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Por que tão poucas mulheres na política?

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Por Leonardo Dantas (Jornalista)

O Brasil é reconhecido pelo baixo índice de mulheres na política. De acordo com dados divulgados pela União Inter-Parlamentar, ocupamos a 116ª posição no ranking de representantes femininas no legislativo, em um total de 190 países.  O modelo patriarcal e coronelista de se fazer política, muito relacionado à imagem de pessoas dotadas de poder, força, decisão e liderança, ainda coloca a mulher em um lugar de sub-representação. Dos quase 22 mil candidatos que concorreram nas eleições de 2014, somente 6.337 eram mulheres, conforme dados do Tribunal Superior Eleitoral.

 

Solenidade de posse dos senadores durante primeira reunião preparatória para 55ª Legislatura. Em destaque, bancada feminina do Senado.
Solenidade de posse dos senadores durante primeira reunião preparatória para 55ª Legislatura. Em destaque, bancada feminina do Senado.

Mesmo com um tímido crescimento das mulheres na representação política nos pleitos dos últimos anos, ainda conforme dados da União Inter-Parlamentar, as casas legislativas federais do país contam, atualmente, entre os seus quadros com apenas 51 deputadas (9,9% do total de deputados) e 12 senadoras (13% do total de senadores). Números que colocam o Brasil não somente abaixo da média mundial (22,1%), como também de regiões as quais se costuma atribuir uma forte subordinação cultural e social das mulheres, como o Oriente Médio cuja taxa de participação feminina na política é de 16%. Vale lembrar que, em 2015, a Lei 13.165 estabeleceu mecanismos para fomentar maior participação das mulheres no sistema político, dos recursos do Fundo Partidário, por exemplo, 5% devem ser destinados a investimentos em programas e projetos de promoção e difusão da participação política feminina.

No Rio Grande do Norte, mais precisamente em Natal, a realidade não é diferente. Apesar da capital potiguar, assim como o Estado, já terem tido representantes femininas, ainda não foi permitido às mulheres potiguares, ocuparem o debate político sem o aval das oligarquias conservadoras.

Na atual legislatura da Câmara Municipal de Natal, apenas 4 das 29 cadeiras são ocupadas por mulheres, ou seja cerca de 13%. Um valor baixo, já que a maioria da população natalense é formada por mulheres, cerca de 52% de acordo com o IBGE.    A falta de representação feminina afeta diretamente na falta de políticas públicas para mulheres e as afasta de discussões ligadas diretamente aos seus direitos sociais como parto humanizado, creches e aumento de licença-paternidade e aborto assistido, por exemplo.

“Há um mito de igualdade de oportunidades. Na realidade, mulheres não estão em pé de igualdade com homens, inúmeros são os obstáculos para a participação das mulheres nos espaços públicos”, explica Natália Bonavides, advogada e candidata a vereadora pelo PT.

natalia-bonavidesPara ela, esse déficit precisa ser visto como algo estrutural. “Não decorre também da carência de mulheres aptas a concorrer aos cargos eletivos, mas reflete como os partidos são organizados, controlados por homens, que dão pouco espaço para as mulheres estruturarem suas campanhas”.

Com um número maior de mulheres na política, pautas importantes poderiam ser levantadas, de acordo com Natália Bonavides (PT). “Ter mais vereadoras na Câmara significa colocar nas discussões a nossa vivência de cidade, como a necessidade de ruas iluminadas, de um serviço de transporte coletivo de qualidade, de mais creches, de lavanderias públicas, de um serviço de proteção e de acolhimento de mulheres vítimas de violência, dentre tantas outras pautas que exigem o protagonismo das sujeitas atingidas pelas políticas públicas”     .

Candidata a vereadora pelo PSOL, a bióloga Aretha Melo acredita que as mulheres já estão fazendo política diariamente e percebeu uma participação maior desde junho de 2013. “Nós temos protagonizado diversas lutas. Ocupamos as ruas em mobilizações pelo Fora Cunha e pelo combate à violência contra a mulher, de cunho claramente feminista, mas também pelo Fora Temer, pela luta contra o aumento da passagem, contra o ajuste fiscal e nas ocupações de escola em todo o país”.

Segundo Aretha, o que existe é uma política elitista institucional que rechaça a presença das mulheres e que lucra
aretha_fotojobsongaldinocom todos esses ataques tanto às mulheres, como à classe trabalhadora e à juventude. Ela destaca que a nossa própria cultura forma apenas homens brancos e de classe média alta para a vida pública e política. “A recente contrarreforma do ensino médio e a lei da escola com mordaça reforçam isso com a tendência de um ensino mais despolitizado. Por isso, está entre nossas prioridades retomar a necessidade de se garantir formações para os professores de Natal sobre as questões de gênero e diversidade”, aponta.

Para Aretha, as maiores prejudicadas com a falta de representatividade são as mulheres negras e periféricas:

“São elas que mais sofrem com a precarização das condições de vida, das condições de trabalho, dos serviços públicos”, afirmou Aretha Melo, candidata a vereadora pelo PSOL .

Conseguindo romper com o preconceito e sendo porta-voz de pautas progressistas na Câmara de Natal, Amanda Gurgel (PSTU), acredita que o motivo que mais separa as mulheres da política é o machismo. “O machismo é responsável tanto pela concepção de que as mulheres são inferiores aos homens, quanto pela sobrecarga de afazeres domésticos, que nos fazem ter uma tripla jornada e nos impede de ter contato com leituras, informações e debates fundamentais para formação política”.

De acordo com a vereadora, é o trabalho gratuito e invisível da mulher que dá o suporte necessário para que os homens estejam livres para atuar na política.

“Até quando as mulheres conseguem vencer todas essas barreiras e chegam a um espaço institucional ou político, o machismo faz com que ela desista. Muitas vezes por causa de assédio sexual, ou não é levada a sério e têm suas opiniões invisibilizadas, são tratadas com grosseria”, comentou Amanda Gurgel.

amandagurgel_reproducaoFenômeno eleitoral nas últimas eleições, Amanda (PSTU), que está fundando o Movimento por uma Alternativa Independente e Socialista – MAIS, acredita que a sua votação expressiva e a coerência de seu mandato, lhe garante uma base sólida e os outros vereadores a respeitam mais. “Mesmo com tudo isso, já fui vítima diretamente de machismo dentro da Câmara, onde um vereador me ameaçou de agressão física e disse que eu devia confiar menos na Maria da Penha. Já outro, me chamou de atrevida e metida a corajosa, e que eu merecia entrar na ‘Maria da Peia’, isso tudo dentro do próprio plenário”.

Desde o ano de 1997, a legislação eleitoral determina que cada partido destine 30% das candidaturas para mulheres. Porém, muitas vezes a lei é driblada, e candidatas sem a mínima expressão são empurradas nessas vagas, só pra completar o “time”, como foi apontado pela advogada e jovem candidata Natália Bonavides (PT).

Nas eleições do próximo dia 02 de outubro, concorrem à Câmara Municipal de Natal, 595 candidatos. Desse total, 68% do sexo masculino e 32% do sexo feminino. Desses 68%, a maioria se concentra na faixa de 35 a 50 anos e se declarou branco. É provável que boa parte de candidatos com este perfil ocupem as vagas da Câmara, ou seja, “homens brancos” de meia idade decidirão sobre a vida de uma população majoritariamente de “mulheres negras”.