Search
Close this search box.

Impeachment e os novos desafios

Compartilhar conteúdo:

Homero de Oliveira Costa – prof. do departamento de Ciências Sociais da UFRN

1460895657_868124_1460937664_sumario_normal        Com a aprovação pela Câmara dos Deputados da abertura do processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff no dia 17 de abril,  a etapa seguinte foi a aprovação de sua admissibilidade por uma comissão especial do senado (21 senadores) por 15 votos a 5 no dia 6 de maio. O que parecia claro, desde o início, é que se tratava de uma mera formalidade. A decisão já tinha sido tomada por antecipação, independente da debilidade da peça acusatória. No caso da Câmara, no qual esse processo se originou, foi presidida por um réu por corrupção no Supremo Tribunal Federal, cujo pedido de afastamento cautelar foi protocolado no STF no dia 16 de dezembro de 2015 pelo procurador-geral da República, que entre outras coisas, afirmou que “Graves fatos, concretos e recentes, impõem o afastamento do presidente da Câmara(…) visto que vem utilizando essa relevante função em benefício próprio e de seu grupo criminoso com a finalidade de obstruir e tumultuar as investigações criminais existentes contra si” e apontou 11 situações que comprovariam o uso do cargo para “constranger, intimidar parlamentares, réus, colaboradores, advogados e agentes públicos com o objetivo de embaraçar e retardar investigações”. No entanto,  ele não apenas não foi afastado como presidiu  o processo e  só quase cinco meses depois, no dia 5 de maio, o ministro Teori Zavascki decidiu pela suspensão do mandato parlamentar e da presidência da Câmara, confirmada, por unanimidade,  pelos demais ministros do STF.

Do Senado, não se podia esperar isenção, a começar pelo relator, o ex-governador de Minas Gerais, Antônio Anastasia, do PSDB, cujo parecer já se conhecia de antemão, independente de todas as discussões em plenário. Ele inclusive foi questionado em uma sessão da comissão  pelo senador Lindbergh Farias (PT/RJ)por ter usado, quando foi governador de Minas Gerais (assim como o seu antecessor, Aécio Neves)  dos mesmos “crimes de responsabilidade” que acusou  a presidente. E como não haveria  comissão no Senado sem  a provação do processo na Câmara, cabe indagar: qual a explicação para a protelação da decisão do STF para o afastamento de quem articulou e comandou esse processo? E como um Senado, no qual 1/3 dos seus integrantes respondem a inquéritos ou ação penal no STF, conforme levantamento do Congresso em Foco, acusados ou suspeitos de práticas criminosas (de crimes eleitorais, lavagem de dinheiro  à formação de quadrilha),  julga, alguns por antecipação,  uma presidente cujos “crimes” foram “pedaladas fiscais”, cometidas também por vários governadores e prefeitos?

Outra questão, pelo seu significado e desdobramentos é: o impeachment da presidente Dilma Rousseff significará fim da crise política (e econômica)? Tudo indica que não.  Antecipar as eleições presidenciais seria uma saída? Talvez, mas dificilmente deverá ser aprovada pelo Congresso Nacional (requer a aprovação de uma Proposta de Emenda a Constituição (PEC) que exige o voto de 3/5 das respectivas casas em dois turnos) e especialmente consolidado o afastamento da presidente Dilma Rousseff. Com Michel Temer na presidência, ele e seu grupo certamente não vão querer antecipar eleições, principalmente considerando a possibilidade da candidatura de Lula. No último levantamento do Datafolha, divulgado no dia 10 de abril, Lula, mesmo com todo “bombardeio” midiático e jurídico, está em primeiro lugar nas intenções de voto, com 21%, ao lado de Marina Silva e na mesma pesquisa, constatou-se uma queda sistemática de Aécio Neves (considerando as pesquisas anteriores).

Com a saída presidente Dilma Rousseff, o novo governo, mesmo com maioria nas duas Casas legislativas,  deverá enfrentar inúmeros problemas, tanto dentro como fora do parlamento:  dentro,  com uma base frágil, na medida em que é fisiológica e , portanto, à mercê das circunstâncias e que certamente vai cobrar o apoio ao impeachment e a dura oposição do PT e o que restou de sua base aliada  e mais o Psol e especialmente fora do Congresso Nacional, com os setores organizados da sociedade, contrários ao impeachment e ainda mais se o governo  tentar implementar o programa “uma ponte para o futuro”, com suas consequências econômicas, políticas e sociais.

