Bolsonaro é o maior democrata – vulgo Mercador da morte – que já existiu, só que ninguém percebeu. Por uma doce desilusão com as grandes narrativas histórico-filosóficas, esquecemo-nos de que as democracias não servem a outros propósitos senão ao ‘equilibrar as classes’ – a partir da exclusão de pobres, negros e mulheres –, imposição do império das leis – aos mais desassistidos – e exercício da morte junto às populações politicamente olvidas: indígenas; negros; mulheres, deficientes e comunidade lgbtqia+.
Afora a leve, porém, ácida ironia exposta acima, por um momento esquecemos de que não há nada mais democrático que proporcionar igualdade e equidade a todos. Ora, há algo mais democrático que impetrar uma política de morte que atinge todas as camadas das classes sociais? Sob o jugo de Bolsonaro, o Mercador da morte, têm morrido, por meio dos chicotes pandêmicos, brancos, pretos, homens, mulheres, heteronormativos, ricos, pobres, adultos, jovens e crianças.
Nenhum brasileiro residente no Brasil pode dizer que não foi alcançado pelos efeitos deletérios da necropolítica de Bolsonaro. A única divisão possível – se é que há! – diz respeito ao nível de alcance, isto é, uns foram alvejados diretamente e outros indiretamente. Os pobres têm morrido, os ricos têm sofrido – coitados! – com a falta de pessoas para consumir. Afinal, sem gente (viva), não há para quem vender, sem dinheiro, não há como comerciar.
Qualquer democracia, em seu estado de plena saúde, anseia pelo contingenciamento populacional – vulto eugenia –, controle sócio-político e enriquecimento dos mais ricos através da exploração da força do trabalho dos mais pobres. O sonho de consumo de todo democrata está em execução com Bolsonaro.
“Ah, mas não é bem assim; vemos que até os liberais mais ortodoxos estão reclamando do ‘Presidente’”. Então, é que eles estão emocionados, pois, liberal que é liberal, na prática, alimenta-se do desequilíbrio social e, claro, não mora nem no Brasil. O povo não é bobo, conhece a Rede Globo, o empresário não probo e Direito, que é roubo!
Se hoje assistimos editoriais de jornais esboçarem alguma opinião virulenta contra Bolsonaro, isso não se dá – creiam! – em razão do amor à vida (política) – que se dane a biopolítica! –, antes, suas reclamações se dão exatamente porque Bolsonaro é, como todos os autocratas são, sui generis.
Isto é, as personalidades autoritárias têm por características a impossibilidade de serem controlados, isto é, ao se criar o monstro, o criador sempre pensa que tem domínio sobre ele, todavia, os amantes do caos não seguem regras, eles inventam as suas e só as segue quando lhes dá na telha!
Entendo que o Mercador da morte é tudo que os liberais sempre desejaram, só não estavam sabendo como pedir!
Depois do século XX, aprendemos que além de “harmonizar as classes” – leia-se: descer o cacete nos críticos do regime –, as democracias servem como adubos para germinar sombrias mentes que lideram outras mentes adoentadas, que vivem entre nós, os ditos mentes sadias.
Metade da população votante brasileira decidiu pagar para ver e a conta saiu salgada. Se o salário do pecado é a morte, diz-nos Paulo, o dom da estupidez é o sofrimento eterno, digo eu.
Se perguntarem-me o que eu acho de tudo isso, eu digo que minha parte sádica diz “bem-feito” – aqui comporta ambiguidade! –, por outro lado, minha parte sã diz que é tudo muito deprimente, trágico e melancólico.
Jamais titubearei, quando perguntado for, acerca do que venha a ser a democracia. Assim como Marx disse, ao se referir à Comuna de Paris, digo eu acerca do regime em voga: “eis aí a democracia de vocês; deliciem-na, saboreiem-na, sarrabulhem-se!”.