Audiência Pública sob Análise
Por Ivenio Hermes
Discurso Inicial
Há bem pouco tempo, quando me preparava para escrever sobre o orçamento para segurança pública no Estado do Rio Grande do Norte, procurei o Deputado Fernando Mineiro que se propôs a me ajudar. Na época, ele me confidenciou que pouco entendia de segurança pública, porém, estava disposto a aprender. Hoje, um ano depois, o deputado apresenta um crescimento sensível em seu domínio sobre a matéria, demonstrando que está envolvido o suficiente com a causa para propor uma audiência pública na Assembleia Legislativa do Estado para discutir a situação dos concursados da Polícia Civil.
Foi nesta quarta-feira, 7/11, que aconteceu a audiência contando com a participação de representantes da Associação de Delegados (ADEPOL), do Sindicato dos Policiais Civis (SINPOL), da Comissão dos Concursados, dos Suplentes e do Governo do Estado.
A Polícia Civil do RN sofre muito com a situação imposta ao seu efetivo, baseada em pressupostos que há muito vêm sendo mostrados por este analista, inclusive a propaganda de que houve aumento do quadro de pessoal, pois o que têm acontecido nas nomeações é somente a substituição de alguns policiais falecidos, aposentados e uns poucos exonerados.
Como de costume, no entanto, alguns convidados repetiram argumentos antigos, estando diante do plenário apenas para enfatizar que o efetivo diminuiu, haja vista isso ser tão óbvio que salta aos olhos pelas manchetes dos jornais diariamente, mas é compreensível a necessidade da repetição do texto se a administração pública não parece dar atenção às demandas dos representantes e da sociedade e nem aquinhoar suas verdadeiras intenções.
Metendo o Dedo na Ferida
Todos os palestrantes foram unânimes em reconhecer que o problema da segurança pública no RN cada dia aumenta, e no que se aplica à entidade que deveria investigar e esclarecer os crimes que ocorrem não alhures, mas bem perto de cada potiguar, o problema é agravado por um descaso sem explicação.
Sempre presente nessas audiências, o representante da Comissão dos Concursados da Polícia Civil, Carlos Alberto Gonçalves Brandão Júnior, fez sua parte usando as ferramentas técnicas que apontam o futuro delegado que ele será. Além do Mapa da Violência 2012, de onde extraiu o crescimento da criminalidade no Rio Grande do Norte, ele deu o referido destaque a quantidade de delegacias e policiais que é a mesma de 16 anos atrás.
No argumento de Carlos Alberto Gonçalves Brandão Júnior, o ponto de reafirmação da vontade de trabalhar em prol da segurança, foi a coragem de abordar a má vontade da administração estadual. “Não tem como alegar a Lei de Responsabilidade Fiscal, se nela não entram as decisões judiciais” afirmou ele. E referindo-se à Governadora Rosalba Ciarlini, ele completou: “E se ela quer burlar a LRF por que ela não acata a decisão da justiça? Já que existe uma decisão na ação da convocação”.
Foi desse futuro delegado outra forte afirmação: “Há 12 anos o RN se encontra no limite prudencial e se manteve realizando concursos. A LRF nunca foi desculpa para não fazer as nomeações anteriormente.” Restando a indagação do motivo da reiterada utilização dessa desculpa para não realizar a convocação completa, mesmo já tendo sido mostrado por este analista em outros artigos, que o próprio governo se equivoca no texto das nomeações mostrando que não está sabendo o que está fazendo.
Nova Nomenclatura Mesmo Grupo
Ana Cláudia Saraiva Gomes, a presidente da ADEPOL, desabafou sua frustração com a atitude do governo e o engodo ao usar a desculpa do limite prudencial para não nomear os concursados da Polícia Civil.
Houve certo acréscimo no discurso da delegada, inclusive, fez merecida alusão às falsas críticas feitas à Polícia Civil, cujos problemas estruturais são conhecidos e ela citou a falta de efetivo, a estrutura precária e o sucateamento do ITEP.