Os desafios são imensos, tanto para o governo Temer  como especialmente para a oposição. Concordo inteiramente com    Tarso Genro, que no artigo “Agonia e êxtase do liberalismo decadente”(Carta Maior, 2/5/2016) afirma: “O grande problema é o que faremos de tudo isso,  num momento em que os pressupostos da soberania popular mantém as “regras do jogo”, mas  se relativizam, e o oligopólio da mídia se transformou realmente no partido “novo tipo” da dominação do capital financeiro, quando as próprias classes dominantes reafirmam seu poder -por dentro dos estatutos da democracia formal-  com uma enorme capacidade hegemônica. Esta capacidade não é ilimitada, mas foi capaz de promover “exceções não declaradas” e um golpe por dentro do Parlamento, num contexto em que o próprio partido de esquerda, mais importante da época, perdeu a sua capacidade dirigente e “queimou” seu período áureo, pelo uso dos métodos tradicionais de gestão política do Estado, próprios dos seus inimigos e adversários”. De qualquer forma, não estando mais à frente do governo, para ele  “o PT deve ser um dos integrantes desta nova força social e política, que deve surgir para enfrentar um processo de longo curso, mas que não tem, no presente, nem capacidade institucional, nem autoridade política para ser o seu centro.” Este novo controle deve vir de” baixo para cima”, para, em algum momento, constituir-se como força frentista de natureza eleitoral, com vocação de ser poder republicano”. Embora não esteja claro o que seja “vocação para ser poder republicano”, o fato é que há uma imperiosa necessidade da oposição constituir uma frente, dentro e fora do parlamento, para resistir ao retrocesso político, social e econômico. O grande desafio é formar essa frente e propor um programa que seja viável, política e economicamente, que rompa com as políticas de ajustes fiscais, com suas nefastas consequências, ou seja,  “para enfrentar os estragos que se avizinham e recuperar a utopia democrática”  como afirma Tarso Genro:  o que está ocorrendo, diz ele,  pode significar o fim de um ciclo, mas não o fim da democracia, ou seja, a necessidade de lutar para manter a democracia e suas conquistas.

O senador Lindbergh Farias (PT/RJ) lembrou isso na sessão do senado do dia 18/04/2016 e indagou: “V. Excia  quer cassar a presidenta por algo que o senhor fez como governador? Como justifica isso? (…) e comentou que, ao contrário da presidente Dilma, durante os quatro anos em que governou Minas, ele não cumpriu a meta de superávit e abusou da “contabilidade criativa”.

Na mesma sessão, o Senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) fez uma pergunta a Janaína Paschoal – uma das autoras do pedido de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff – e fez com que ela defendesse que o vice-presidente Michel Temer também deve ser afastado por crime de responsabilidade. O senador, depois de fazer uma explanação de decretos de créditos suplementares, pediu a opinião da advogada, que afirmou que “os créditos suplementares sem a devida autorização do Congresso Nacional configuram crime de responsabilidade e devem ser punidos por meio do impeachment”, ao que o senador respondeu: “Muito bem, fico feliz com sua opinião, porque a senhora acabou de concordar com o pedido de impeachment do vice-presidente Michel Temer”.  “Essas ações que eu li foram tomadas pelo vice”. A resposta foi confusa e patética, como, aliás, foi sua participação na sessão da comissão.

Outro desafio é enfrentar o elevado nível de endividamento das mais de 35 milhões de pessoas que expandiram o seu consumo em anos recentes” e que “os problemas atuais só serão superados em um prazo de três a quatro anos e depois da adoção de reformas estruturais que elevem o nível de poupança do país e mudem o seu sistema político”.

Nesse sentido ele propõe que, no curto prazo, a melhor saída seria a realização de novas eleições e a formação de um governo que “tenha apoio de todos os partidos (…) e uma reforma política que possa reduzir os partidos e alterar o modelo de eleições para deputado.