Por Homero de Oliveira Costa
(Prof. do Dep. de Ciências Sociais UFRN)
Há em curso no Brasil um processo que podemos chamar de criminalização e a consequente desqualificação da política. Ele se insere num contexto de amplo descrédito dos partidos, dos políticos e da política. A criminalização da política e a “satanização” dos políticos, tem entre outras consequências o afastamento da política de um número significativo de pessoas, deixando a “política” para os “profissionais”, ou seja, representantes ou integrantes das classes dominantes.
É evidente que o péssimo exemplo de muitos partidos e parlamentares também contribuem. Mas creio que é possível destacar o papel da chamada grande mídia, que atua como porta-voz do universo conservador brasileiro, para quem a política, em geral, é sinônima de escândalos. O que se destaca é o mau exercício dos mandatos, os desvios éticos de parlamentares etc., que contribui para criar no imaginário popular o “são todos iguais”, como se a política se resumisse aos políticos (ou seja, parlamentares) e eleições, assim como os frequentes e cotidianos casos de corrupção, embora o faça de forma muito seletiva, como mostra o manchetômetro (www.machetometro.com.br) que analisando o período eleitoral e pós-eleitoral mostra como há uma postura parcial e tendenciosa, um tratamento da mídia intensamente desfavorável do Governo, da presidenta Dilma Rousseff e do PT.
Para o cientista político Fabiano Santos “O equívoco da criminalização da política brasileira, promovida pela cobertura diária da grande imprensa, e direcionada, sobretudo, para lideranças do Partido dos Trabalhadores, não decorre apenas da desinformação e de um possível viés ideológico em favor de oposicionistas ao governo. Decorre principalmente do fato de serem os grandes veículos de comunicação no país, grandes corporações e, como tal, favoráveis a uma agenda de corte liberal, tanto menos redistributivista quanto possível (…). Boa para gerar crises, e desacreditar governos de perfil mais popular, a criminalização da política é, essencialmente, péssimo meio de pedagogia democrática”.
Outro aspecto diz respeito à exclusão da participação política. Se a criminalização e a desqualificação da política atingem hoje níveis preocupantes, que leva ao afastamento das pessoas em relação à política e da participação eleitoral e beneficiam as tradicionais elites brasileiras, historicamente, a exclusão sempre existiu, especialmente em relação às classes subalternas: Desde a formação dos partidos políticos (Império) até 1945, não chegava a 6% o número de eleitores. A partir daí houve um crescimento não apenas do eleitorado, como da participação eleitoral. Esse aumento, no entanto, não significou maior participação na vida política e muito menos nas decisões governamentais. O eleitor, convencido pela cada vez mais sofisticada propaganda eleitoral (marketing), tem sua participação basicamente restrita a votar periodicamente.
Essa ausência de participação (e de enganação eleitoral), talvez explique, em parte, o aludido expressivo número de votos nulos, em brancos e abstenções que tem caracterizado às eleições no Brasil: Nas eleições presidenciais de 2014, por exemplo, mais de 37 milhões de eleitores votaram em branco, nulo ou se abstiveram. A falta de credibilidade dos políticos (e dos partidos) e que contribui para sua desqualificação, diz respeito também ao descompasso entre o que se promete nas campanhas eleitorais e o que não é cumprido. E mesmo governo eleito com programas reformistas tem de necessariamente fazer concessões, composições e alianças eleitorais tanto para ser eleito como para governar, que descaracterizaram completamente seus programas e intenções, decepcionando aqueles que o elegeram, aumentando o descrédito. Ou seja, há um conjunto de fatores que vão além de operações circunstanciadas e às vezes muito seletivas, que contribuem para a criminalização e desqualificação da política.