Ana Cláudia mitigou a voz ao dizer que imaginava que pela necessidade da PC já na época da realização do concurso, que todos seriam chamados de imediato. A ADEPOL até apostou em um projeto que seria a criação da Divisão de Homicídios na grande Natal que contaria com 10 delegados (não especificou o número de agentes e escrivães). Hoje, lamentavelmente, esse trabalho na área de homicídios é realizado apenas por dois delegados.
Havia projetos para uma delegacia de combate a corrupção na gestão pública e deu novo nome aos suplentes do concurso, ela os denominou “remanescentes” e se mostrou completamente favorável à inclusão deles no quadro necessitado da polícia Judiciária.
Categoria Sobrecarregada Sociedade Insegura
Outro simpatizante da causa dos suplentes ou “remanescentes” foi o representante da Associação dos Escrivães, Roberto Moura. Seu apoio se dá também devido à sobrecarga que sua categoria, segundo ele, a mais penalizada, está sofrendo. Ele disse que há escrivães dobrando o horário de serviço para dar conta das delegacias (ele mesmo sai de uma delegacia pra outra).
Segundo o escrivão, existem casos de um escrivão precisar dar conta de sete comarcas no interior. Essa carga de trabalho é tão elevada que gera impacto direto na saúde dos policiais. Ele ainda aponta que a licença prêmio é negada aos policias pela falta de substituto.
Ele demanda soluções práticas e não existe nada mais prático do que a convocação dos concursados para efetivação no cargo e dos suplentes para o curso de formação e posterior nomeação.
Renata Pimenta, representante do SINPOL, reiterou diversos dados já mencionados pelos outros oradores. Ela também foi incisiva em afirmar que existe a prática de uma politicagem que no governo Rosalba culmina no sucateamento que está existindo na PC RN, em dados comparados com a PM. Há um aumento no orçamento 2013 tendenciosamente maior para a PM.
Ela se dirigiu diretamente aos concursados (formados e suplentes), instando para que todos se unam e tomem as ruas. Para ela o governo atual só age mediante pressão. “Se depender de esperar a decisão judicial, todos serão colocados em banho-maria por este governo.” Ela afirmou.
Ainda se dirigindo diretamente aos suplentes, Renata foi firme em dizer: “É isso que o governo quer… Cansar vocês! Mas vocês devem lutar… Vamos à luta!”. Emocionada ela citou sua própria situação como suplente na ocasião de seu concurso. Naquela época, numa das tentativas de conseguir ingressar na PC, o Secretário a olhou e disse: “Você quer o concurso? Lute!”
O Fiasco Governamental
Momentos antes da audiência, o delegado e diretor da Polícia Civil no Interior buscava informações entre os suplentes e formados. O delegado José Carlos de Oliveira, que estava ali representando o Governo do Estado, coletou alguns dados sobre o número exato de formados e suplentes, algo que ele não precisava fazer se o Governo o tivesse municiado com conhecimento para falar adequadamente sobre o problema.
O delegado José Carlos de Oliveira reconheceu que todas as reclamações eram justificadas e dentro do que lhe foi informado que transmitisse, veio apenas um recado da administração do Estado: de que a previsão é que em 2013, após sair do limite prudencial, os concursados poderão ser chamados.
Dizer que os concursados poderão ser chamados é a mesma coisa que dizer que poderá chover no outro dia, aliás, usar o verbo “poder” diante de um direito sólido, garantido e adquirido por pessoas que se empenharam num concurso com tantas etapas e todas vencidas, é o mesmo que zombar da legislação. É um “dever” de o Estado garantir que o direito de seus cidadãos seja assegurado, agindo dessa forma e enviando um recado zombeteiro desses, ou mostra realmente um grande descaso com a segurança pública e a polícia civil ou foi o fiasco governamental da semana.
