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Um branco

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Eu fui esquecendo de você gradativamente num trabalho árduo, dia após dia, até notar que não mais lhe esquecia porque, pasme, já havia o feito.

Fui lhe esquecendo devagar mas sem lhe matar – li num canto que matar o significado de alguém na nossa vida é um crime tão grande quanto assassinato (e eu não quero de jeito-maneira isso pra mim). Optei por lhe tirar do cativeiro e deixá-lo vivo mesmo. Livre, só, ao léu, completamente sozinho seguindo seu caminho de garimpos românticos para o prazer de um ego mais inflado que a boca da Elza Soares após uma das aplicações rotineiras de botox.

Fui lhe esquecendo na cor da sua camisa florida, nas cores vivas do seu braço fechado de tatuagens que eu não quero mais desvendar, na cor do céu azul visto dos seus olhos castanhos que se fecharam e se transformaram na visão da sua nuca indo embora. Opaca.

Tudo o que eu sabia sobre nós deixou de ser conhecimento para virar informação, dados, estatísticas mais desnecessárias e duvidosas que as pesquisas do Datafolha em época de campanha política.

Muito calei, muito calou, muito calor foi calado. Agora é silêncio e paz, e o que quer que eu ainda tivesse pra lhe dizer nessa vida, rimei num poema e deixei para trás. Fui lhe esquecendo até não conseguir conjugar mais o verbo no gerúndio pois, pasme, já o havia esquecido.

É isso, querido.

Sobre o que mesmo estávamos falando?