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Distopia pra quê, se eu moro no Brasil?

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Apocalipses climáticos e zumbis são as novas distopias veiculadas e vinculadas aos streamings. Antigamente, na era do livro, tínhamos Huxley, Burgess e Orwell como mestres das distopias que faziam nossas mentes.

Alguns não têm acesso ou interesses pelos livros, outros não podem pagar por um streaming. Porém, isso não é desculpa para deixar de saborear uma boa distopia – oxímoro! Sim, pois, basta pôr a cabeça à janela, com muito cuidado, claro, para se deparar com uma das maiores distopias do primeiro quarto do século XXI: o Brazil.

Já tem mais de 15 dias que procuram pelo assassino Lázaro, cuja habilidade em fugir mobilizou mais de 400 policiais, preencheu os abutres noticiários, que – juntamente com a Polícia, relacionou os atos do assassino com satanismo e religião de matriz africana, dando a impressão de que os crimes cometidos tinham alguma motivação religiosa – e serviu de memes inconsequentes.

Aqui no Brazil é assim mesmo, o racismo se manifesta publicamente. Ora é racismo religioso, ora é racismo individual, que eles chamam de “injúria racial”. Ora é contra um indígena, ora é contra um preto. Para eles somos animais abatíveis, independente da raça, independentemente da cor. Como diz Vaquer, sobre o charme da burguesia cafona, por ocasião de adoção de uma criatura: não importa se é um cão ou uma criança, quem pintar primeiro serve.

É importante lembrar que a Política, além de invadir terreiros de religiões de matriz africana, constrangendo violentamente as pessoas e invadindo propriedades, ainda, segundo acusação, torturou a esposa de Lázaro, para que esta desse conta de seu paradeiro. Além do absurdo de termos notícias de que um rapaz parecido com assassino foi linchado, ainda se consta que, ao que as investigações indicam, os fazendeiros da região contratam Lázaro para aterrorizar a região – já há muito tempo –, a fim de desvalorizar as chácaras da região.

A coisa é tão surreal que tenho receio, tenho sincero receio de que os produtores do desenho Scooby-Doo processem o Brazil por estarem plagiando seus roteiros.

Na mesma semana tivemos indígenas sendo atacados em suas aldeias por grileiros, que lhes tiram a vida, ao passo que foram atacados pelos parlamentares na Câmara dos Despudorados, que lhes tiram a terra (pleonasmo de vida). Ataques estes que não se limitaram, na ocasião, ao PL satânico, pois, a Polícia, sempre ela, oprimiu os indígenas – como sempre fazem.

Ainda sobre Lázaro, a polícia militar do Maranhão matou um jovem que tinha doença mental, de acordo com sua avó de 90 e tantos anos, porque ele disse que gostava do assassino em questão. A Polícia arrombou sua casa e lhe alvejou, sob pretexto de legítima defesa, claro – a Polícia Militar só age nessas ocasiões!

A mesma Polícia que sob o morro e mata mais de 20 pessoas de uma só investida e invade a casa de um jovem com problemas mentais para matá-lo, na frende de sua avó, não consegue pegar uma… uma… uma pessoa na mata, ainda que ele esteja protegido pelos fazendeiros da região, ainda que a Polícia conte com um arsenal de armas, logística e helicópteros.

Como se já não fosse o bastante, um escândalo de corrupção explodiu nas mãos do Governo, que fez lobby para a compra superfaturada da vacina Covaxin.

Todavia, tem mais! Dois policiais militares foram acusados de crime de estupro contra uma moça de 19, que pediu ajuda aos policiais porque estava perdida. A “Justiça” Militar, através do juiz militar Ronaldo Roth, da 1ª Auditoria Militar, essa semana, absolveu um deles e imputou ao outro o crime de libidinagem, pois, segundo o parecer, não se configuraria crime de estupro porque a moça não se debateu contra o crime cometido. O correto, claro (aqui consta ironia!), era ela ter ido pra cima de seus algozes armados – e, no entendimento da JM eram seus “parceiros” – para que o estupro pudesse se configurar como crime de estupro.

Ah, e teria de ir pra cima de uma maneira específica, senão, seria prática de sexo consensual. Aliás, a mídia jornalística, em sua maioria, tratou o fato como “sexo entre policiais e jovens de 19 anos”, como se sexo fosse a mesma coisa que estupro.

Quer mais? Lá vai!

