Cris Lucena *
Tem gente que é tão pobre, que só tem dinheiro. O sobrenome Trump é sinônimo de riqueza: cassinos, hotéis, corretoras de imóveis, programas de rádio e TV, campos de golfe, time de futebol americano… Ufa! Até grife masculina pode ser encontrada entre os empreendimentos do bilionário. Sua empreendedora pode ser comparada a Acme Corporation: Companhia Americana “Faz Tudo”, uma sociedade fictícia presente em filmes e desenhos animados como Uma Cilada Para Roger Rabbit, Animaniacs e Tiny Toons. No mundo real, paga-se bem para ter sobrenome Trump nos negócios. Aliás, Donald faz qualquer negócio — de água engarrafada a concurso de Miss Universo — e desde 1982 está na lista da revista Forbers1 como um dos mais ricos do planeta.
E quanto ao Donald Trump candidato à presidência dos Estados Unidos? Sinônimo de misoginia, machismo, homofobia e xenofobia. Discursos energúmenos que beiram o desespero de um perdedor. Quando as pessoas não possuem argumentos plausíveis, passam a detratar — destratar. Parafraseando o saudoso mestre da comunicação Chacrinha, é evidente que Trump não se comunica, mas se trumbica — melhor: se trumpica!
Quando homens desse tipo declaram publicamente seu ódio às mulheres, muçulmanos e mexicanos, é por que seu público-alvo ainda não o calou. Mas foi com muita elegância e propriedade que Michelle Obama discursou na convenção democrata, na Filadélfia, em julho de 2016, sobre a sucessão do governo estadunidense, elegendo Hillary Clinton como a única qualificada para moldar o futuro de uma sociedade composta de preconceitos étnicos, raciais, culturais e bairristas — aliás, abraçados por Trump. A primeira-dama lembrou que “quando alguém é cruel ou age como um valentão, não se deve rebaixar ao seu nível, mas se elevar”, e arrancou aplausos plausíveis da multidão, num discurso saudavelmente feminista e simplesmente incrível (esse foi o adjetivo dado pelo presidente Barack Obama à esposa, parabenizando-a pelo discurso. Afinal, ser simples é ser incrível!). Crível: eis uma forte candidata à sucessão presidencial feminina dos Estados Unidos, sujeito ao familismo Obama!
O discurso de Michelle nos mostra que primeiro-damismo nos EUA não significa uma mera troca de favores condicionais — coisa (in)digna da Reprivada2 do Brasil —, nem tampouco viver à sombra de um marido com sobrenome dotado de temor. Uma mulher pode, sim, escolher o que quer ser, mas há algo errado em escolher NÃO SER. É, temos mesmo muito que Temer.
Trump e sua Trupe
Em tempos de globalização e expansão da política feminina, em que as mulheres estão tomando uma posição imponente na governabilidade e na gestão pública, fatos como a ausência de mulheres nos ministérios do Governo Temer denunciam o machismo nosso de cada dia. Por sinal, infelizmente esse machismo também parte das mulheres. Por exemplo, Cármem Lúcia, próxima presidenta do STF, apesar de amante da língua portuguesa, esqueceu que neologismos muitas vezes são criados através de fatos inéditos na história: o termo “presidenta” foi inaugurado no vocabulário político brasileiro por Dilma Rousseff em 2010, ainda no primeiro mandato.
Em plena campanha + Mulheres na Política, vemos atitudes execráveis no Senado Federal, como a do deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), traçando critérios de merecimento do estupro, ao declarar que a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) “Não merecia ser estuprada porque é muito feia”. Enquanto isso, Trump promove concursos de beleza, tais como Miss EUA e Universo, ao mesmo tempo em que julga a aparência como único atributo justificativo da empregabilidade feminina. Sequer Hillary Clinton, reconhecida pela sua inteligência, eficiência e eficácia, escapou de suas provocações gratuitas. Ao menos Trump “acertou” em dizer que se Hilarry fosse um homem, ela não teria sequer 5% dos votos que a tornaram favorita na campanha presidencial norte-americana. O gênero não é o único critério capaz de eleger alguém a um cargo político, mas reconheçamos que as mulheres desde cedo aprendem a administrar tempo e recursos — isto é, as multitarefas próprias de suas rotinas como donas de casa, mães e profissionais.
Hillary, a destemida
Ainda na universidade, em 1969, Hillary já discursava em favor das mulheres, ao afirmar que “o medo está sempre conosco, mas simplesmente não temos tempo para ele. Não agora.” Em todo seu legado, a candidata democrata não se intimidou: bela, recatada — e do povo! —, tornou-se a primeira senadora nova-iorquina, primeira primeira-dama a concorrer para um cargo político eletivo e, quiçá, a primeira presidenta de uma potência mundial. Preparo não lhe falta: advogada, cientista política — e política! —, escritora, palestrante; foi assessora jurídica do Congresso, presidente da Corporação de Serviços Jurídicos e coleciona uma extensa lista de cargos em que foi e continua sendo precursora. Como secretária de Estado, “visitou mais países do que qualquer outro em seu cargo, incentivou o empoderamento das mulheres em todos os lugares e usou as mídias sociais para transmitir a mensagem dos EUA no exterior” 3. Quando seu marido, o ex-presidente Bill Clinton, foi protagonista do escândalo Lewinsky (1998), Hillary não se tornou vítima das circunstâncias, e se fortaleceu como autoridade carismática — e legal.
Enquanto isso, Trump — o candidato trapalhão4 — se trumbica em sua comunicação verborrágica, digna de governos da Coreia do Norte e de outras ditaduras retrógradas. Cada vez mais, o lema “trumpiano” de fazer a América voltar a ser grande, torna-se inerente à sua oponente democrata: ganhar a disputa para a presidência dos Estados Unidos tem a ver com construir pontes, não muros. Apesar do talento para empreender, ainda há muito que aprender, Mr. Trump — “You’re fired!” 5.
_____________________________________________________________________
Notas:
* Aluna de Gestão Pública no IFRN Central, designer gráfico e poeta nas horas vastas.
(Twitter: @_CrisLucena)
1)Entre os anos de 1990 a 1995, Trump ficou fora desse ranking por indisciplina financeira. Ainda assim, possui uma fortuna quase incalculável: a quantidade exata de imóveis possuídos por ele é desconhecida; além disso, o próprio Trump declarou que sua fortuna supera os 2,5 bilhões que lhe são atribuídos. (Dados extraídos do livro Donald Trump – Um Magnata na Política, publicado pela Editora Independente).
2)Reprivada: trocadilho de Ruy Barbosa para o termo República.
3)Grifo meu da biografia Hillary Clinton – O Poder Feminino nos EUA (Editora Independente).
4)Em alusão ao desenho animado Grump, o Feiticeiro Trapalhão, no qual um bruxo corrupto persegue a princesa Aurora e seu ajudante Terry, a fim de impedi-la de recuperar a autonomia sobre o próprio reino — um roteiro quase político!
5)Bordão de sua autoria no programa The Apprentice — uma espécie de versão de O Aprendiz (tradução para “Você está demitido”).