ele dá a estados que não se inclinam de antemão para nenhum candidato. Os estados nos quais o vitorioso já está claro mal são visitados pelos presidenciáveis durante a campanha eleitoral e recebem por conseguinte menos atenção e informação das principais candidaturas.