Por Kleber Giovanni Luz (Médico, Infectologista, Professor do Dep. de Infectologia da UFRN/Hospital Giselda Trigueiro)
A doença causada pelo vírus da imunodeficiência humana vem, desde o início dos anos 80 do século passado, ceifando a vida de milhares de pessoas. Conhecida inicialmente como peste gay, a AIDS afetava grupos específicos da sociedade como os hemofílicos, os que haviam feito uso de transfusões sanguíneas, os filhos de mulheres infectadas e os homens que faziam sexo com homens infectados, assim como os homens e mulheres que mantinham contato sexual sem proteção. Os usuários de drogas ilícitas por via venosa com frequência se infectavam. Lamentavelmente, a evolução das pessoas infectadas era quase que invariavelmente para a morte.
Com a determinação do agente causal da AIDS, em 1983, teve início estudos que buscavam encontrar medicamentos capazes de inibir a multiplicação do vírus no corpo humano e consequentemente impedir a progressão da doença para a morte. Nos anos 90, tem início o uso da terapia combinada, onde uma combinação de três drogas era administrada às pessoas infectadas e, a partir daí, houve uma melhora significativa na qualidade de vida dos doentes e houve um esvaziamento muito importante das enfermarias onde se internavam os pacientes. Nesses anos, havia sempre comunicações na mídia, de forma oficial ou não, que estimulavam as pessoas a, principalmente, fazerem sexo seguro. Os números se estabilizaram e a quantidade de morte por AIDS caiu de forma significativa.
Lamentavelmente, nos últimos anos, temos assistido a um incremento do número de pessoas infectadas e principalmente percebemos que muitos jovens chegam a ser admitidos nos hospitais especializados com manifestações clínicas de intensa gravidade, podendo evoluir para o óbito.
Ao verificarmos o registro de óbitos do Hospital Giselda Trigueiro, onde funciona o Departamento de Infectologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, observamos que 80 pessoas tiveram como a causa básica do óbito a AIDS no ano de 2016.
Essas mortes, na nossa opinião, seriam perfeitamente evitáveis desde que o diagnóstico da infecção e o tratamento tivessem sido feitos de forma precoce e efetiva.
A questão que se impõe é: sendo a AIDS uma doença de fácil diagnóstico, de tratamento simples e disponível na rede do Sistema Único de Saúde, e que sua prevenção se baseia praticamente no uso do preservativo, mas que também pode-se utilizar medicamentos pós exposição ou até mesmo antes de se expor em uma relação sexual, como se explicaria o crescente número de casos de infecção e principalmente os óbitos?
Uma recente pesquisa realizada em uma instituição de ensino superior pública encontrou que cerca de 30% dos alunos da graduação não utilizam o preservativo quando mantêm relação sexual. Este fato é alarmante pois pode facilitar não só a transmissão do HIV, como também a transmissão de outros agentes capazes de produzir doenças sexualmente transmissíveis, com possibilidade de grave dano a saúde de jovens.
Acreditamos também que a multiplicidade de parceiros, em combinação com o uso concomitante do álcool ou outras drogas, podem ser, dentre outros fatores, causas raiz do cenário atual da infecção do HIV. A sexualidade não tem sido um tema muito discutido na nossa sociedade, em especial quando se discute relações sexuais fora dos relacionamentos, em relações afetivas múltiplas ou em relações homossexuais. Pensamos ser dever da Universidade Federal do Rio Grande do Norte colocar em pauta o tema da sexualidade e o risco da infecção pelo HIV na cidade de Natal e no RN.
Finalizando, é importante ressaltar que, se um jovem tem tido exposição sexual desprotegida, e vem apresentando ou não sinais de doença como perda de peso, infecções respiratórias de repetição, diarreia, lesões de pele produzida pelo herpes-zoster, foliculites, entre outros sintomas deverão ser voluntários para a realização de testes que busquem identificar uma possível infecção pelo HIV.
Lembramos que, além de ambulatórios mantidos pela Prefeitura Municipal e Secretaria Estadual de Saúde, a UFRN mantém no Hospital Giselda Trigueiro – e que em breve será transferido para o Instituto de Medicina Tropical da UFRN – dois ambulatórios específicos para tratar pessoas infectadas pelo HIV, e ainda os ambulatórios gerais realizados por outros professores do Departamento.
A mensagem final é que é muito importante fazer a prevenção da infecção, a testagem frequente e se necessário se instituir o tratamento. Ou ainda incentivar o uso de medicamentos para a prevenção pós ou pré exposição à infecção pelo HIV.