O Conclave das Novidades
O Senso de oportunidade deve permear as ações de qualquer pessoa que faça parte de uma reunião. Desse conclave fez parte Paulo Cesário, suplente de delegado, que na plenária se manifestou pela causa dos suplentes (remanescentes) e apresentou informações curiosas e dentre elas há um destaque para uma verba da SENASP – Secretaria Nacional de Segurança Pública.
Cesário afirmou que os cursos de formação em Pernambuco não estão tendo impacto nenhum nos cofres do governo estadual. Ele afirma que isso advém de uma verba obtida da SENASP e aproveitou sua manifestação para solicitar ao Deputado Estadual Fernando Mineiro que intervisse junto a Deputada Federal Fátima Bezerra para se familiarizar dos trâmites para a obtenção dessa verba.
Disposto, o Deputado Mineiro respondeu de imediato que dependendo dele faria o possível, mas advertiu que mesmo sem custos é preciso da boa vontade da administração do governo estadual. É o governo que demanda o pedido e estudo da verba para que tudo se concretize.
Nesse momento inusitado, Renata Pimenta interrompeu e disse que o governo perdeu 40 milhões para as reformas das penitenciárias e não quis utilizar de verba federal. Mineiro novamente interrompeu e disse que tudo tem que partir do governo.
Alguém questionou a demora no trâmite das aposentadorias e Renata respondeu que o governo não quer aposentar os policiais e que muitos estão entrando com ação judicial para conseguir esse benefício. O posicionamento da administração estadual é que só aposenta administrativamente de forma compulsória, ou seja, na idade limite.
Outro questionamento foi sobre os 200 agentes que estarão aptos a se aposentar, haja vista que ingressaram em 1982. Renata disse que os dados são incorretos, ela afirmou se tratar de bem mais do que 200, cerca de 350 agentes estariam aptos e só esperando o final do enquadramento no plano de cargos. Muitos não se aposentaram ainda este ano porque estão aguardando acabar o pagamento do retroativo que está sendo feito até dezembro de 2012.
Presenças Significativas e Conclamações
O Deputado Mineiro encerrou a audiência conclamando os concursados a continuar a pressão e reiterando seu ponto de acompanhar a questão orçamentária.
Paulo Cesário, com suas revelações, realmente instou outros a se manifestarem. Uma dos que se manifestou mais efusivamente foi Renata Pimenta. Ela conversou com os suplentes e concursados e disponibilizou o SINPOL para que fosse feito qualquer tipo de “movimentação” (ligações telefônicas, carros de som, passeatas, etc) para reivindicar as nomeações.
Outras presenças significativas ocorreram na Assembleia Legislativa. Algumas silenciosas, porém atentas e firmes carregadoras do estandarte dessa causa que visa retirar a polícia civil do abandono e ostracismo administrativo, e que impactará no aumento da segurança pública potiguar. Antonioni Jatobá Bezerra Tinoco, Flávio Antônio de Carvalho Fagundes e Luiz Carlos de Araújo Junior estavam lá representando a comissão dos suplentes juntamente com mais onze pessoas.
Essas pessoas lutam com as armas que possuem, pretendem convocar muitos participantes para as próximas ações em conjunto com os formados. Ações que vão desde um simples twitaço até acampar no pátio da sede da governadoria. Assim como a sociedade potiguar, eles não perdem a esperança de ver seu direito (de combater o crime) respeitado.
REFERÊNCIAS:
MINEIRO, Fernando. “O governo está brincando com a segurança pública no RN”. Disponível em: <http://migre.me/bFgDG>. Acesso em: 07 nov. 2012.
BO, Redação Portal. Audiência na Assembleia Legislativa indica que homicídios triplicaram no RN: Em contrapartida, efetivo da Polícia Civil é praticamente o mesmo há 16 anos.. Disponível em: <http://migre.me/bFh04>. Acesso em: 07 nov. 2012.
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO RN (Natal). Audiência pública: concursados apelam para que governo priorize sua convocação. Disponível em: <http://migre.me/bFhxG>. Acesso em: 07 nov. 2012.