O fim de ano se aproxima e com ele os votos de Boas Festas, que incluem o Natal e o Ano Novo. Cartões serão enviados com as palavras mais doces e repetidas, que dificilmente fugirão dos clichês e repetições xôxas, embora adoráveis pelo simples fato de sermos lembrados por amigos, familiares e outras pessoas gentis que ainda cultivam o ancestral hábito de enviar cartões e telegramas.
Digo ancestral porque era coisa corriqueira no passado, tanto que algumas pessoas se ocupavam em fazê-lo de uma forma original e que, por interessantes, nos alcançam ainda hoje.
É o caso de um grande vulto da cultura potiguar, o estudioso do sertão Oswaldo Lamartine de Faria.
Sendo ele amigo e admirador do não menos grande Luís da Câmara Cascudo, enviou-lhe um cartão de boas festas no fim do já distante ano de 1965. Mais do que um simples cartão, Oswaldo imprimiu nele a grandeza do seu espírito fazendo algo digno do ilustre destinatário.
Eis que saiu isto:
Cartão de Boas Festas para Cascudo
E que em 1965
Deus lhe guarde:
Da ira do Senhor
E do alvoroço do povo;
De ladeira abaixo – a água
E de ladeira acima – o fogo.
Do homem assinalado*,
E mulher de papo encarnado.
Do indivíduo caviloso**
E da baba do raivoso.
Dos sentimentos mesquinhos
E casa de maus vizinhos.
Da mulher que assobia,
E do pote que não esfria.
E das três palavras de castigo:
Esteje preso!
Eu vou declaro marido e mulher,
E Jesus vai contigo…
(*) Importante, célebre, notável.
(**) Manhoso, fingido.