Os institutos parecem estar vivendo um inferno astral. Suas pesquisas não se aproximaram do resultado saído das urnas. Em alguns casos, como foi com o Start, a disparidade chegou a mais de 10%. Este cenário, sem dúvida, alimenta todo um imaginário já existente com relação às sondagens eleitorais.
A depreciação do papel das sondagens eleitorais é tão forte que há quem aproveite a situação, inclusive, para propor a proibição da publicação dos levantamentos. Esquecem de perceber que o direito a informação é uma clausula pétrea constitucional em nosso país.
No entanto, esta visão com relação às pesquisas nem vem de hoje. Têm raízes profundas. O status negativo que goza as pesquisas eleitorais está intrinsecamente ligado a maneira como as sondagens foram tratadas na época da ditadura. Os militares, constrangidos com a divulgação dos baixos índices dos seus candidatos, empreenderam um conjunto de ações com o intuito de deslegitimar os levantamentos. Todo o prestígio inicial das pesquisas eleitorais, que chegaram no Brasil com o prestígio de já terem acertado vários resultados nos EUA e a improvável vitória do partido trabalhista inglês na década de 40, se esvaiu. Os militares, não apenas dificultaram a publicação das pesquisas, como também difundiram a noção de que os institutos sempre estavam atrelados a interesses obscuros.
O resultado foi à produção de uma legislação regulamentadora das pesquisas, mesmo depois do processo de democratização, extremamente retrógrada e que cria barreiras contra a produção de informação na sociedade. O fato concreto, em suma, é que a proibição da veiculação das sondagens não irá resolver o problema. Ao invés de propor a sua extinção, é relevante discutir as razões do seu (não) poder preditivo.
E para estabelecer um diálogo frutífero deve-se, antes de mais nada, afastar a visão conspiratória do mundo. Há institutos que se corrompem? Eles existem sim! Inúmeras artimanhas são largamente empregadas neste sentido: retirar o quantum de imparcialidade das perguntas do questionário e quebrar a proporcionalidade da amostra quanto ao tamanho das regiões e/ou das classes sociais estão entre as “estratégias” mais utilizadas. No entanto, assim como em outras áreas da sociedade, existem bons pesquisadores e outros ruins.
Outra questão a ser enfatizada é que a pesquisa é uma “fotografia do momento”. Ela apresenta a composição de um cenário. E não é incomum, principalmente com a internet e a rápida circulação da informação, surgir correntes de opinião que alterem rapidamente o arranjo eleitoral inicialmente capturado pelo levantamento. Com isso, deve-se entender que, por mais que a pesquisa seja eficiente, ela irá chegar com um determinado déficit de tempo. Não é possível sondar antes que um fenômeno social já tenha gerado todas as suas conseqüências e se torne conhecido. É como querer fechar a gaveta com a chave dentro.
A “onda verde” capitaneada por Marina Silva, em âmbito nacional, figura como um bom exemplo. Praticamente todos os institutos nacionais erraram porque não conseguiram apreender a migração de votos da candidata Dilma para a concorrente do PV. Ações e opiniões subterrâneas só foram aparecer com a abertura das urnas.
O resultado no RN também apresentou surpresas. Todos os institutos erraram o resultado para governador na capital do estado. Eles davam como certa a vitória de Carlos Eduardo sobre Iberê em Natal. No entanto, foi notório que a polarização entre Iberê e Rosalba, aliado a um gigantesco trabalho do candidato do PSB, enchendo as ruas da cidade de bandeiras, de decoração, a caixa telefônica das pessoas de mensagens sugestivas, além de outras iniciativas, trouxeram um resultado mais favorável para o atual governador entre o eleitorado da capital. As atividades dos últimos dias de campanha projetaram Iberê positivamente, fazendo com que as sondagens não conseguissem constatar o seu aumento.
Nos dois casos as pesquisas se mostraram incapazes porque simplesmente a operacionalização da sondagem eleitoral e de opinião tem limitações objetivas. Não se trata de tentar encontrar um pesquisador que se vendeu, ou um instituto que não soube operar a metodologia corretamente empregada. A explicação é bem mais complexa e exige raciocínio analítico e não suposições fantasmagóricas.
Mas como melhorar a relação dos levantamentos com a sociedade? Duas ações podem ser efetivamente propostas para minimizar os limites e possíveis inconvenientes das pesquisas. É imprescindível, primeiro, permitir que mais institutos produzam sondagens, pois assim o poder de tentar forjar realidades vai estar mais fortemente distribuído e não ficará nas mãos de poucas empresas. O poder controlador da competição entre as várias pesquisas irá, com o passar do tempo, manter os bons e retirar os ruins do mercado. Em Natal mesmo já há institutos, antes famosos, que perderam totalmente a credibilidade e suas pesquisas já viraram motivo de piada.
E é também importantíssimo conscientizar a população sobre as reais possibilidades dos levantamentos eleitorais. A sondagem eleitoral projeta perspectivas. Não advinha o que vai acontecer. Neste sentido, não poderemos mais ficar a mercê do profissional que diz já saber o futuro, como também não é possível abrir mão do direito a informação que a pesquisa promove.