Lembra do caso Covaxin? O ministro Onyx ameaçou o deputado Luís Miranda, que explodiu a prevaricação de Bolsonaro. Mas, não foi uma ameaça na surdina. Jamais. O ministro convocou uma coletiva de impressa para AMEAÇAR uma testemunha da CPI da Covid, aberta pelo Senado Federal – que nem moral tem, aliás.

Quer mais?

Ontem, 24, o Bolsonaro, no estado do RN, além de transitar sem máscara, como de costume, ainda pegou uma criança no colo e tirou sua máscara; assim, diante das câmeras, sem o menor puder – agora é a hora da extrema-direita, vulgo fascismo, aparecer com seu plot twist.

Voltemos duas ou três semanas atrás, porém, não voltemos muito. Kathlen e seu filho em gestação foram assassinados por uma bala de fuzil, por ocasião de uma ocorrência da… advinha…. PM.

Um rapaz negro foi confrontado por um casal de jovens brancos, no Leblon, que o constrangeram, querendo saber se a bicicleta elétrica que ele estava era deles. O jovem negro expôs o casal nas redes sociais e denunciou o casal. Qual o fim da história? Encontraram um suposto ladrão da bicicleta elétrica do casal. Era um rapaz branco. Acabou? Não.

Agora a Polícia investiga o próprio denunciante da calúnia sofrida, que, todos sabemos – ninguém é doido –, foi vítima de racismo, ainda que não se consiga uma tipificação penal. O rapaz teve a bicicleta apreendida porque ela foi roubada pela pessoa que a vendeu em um app de compras.

Quer dizer, na prática, o rapaz que foi vítima de calúnia e racismo perdeu a bike e agora é investigado por receptação. Pode um troço desse? No Brazil, sim!

Deixa-me ver o que mais… eu só quero pegar casos recentes, para que o leitor não pense que eu estou forçando a barra. Aliás, esses casos, em sua maioria, não têm sequer três semanas. Alguns vieram à público ontem.

Chega, né?

Porém, só mais uma informação: o deputado Vitor Hugo quer aprovar o Projeto de Lei 1595, que altera as Leis nº 10.257, de 10 de julho de 2001, e nº 9.807, de 13 de julho de 1.999, que dispõem sobre as ações contraterroristas. Esse projeto é tão perigoso para a saúde da liberdade (fundamental) de associação, que até a ONU mandou uma carta de alerta o Governo sobre o perigo desse projeto “antiterrorismo” – mais claro seria dizer: Projeto Autoritário.

Bem, diante de nossa realidade, eu realmente penso que pagar para assistir ou ler distopias é gasta um dinheiro do qual não se dispõe. Não seja bobo. Abra sua janela. Abra seu Twitter e tenha uma síncope.

O que tem ocorrido no país em seus 521 anos não caberia em livro algum; matéria de enredo para distopias alguma concorre com o Brazil.

Talvez João, o Evangelista, tenha exagerado sobre os feitos de Cristo, ao afirmar que não caberiam em livro algum. Mas, eu falo a verdade, não haveria biblioteca alguma capaz de conter os calhamaços que renderiam nossas misérias diárias.

Como toda distopia, até as notícias boas evidenciam o inferno em que se vive. Ontem o Lula se livrou de seu 15º processo, dos 17 existentes. Moro foi considerado suspeito em todos os processos e sentenças contra o ex presidente. O Brazil é uma piada de péssimo gosto. Prende-se um candidato que, certamente, iria ganhar as eleições contra Bolsonaro em 2018, a fim de assegurar o golpe deflagrado em 2016, ainda que se soubesse que seria uma tragédia anunciada. Aí, cinco anos depois o STF conclui que estava tudo errado, desde competência até suspeição.

Quer dizer, só não digo que o Brazil é bagunçado, porque é orquestrado. Isso é o sulco da distopia: até o que parece bom, na verdade, é uma reverberação do mau!

É, o meme procede: o brasileiro não tem um dia sequer de paz.

Ah, quase me esqueço, Guedes, ministro da Economia só tem ideias boas: atenuar a pobreza dos misérias com as sobras dos restaurantes e estender o prazo de validade de alimentos perecíveis.

Ricardo Salles, ex ministro do Meio Ambiente “caiu” para dar lugar ao Joaquim Álvaro Pereira Leite, que era conselheiro da Sociedade Rural Brasileira (SRB) até antes de assumir o novo cargo.

A travesti Roberta foi queimada viva no Recife por um adolescente..

Sem falar na… Não, chega. Assim o texto não terminará nunca.