Hoje vejo meu tio Eli sentado numa cadeira, na sala de casa, tentando explicar para Andreia, a repórter, seu amor pelo Alecrim. Ontem vi Orlandinho afirmando, cego de paixão, que por onde olha só enxerga a cor verde. Depois o editor ainda faz questão de mostrar uma foto do meu amigo Bira, falecido em acidente de carro há anos atrás. É muita emoção. E eu nem sou alecrinense.
Confesso que me senti bastante orgulhoso por ter proporcionado uma semana inteira de homenagens ao Verdão, aniversariante da semana. Pra quem não pôde acompanhar, pautei o Super Esporte 95 desta semana com as cores verde e branco.
Na segunda, veiculei uma mensagem do meu amigo Marcelo Henrique. Na terça, um desejo de parabéns da musa Gabriela Calixto e divulguei a programação festiva do aniversário de cem anos. Na quarta, falei um pouco da origem popular do clube, em 1915, e levei a palavra do presidente Washington Fernandes. Na quinta, falei de Café Filho e na sexta, pus no ar o hino do Esmeraldino.
Pude, mesmo que apenas no meu consciente, relembrar minha infância e uma parte da adolescência, quando meus pais frequentavam a finada sede campestre do Alecrim. Lembrei o dia que ganhei uma camisa com dois escudos – Alecrim e ABC. Recordei da felicidade de menino quando descobri que meu tio Eli Morais havia sido, certa vez, presidente do clube.
Fico imaginando, como pode haver tanto amor por um clube que há trinta anos não conquista um título sequer!? É uma espécie rara de amor? Ou seria loucura? Só mesmo a filosofia de Friedrich Nietzsche pra me fazer compreender que sempre há uma parcela de loucura no amor e sempre há um pouco de razão na loucura. É isso, é muito mais do que amor. É loucura sim. É amor com loucura e razão.
E aqui não tratamos e celebramos apenas os cem anos de existência de uma agremiação da sociedade civil, com duração temporal indefinida, personalidade jurídica, controlada por um estatuto e conselheiros, destinada à prática do futebol. É muito mais. Muito mais. São cem anos de existência e, acima de tudo, resistência.
É a história de um clube que nasceu para desafiar as desigualdades de uma sociedade aristocrata, elitista e preconceituosa. Um clube fundado para ajudar, de forma filantrópica, as crianças pobres do bairro que lhe deu origem. Um clube que, surgiu para abrigar os menos favorecidos e remar contra a maré das injustiças.
Se você não sabe, assim como na chegada do futebol ao Brasil, vindo da Inglaterra, o futebol em Natal serviu de pano de fundo para a segregação racial e de classes. Era esporte nobre, para brancos e ricos. Jogadores e torcedores de ABC e América faziam parte da elite da cidade dos bairros de Petrópolis e Tirol, enquanto o Alecrim era composto basicamente de negros e descendentes de índios do bairro pobre e longe.
Talvez isso também ajude a explicar esse amor doentio dos meus amigos Marcelo e Daniele, dos loucos Orlandinho, Washington, Normando e Marcus Vinícius, e do meu tio Eli. São, na verdade, resistentes desde o princípio.
E continuam sendo. A história conta. O Alecrim é, no sentido mais racional, o verdadeiro clube do povo, como brincou meu amigo Jean Fernandes, esta semana no estúdio com vista panorâmica para o povo.
Se vocês, que me lêem nesse momento forem alecrinenses, saibam que é justamente esse sentimento de amor, loucura e razão que o mantém vivo até hoje. Mas, saibam também, para que esse sentimento continue nutrindo os corações de muitos outros potiguares, é preciso mudança e evolução. Cuidem do futuro desse, agora centenário Alecrim. Façam do Verdão um clube com gestão administrativa exemplar e renovem essa paixão.
Nesse centésimo aniversário, peço licença ao compositor do hino alecrinense, Seu Claudionor, o saudoso Dozinho, como também a interprete Luiza de Paula, e digo que, nesses 15 de agosto de 2015, todo povo POTIGUAR te saúda de alma e coração.
Parabéns, Alecrim Futebol Clube, pelos cem anos de existência, resistência, amor, loucura e razão!