A noite da última quinta-feira (30) era para ter sido marcada pela comemoração do sucesso do Sarau Insurgências Poéticas, movimento de resistência artística que tem o poeta Thiago Medeiros como um dos organizadores. Mas a brutalidade e o fascismo de um ataque homofóbico quis calar sua voz. Com seis pontos na boca, corpo agredido e o medo de sair de casa, Thiago ainda acredita no amor como transformação “Ele quem nos guia e nos retroalimenta!”.
Leia seu depoimento:
Saímos do sarau e fomos confraternizar, comer, conversar, estávamos estre amigos queridos, cheios de amor. Com um tempo longo, chegou esses dois caras que pelo nervoso não lembro do nome, nem da cara. Começaram a falar umas coisas sinistras, inclusive sobre mulheres, LGBTs. Eu sou uma pessoa da fala, sou do embate e respondi ao que ele falava. O cara levantou e apertou a minha mão quase quebrando, falei sobre isso, disse que aquilo era agressão e chamei atenção de quem estava comigo. Ele respondeu: você ainda não viu o que é agressão.
Eu e Marina pedimos um Uber e atravessamos a rua para pegar o carro. Quando eu ouço: – Thiago! Ao me virar virei já fui surpreendido com um soco na cara. Algumas pessoas LGBTs que estavam no estabelecimentos tentaram nos ajudar. O motorista também saiu do carro, abriu a porta, mas o agressor empurrou as pessoas e me deu um soco no olho direito. Enquanto tentávamos entrar no carro, ele segurou a porta e me deu vários pontapés, segurando a porta e apontando para a arma enquanto me dizia: – Você vai levar é um tiro bem na sua cara de viadinho (sic) abusado que você tem!
Quando vi aquela arma chegando e o homem segurando a porta do carro, sob meus gritos e os de Marina de que deixasse a gente ir, só queríamos ir embora da mesma forma como o “João Só queria ver os Pássaros”, peça que escrevemos juntos e que traz relatos igualmente ao meu, de violência LGBT na Cidade do Sol.
O motorista, que também tinha sido ameaçado pelo cara, num ato de coragem acelerou o carro e eu consegui puxar a porta. Não bastava o sangue, ele queria me calar, ou calar outra voz que talvez ecoasse nele, não sei. Mas sei que a vida estava ali apresentada como um segundo, se tudo não tivesse sido cronometrado naquele tempo, eu tivesse entrado para as estatísticas de esquecimento desde estado.
Mesmo sendo forte e acho que eu sou, quando alguém derrama seu sangue e você o vê ali misturado com pedras de asfalto, lama, lixo você não entende ainda mais a brevidade da vida. Mas, entende o pânico que tenta se instaurar na cidade, esquecemos de dissecar essas violências. Vivemos no estado mais violento do Nordeste para a existência de LGBTs e no segundo estado do país mais violento para esta existência.
Fiquei refletindo, me sentindo todo despedaçado, PRECISAMOS falar SOBRE LGBTfobia no RN. Me senti sozinho, porque temos medo de falar sobre isso, tentam nos calar de toda forma. Mesmo sabendo de muitos amigos que sofrem esse tipo de violência, não tornam isso público, não prestam queixas e isso tem que acontecer, porque destrói nossa vida interna, social. Destrói nossa coragem, nossa autoestima, precisamos dessa empatia, desse circulo de fortalecimento, sim!
Depois disso meu coração se encheu ainda mais de amor, sabe? Tanta gente emanando amor, luz, solidariedade! Acredito ainda nessa cidade! Não me senti mais sozinho, uma rede de solidariedade e de acolhimento se criou no mesmo instante. Minha família me acolheu de pronto. Eles estão sendo importantes para que esse medo da vida se transforme. Muitos amigos de todas as partes do mundo me emanando tantas coisas boas, tanto amor, solidariedade. Ainda consigo acreditar nessa cidade, porque eu sou do amor e acredito que ele é quem nos transforma e retroalimenta nossas almas. É isso, precisamos de amor!
Estou meio amedrontado com tudo, aos cacos. Acabei de acordar do susto de um pesadelo, ainda não consegui colocar a cabeça na rua. Vai ser um processo de cura como um todo, com muito amor!