Você me entende agora? A demora toda? O problema começa aí: eu publiquei um livro. Aliás, esse título tá até errado. Eu não escrevi livro nenhum. Ele já estava escrito. Eu só publiquei.
Ano passado eu tive um ímpeto numa noite de setembro ou agosto ou outro mês por aí, e achei que poderia publicar um livro sim, que eu tinha umas coisas escritas que alguns amigos gostavam (três amigos) e que muitos deles (dois dos três) me recomendavam um livro escrito com elas. Em duas noites, selecionei uns textos, inventei um título que casou, deu certo, mas que é inaudível e ruim demais de falar sem mostrar a capa do livro, mas inventei, e aprontei um pdf. Enviei pros meus amigos. Que são poucos, tenho poucos amigos. Desses poucos, havia dois com uma dose maior de loucura, prontos para encorpar o livro.
Um era Solino, que disse que Peraí, minha filha, isso aqui precisa duma capa. Um livro em pdf com capa de fundo branco e letra preta, veja só. Pensei que Solino ia dar uma “ajeitada” no negócio e ele me veio com uma obra de arte. A outra pessoa foi Fábio, que achava absurdo eu ficar mandando um livro desses pras pessoas, ou deixando público na internet (?). Vamos fazer um lançamento, ele disse. Vamos fazer um evento, divulgar esse e-book, vai ser massa, estou com um bom pressentimento. E fez. E foi. Deu tudo certo.
Deu tudo tão certo que, dois meses depois, eu estava indo na gráfica mandar imprimir uns poucos exemplares pra esses amigos assim, que vibraram com um livro simples em pdf que eu tinha escrito. Meu chefe me mandou parar no meio do caminho e disse que ia me dar aquilo de presente. Quantos você quer imprimir, Bia? Ah, só uns vinte. VINTE? Coitada. A primeira tiragem saiu com 120 exemplares e já tivemos de imprimir uma nova. E pela primeira vez na vida ganhei dinheiro escrevendo.
Foi bom, foi ótimo. Está sendo. Deu tudo muito mais certo do que imaginei. Porque nunca imaginei que pessoas realmente comprariam um livro meu, espontaneamente. Fico ainda mais confusa quando vejo desconhecidos fazendo isso. Sempre tenho curiosidade de perguntar por que danado a pessoa comprou aquele livro, e normalmente eu pergunto mesmo. O problema é que um livro de prosa poética que saiu de seu blog pessoal é curiosamente interpretado como uma autobiografia não declarada. E de tanto eu ter de negar a autobiografia não autorizada de mim mesma, enchi o saco e parei de tentar explicar isso também. Mas não só. Também fui parando de escrever.
Muitos dos textos que estão ali escrevi para Otávio, a quem dedico o livro, isso é verdade. Mas outros tantos não escrevi pra ele, nem pra nenhuma outra pessoa que não fosse eu mesma. Minha lógica de escrever foi sempre essa: ato em si mesmo, finalidade de conversar sozinha. Acontece que isso não exclui a minha capacidade de criar histórias, de inventar a mentira que eu quiser, e de ter personagens que não são nem eu nem ninguém que esteja do meu lado. Mas parece que para muitos leitores exclui sim, e eu não sou dotada de capacidade nenhuma para a ficção, mas só dona de uma retórica reclamona que serve para falar da minha vida. E não é assim que funciona.
Por isso estou há tantos dias devendo um texto à Carta e outros quinze à mim mesma. Não tem saído muita coisa desde que passei a me sentir desconfortável ao escrever e publicar. E ainda parece esquisito retomar isso. Mas agradeço a paciência, meninos. Vamos lá, comecemos.