Atribui-se a Millor Fernandes a afirmação: “xadrez é ótimo para desenvolver nas crianças a habilidade de jogar xadrez”.
Analogamente, podemos dizer: “provas são um instrumento perfeito para avaliar a capacidade de fazer provas”.
Mas é claro que xadrez e provas podem ir além disso. Não muito. Mas também não tão pouco.
Provas nacionais, como as do SAEB, e internacionais, como o PISA, oferecem alguma indicação do quanto, num sistema de ensino, alunos estão aprendendo. Essa indicação pode não ser tão exata quanto se imagina e por isto não precisa ser levada tão a sério. Mas que essas provas indicam algo, isso indicam.
Por exemplo, pelo PISA, exame internacional aplicado em estudantes de 15 anos de idade de quase 80 países, podemos perceber que nosso país joga na série C do campeonato mundial da Educação. Já estivemos na série D, conseguimos subir, mas ainda não nos afastamos da zona de rebaixamento.
E o SAEB, avaliação nacional da Educação Básica, ajuda a entender por que isso acontece. A cada edição ficamos sabendo que a imensa maioria dos estudantes não aprende aquilo que seria esperado que aprendessem nas diversas etapas do seu percurso escolar. No terceiro ano a maioria ainda não aprendeu a ler e a escrever palavras. No quinto ano, poucos conseguiram aprender o esperado para sua idade. E no nono ano idem.
Aqui precisamos ter cuidado e evitar a conclusão apressada de que “nossos estudantes não estão aprendendo”. Não é exatamente isto que essas provas estão a nos mostrar.
Eles aprendem. Porém não no ritmo que seria esperado. No quinto ano uma parte considerável é capaz de juntar sílabas, reconhecer e escrever palavras. No terceiro ano muitos podiam não ser capazes disto. Mas no quinto já conseguem. E no nono ano demonstram haver aprendido bastante daquilo que seria esperado que fossem capazes de ter aprendido no quinto ano.
O que temos é uma defasagem idade-série estrutural, sistêmica: nossos alunos estão levando mais tempo que os de outros países para aprenderem o que se esperaria que tivessem aprendido. Por isto chegam aos 15 anos com tanta coisa ainda por aprender e desenvolver e no ranking do PISA frequentam algum lugar entre a terceira e a quarta divisão.
Por isto, no nível superior, professores constatam que os alunos que acabam de ingressar na universidade escrevem como se tivessem 13 ou 14 anos e ainda frequentassem o fundamental. E encontram imensa dificuldade para compreender o que lêem em textos acadêmicos. Dificuldade que se reduz bastante quando terminam a segunda ou terceira pós-graduação
O PISA também mostra que esta não é uma característica restrita à rede pública. Os mais abastados estudantes brasileiros demonstram ter aprendido menos que os mais pobres de um número significativo de países como China, Inglaterra ou Canadá.
Ao mesmo tempo, quando considerados apenas os estudantes da rede federal de ensino (alunos dos IFs, colégios de aplicação das universidades federais, escolas militares e Pedro II), o Brasil passa para o pelotão de elite, tendo em alguns anos e em algumas áreas ficado entre os 3 primeiros do ranking.
Isto mostra que sabemos como fazer crianças aprenderem num tempo menor que o da crônica defasagem idade-série predominante. Apenas não estamos sabendo como fazer isto nas demais redes públicas e privadas.
Estamos mal. Mas a saída do poço em que nos metemos não está fora de nosso alcance. Se a gente olhar com atenção aqui para dentro mesmo, para boas e exitosas experiências educacionais brasileiras, vamos encontrar caminhos para tornar o que é hoje uma coisa para poucos em algo para muitos, para a maioria até.
É sobre isso que quero falar no próximo artigo.